Ângela Mathylde Soares*
O transporte público coletivo compromete a saúde mental do belo-horizontino diariamente. Os ônibus estão cada vez mais lotados e os passageiros não observaram aumento no número de veículos e nem redução no tempo entre as viagens, perdendo a determinação em lutar contra o estresse e a depressão, se tornando, paulatinamente, sujeitos a diversos problemas, como a síndrome de burnout. O deslocamento diário de 800 mil indivíduos ocorre na capital, exclusivamente, por ônibus, sendo que, conforme a BHTrans, esse número era 1,2 milhão, antes da pandemia.
Atrasos, superlotação, falta de veículos, espera sem conforto e risco de violência ou assédio sexual fazem parte da rotina de 65% da população brasileira dependente de ônibus, trem ou metrô, como principal meio de transporte. Conforme dados da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), 28% das viagens e deslocamentos diários dos usuários são por transporte coletivo, sendo que o ônibus representa 85,7% desse total.
Um estudo do arquiteto Rooseman de Oliveira Silva, professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Tiradentes (Unit Sergipe), apontou que os problemas variam de acordo com a cultura e a realidade urbana de cada região, mas as reclamações mais comuns se referem, principalmente, à estrutura inadequada de atendimento dentro dos veículos e nos pontos de ônibus, a impontualidade, superlotação e insegurança.
O reajuste dos combustíveis não pode mais ser a desculpa das empresas responsáveis pelo transporte, afinal, o preço do litro voltou a crescer nas últimas semanas. O metrô fez greve de novo e, ainda assim, a verdade é que os problemas persistem.
Rooseman destaca em seu levantamento que o transporte público envolve a questão dos preços das passagens e do custo para manter o serviço, justificativa dos empresários. Contudo, destaca que equilibrar essa equação é um grande desafio, afinal o valor da tarifa está relacionado ao investimento em combustível, mão-de-obra, manutenção dos veículos, impostos etc. Por outro lado, o preço da passagem precisa ser viável para quem paga.
A verdade é que o cotidiano já está estressante com pessoas sem trabalho, com fome, sem recursos e também sem condições, ou seja, aqueles que ainda têm emprego estão submetidos a ônibus cheios, convivem com o deslocamento em pé, em grande parte do trajeto, violência e assédio sexual em muitas regiões. A falta de oportunidades agrava ainda mais essa situação, contribuindo para a redução da serotonina, hormônio responsável pelo prazer, aumentando o cortisol, hormônio responsável pelo estresse.
É importante entender que todos convivem com três tipos de estresse: físico, cognitivo e emocional. Quando qualquer pessoa passa por situações estressantes e ansiosas, o processo eleva o nível de cortisol e quem não tem estrutura, ou seja, equilíbrio e condição, para manter um crucial controle inibitório, sendo que acaba cedendo à motivação física, ou seja, parte para a briga e, se isso não acontece, internaliza, situação que provoca dores de estômago ou cabeça, assim como sintomas de estresse físico e emocional, ou seja, irritabilidade, distúrbio do sono, alimentação em quantidade acima ou abaixo do necessário, perda de memória e de atenção, entre diversos outros sintomas.
Já o estresse cognitivo seria o respeito e produtividade, chegando a desenvolver a síndrome de burnout. O problema deveria ser decorrente do esgotamento profissional, contudo esse distúrbio emocional com sintomas de exaustão extrema, estresse e esgotamento físico acaba sendo provocado pelo estresse com o transporte coletivo.
Todos esses fatores vão deixando a viagem longa e cada vez mais cansativa e poucas pessoas realmente estão sabendo enfrentar essa rotina de coletivo lotado, quer seja o metrô ou o ônibus. A consequência reflete em baixa produtividade profissional, falta de criatividade, insônia e dificuldade para se concentrar, entre outros problemas.
Essa situação estressante aciona um gatilho, ou seja, algo que compromete o equilíbrio e, dessa forma, é essencial ter um gatilho oposto para promover menos tensão nervosa. Assim, torna-se necessário tomar antidepressivos e/ou ansiolíticos para, por exemplo, tratar a síndrome de burnout e transtornos de ansiedade e depressão.
A reversão dessa situação depende de um poder público com propostas para resolver essas questões, envolvendo a melhoria contínua e permanente do transporte coletivo, as restrições estratégicas ao uso do automóvel em áreas comprometidas, ciclovias e o uso de bicicletas para o deslocamento, integrando os modais de transporte.
* Neurocientista, psicanalista e psicopedagoga