A normalização do racismo e da morte

07/12/2021 às 18:14.
Atualizado em 14/12/2021 às 00:36

É comum as pessoas acharem que a ocorrência do racismo limita-se a desferir xingamentos, ser preconceituoso, atribuindo juízos de valor a partir de estereótipos, ou discriminar pessoas por causa da cor da pele e de outras características fenotípicas dos grupos racialmente oprimidos. Quem assim pensa não compreende os conceitos de racismo institucional e racismo estrutural.

O advogado, filósofo, doutor e pós-doutor Silvio Luiz de Almeida explica em seu livro Racismo Estrutural que o racismo institucional provém do uso de forças – por determinada organização – que são consolidadas e legitimadas na sociedade e, por isso, menos passíveis da reprovação pública. Contudo, esse conceito ainda é limitado para entender a complexidade do racismo e sua manifestação sistêmica na estrutura social.

O racismo, conforme elucida Silvio Almeida, “é uma decorrência da própria estrutura social, ou seja, do modo ‘normal’ com que se constituem as relações políticas, econômicas, jurídicas e até familiares”. Desse modo, o racismo sempre será estrutural, sobretudo considerando o processo histórico, político e ideológico que fundamentou a sociedade brasileira. É impossível que o Brasil não seja racista tendo sido construído e estruturado pela colonização e escravização do povo negro.

É estranho dizer isto – confesso –, mas o racismo é ‘natural’, ‘normal’. E é por causa disso que a sociedade brasileira normaliza o genocídio da população negra. O racismo faz, conforme evidencia Silvio Almeida, com que as almas “mais nobres da sociedade” conformem-se com a morte de crianças negras por “balas perdidas” ou com uma operação policial que mata 28 pessoas negras numa favela (em alusão ao que aconteceu na favela do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, em maio deste ano). É o racismo que normaliza piadas, risadas e a validação social da conduta de um policial que submete um jovem negro a correr e ser arrastado algemado a uma moto em movimento.

A banalização da morte de grupos oprimidos constitui a necropolítica, que justifica a morte de acordo com o elemento racial e baseado numa pseudoideia de segurança e de desenvolvimento. É isso que faz com que vítimas negras de homicídio e de mortes violentas por causa indeterminada sejam invisibilizadas. É assim que nomes e histórias são trocados por números, dados, estimativas.

São nomes como Marcelo Guimarães, Alan Diego, Victor dos Santos Lima, Kaio Guilherme da Silva Baraúna, Caio da Silva Figueiredo, Kathlen Romeu, Jefferson Guilherme da Costa Santos, Clayton Abel de Lima, Jamilton Bispo da Silva, Gabriel Hoytil Araújo, João Alberto Silveira Freitas e Ryan Silva Coutinho que se tornam estatísticas. De janeiro a dezembro, respectivamente, cada uma dessas pessoas perdeu a vida para o racismo. As estatísticas, que as unem pela cor, apontam que, aproximadamente, a cada 23 minutos uma pessoa preta é morta.

Depois de você tomar um banho e se arrumar, uma pessoa negra será morta. Ao terminar seu breve almoço, uma pessoa negra será morta. Enquanto você se diverte com amigos, pessoas negras são mortas. Assim que você terminar de ler este texto e refletir sobre a temática, mais uma pessoa negra será morta. Consciente dessa realidade, não são nem devem ser normais a omissão, o silêncio e a ausência de tomada de decisão e de práticas antirracistas.

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