Artigos de Opinião

Nesse momento, tem gente morrendo de fome

Pedro Patrus*
Publicado em 26/06/2022 às 06:00.

Pesquisas recentes da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional revelaram que, atualmente, são pelo menos 33,1 milhões de pessoas passando fome no país. O número é assustador e nos fez regredir três décadas: em 2013, eram 4,2 milhões de pessoas na situação. A maioria dos lares que enfrentam a fome (25,7%) contam com três ou mais pessoas menores de 18 anos. Ou seja, existe um grande número de crianças em grave situação de insegurança alimentar e nutricional.

Além disso, fato que contribui para o cenário da fome é que o atual governo privilegiou as políticas públicas voltadas para o agronegócio exportador e desmantelou os projetos de incentivo à agricultura familiar. Vê-se, então, a realidade arrasadora na qual o presidente do país, através de uma gestão incompetente e genocida, nos colocou. 

Isso é fruto de um desgoverno que, desde que foi eleito, tirou o espaço das políticas de Saúde Alimentar e Nutricional, o que trouxe mudanças substanciais que assolaram o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan). Além disso, houve cortes drásticos no orçamento público e o desmonte de instituições e programas iniciados nos anos anteriores.

O conjunto desses desmontes propiciou a expansão das desigualdades sociais, a insegurança alimentar e as violações do direito humano à alimentação. Com uma perspectiva centralizadora, neoliberal e de Estado mínimo, a fragilização das ações e programas de SAN tiveram reflexos importantes no que diz respeito à obrigação de promover o direito à alimentação. 

O desmonte das políticas públicas de auxílio às famílias mais pobres é um projeto do atual governo, que se exime da responsabilidade diante de um país assolado pela fome e pela pobreza crescente. O governo federal decretou o fim do Bolsa Família e do Auxílio Emergencial e fez isso mesmo diante de um cenário catastrófico e alarmante.

O Auxílio Emergencial foi fruto de uma luta coletiva em todo o Brasil e serviu não apenas de forma individual às famílias e pessoas que foram impactadas economicamente com a pandemia, mas também como uma forma de amenizar o declínio do Produto Interno Bruto (PIB) em 2020. 

Embora o atual governo se gabe pela implementação do auxílio, não demorou para que ele cortasse o benefício pela metade em 2021 e, logo após, decretasse o fim do pagamento. Com isso, o crescimento da pobreza, que já vinha ocorrendo desde 2020, revelou uma significativa piora após o fim do auxílio.

Havíamos conquistado um passo importantíssimo em 2014. O Brasil estava fora do mapa da fome e isso se deu, principalmente, graças ao Bolsa Família, implementado pelo presidente Lula e pelo então ministro na pasta de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Patrus Ananias, em 2003. Comemoramos sem saber o que viria pela frente. Nem dez anos se passaram e lá está o Brasil novamente sofrendo com a fome e a miséria.

Agora, temos de defender o óbvio: a necessidade urgente de intervir na 
situação para que a população não morra de fome. Entretanto, como o atual presidente não perde a oportunidade de buscar palanque, decidiu por bem acabar com o Bolsa Família e, no lugar, colocar o “patriotíssimo” Auxílio Brasil, um programa que, embora tenha aumentado o valor do pagamento, possui data de validade e exclui milhões de brasileiros do acesso ao benefício, além de apresentar falhas técnicas em seu desenvolvimento. 

É preciso entender que as políticas públicas de transferência de renda são um avanço tanto econômico, quanto humanitário, na medida em que garantem uma economia mais estável, justa e abrangente. Mais importante ainda, garantem artifícios que visam a eliminação da fome, o que deve ser de máxima prioridade em todo e qualquer governo no atual momento. 

Portanto, além de mau-caratismo, é estupidez deixar de investir nas políticas públicas desta natureza. O programa de transferência de renda Bolsa Família, que o atual governo também fez questão de destruir, demonstrou a potência dos programas sociais voltados para a população de baixa renda. Na medida em que uma porção de renda é distribuída entre os mais pobres, esse dinheiro retorna aos cofres públicos em forma de arrecadação, já que o recurso é utilizado para fazer compras básicas e isso faz com que haja aumento de receita nos comércios e, consequentemente, o aumento da oferta de empregos. 

Sem dinheiro rodando, não há consumo e, sem consumo, a economia não gira e fica estagnada. Além disso, esse movimento garante, ainda, o fortalecimento das economias locais e o desenvolvimento das comunidades, visto que grande parte da renda é utilizada em comércios regionais. 

Entretanto, o desmonte não foi apenas no âmbito federal. Em Minas Gerais, além de um governo estadual que se mostra cada dia mais alinhado com o lamentável presidente, estamos sofrendo, anualmente, com reduções no orçamento, o que implica em menor oferta de várias políticas sociais ligadas ao Direito Humano à Alimentação Adequada. Disso, resulta que o combate à fome torna-se ainda mais difícil. Já na capital mineira, há, ainda, o Auxílio BH, que será completamente encerrado nos próximos meses. 

Tivemos, em Belo Horizonte, uma prefeitura que se preocupou com a população e não mediu esforços na gestão de crise durante os períodos mais duros da pandemia. Agora, somamos nossos esforços para garantir que a nova gestão continue com o trabalho diferenciado e que se empenhe para pensar na implementação de um programa de renda básica no lugar do Auxílio BH, pois muito embora a pandemia esteja num nível menos crítico, graças à vacinação, os efeitos econômicos ainda estão gritantes.

É notável o aumento de pessoas em situação de rua e de extrema pobreza na cidade e, se não fizermos nada, estaremos contribuindo para um cenário permanente de fome e miséria. Por isso, é preciso que a prefeitura se debruce sobre o tema e encontre alternativas viáveis para garantir às famílias a possibilidade de se alimentar e viver dignamente. 

*Vereador de BH

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