Dra. LiubianaDra. Liubiana é PhD em Neuropediatria, com doutorado-S na Harvard Medical School. Professora de Medicina da UFMG, neurocientista e palestrante

Sim, sempre sim, meu filho: pais permissivos criam filhos não resilientes

Publicado em 24/08/2023 às 06:00.

Em um mundo que valoriza o equilíbrio entre a liberdade e a responsabilidade, a abordagem na criação dos filhos desempenha um papel crucial na formação de indivíduos resilientes e adaptáveis. O modelo de parentalidade permissiva, onde os desejos das crianças e adolescentes são prontamente atendidos, vem sendo objeto de análise sob uma nova ótica. Enquanto os pais que adotam essa abordagem acreditam estar agindo em prol do bem-estar de seus filhos, estudos recentes apontam para as potenciais consequências negativas desse estilo de educação.

A parentalidade permissiva, caracterizada pelo atendimento irrestrito aos desejos das crianças e pela hesitação em contrariá-las, muitas vezes é enraizada na intenção dos pais de “amar o filho”, de evitar traumas e repetir padrões de educação que consideram violentos ou de compensar a ausência daqueles que só focam no trabalho e nos seus próprios desejos e não dedicam tempo de qualidade e afeto aos filhos. No entanto, a adoção desse modelo pode ter impactos profundos na formação das crianças e adolescentes, que podem crescer sem aprender a lidar com a frustração, a disciplina e a compreensão de limites.

A necessidade de frustração é fundamental no desenvolvimento saudável das crianças, uma vez que as ajuda a construir resiliência e habilidades de enfrentamento. A ausência dessas experiências pode prejudicar a capacidade das crianças de lidar com desafios futuros. A falta de regras claras e da compreensão de que "não" também faz parte da vida pode resultar em comportamentos desafiadores e impulsivos, refletindo a ausência de redes neurais relacionadas ao autocontrole.

Crianças criadas sob o modelo permissivo podem inicialmente expressar seus desejos através de gritos e lágrimas, pois é a maneira que aprenderam para obter o que querem. No entanto, esse comportamento pode evoluir para formas mais intensas de falta de iniciativa, de mentiras, rompantes de agressividade, incluindo agressões físicas aos pais e aos colegas, e atitudes inaceitáveis que podem levar a suspensões escolares e até mudanças frequentes de escola. Há aumento do riso de alcoolismo, uso de drogas e criminalidade. E quando houver qualquer desafio na vida, os adolescentes e os adultos, frutos da educação permissiva, não terão estratégias de enfrentamento e de superação, o que aumenta os riscos de depressão e de falta do desejo de viver.

Os pais, por sua vez, frequentemente se veem em uma posição de perplexidade e desgaste diante de comportamentos desafiadores que não conseguem controlar. É importante reconhecer que esses pais também necessitam de suporte e orientação para encontrar um caminho mais equilibrado na educação de seus filhos.

O desenvolvimento saudável do cérebro infantil requer a exposição a uma variedade de experiências, incluindo aquelas que envolvem compreender e aceitar limites. A resiliência, caracterizada pela capacidade de lidar com adversidades, é forjada através dessas experiências e é uma habilidade fundamental para a vida adulta. Para auxiliar nesse processo, especialistas recomendam um modelo de parentalidade que combine autoridade com afeto, onde as regras são claras e as crianças são ensinadas a obedecer de forma inteligente.

No entanto, é importante considerar que a mudança de um modelo permissivo para um modelo mais equilibrado pode ser desafiadora e requer apoio. Os pais que adotam o estilo permissivo não devem ser julgados, mas sim orientados sobre como criar um ambiente que promova o desenvolvimento saudável e resiliente de seus filhos.

Em última análise, a criação de filhos resilientes requer um delicado equilíbrio entre a satisfação das necessidades das crianças e a imposição de limites saudáveis. O caminho para a resiliência é pavimentado com experiências que desafiam, ensinam e capacitam os jovens a enfrentar os desafios da vida de maneira positiva e construtiva. A parentalidade é uma jornada de aprendizado mútuo, onde pais e filhos crescem juntos na busca por um futuro emocionalmente saudável e bem-sucedido.

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