Simone DemolinariPsicanalista com Mestrado e dissertação em Anomalias Comportamentais, apresentadora na 102,9 e 98 FM

Uma fonte contínua de sofrimento

Publicado em 14/04/2022 às 06:00.

Um dos maiores motivos de sofrimento deriva da dificuldade que boa parte das pessoas têm de falar “não”, se posicionar ou dizer a verdade quando quer recusar algo. Acabam por aceitar sem querer somente para não contrariar o outro.

Isso tem lá sua razão. A maioria das pessoas, apesar de afirmarem que preferem a verdade, não gostam de recebê-la quando a mesma é desfavorável para si.

Se você convida um amigo para uma festa de aniversario e ele diz que não irá pois está cansado e gostaria de descansar, o aniversariante costuma se sentir ofendido com a verdade e romper a amizade. Frente a essa situação rotineira, muitos optam por falar mentira. Dizem que estarão viajando, que terão outro compromisso, etc.

Agir assim faz com que a dificuldade em dizer o “não” fique ainda pior.

Mas o desconforto não tem apenas essa vertente, há outras razões para sentirmos tanta dificuldade e uma delas é o sentimento de culpa, principalmente naquelas situações em que há condições de atender o pedido, mas não há interesse.

Ajudar um parente na mudança ou emprestar dinheiro são alguns exemplos. Você dispõe do que o outro precisa, porém não gostaria de fazê-lo. E então, equivocadamente, nasce um sentimento de culpa. Sentimento que deriva da crença de que apenas o fator “falta de vontade” não é o suficiente. Uma espécie de lógica invertida onde o desejo de um prevalece e o do outro, não.

O que geralmente ocorre é que aquele que foi solicitado acaba cedendo à solicitação, tanto para evitar a culpa quanto para não se indispor com o amigo ou parente.

Outra dificuldade que sentimos em dizer “não” tem a ver com o medo da rejeição. Acreditam que ao negarem a solicitação de determinadas pessoas serão colocadas em segundo plano e com isso perderão prestigio e significância. Há quem chegue à situação extrema de comprar coisas que não gostou numa loja só pela dificuldade de dizer “não” ao vendedor que nem conhece.

Nessa vertente há quem ultrapasse o medo da rejeição e vá para o pavor, assim passam a oferecer ajuda não solicitada. Essas pessoas acreditam que para serem consideradas precisam agradar o outro de alguma forma e por isso nunca se posicionam de forma contrária, desagradam ou negam algo. Acabam se tornando exímios doadores, não pela generosidade, mas sim para garantir a continuidade de uma relação. Priorizam a vontade alheia mesmo em detrimento à sua, tudo para ser aceito.

Há também um lado obscuro da dificuldade em dizer “não” que tem origem na vaidade. Pessoas que querem ser enaltecidas optam por realizar todas as vontades do outro sem medir esforços. Se sacrificam, se endividam, pedem favores a terceiros, não há limites para ser reconhecido como  “o coração de ouro".  Pura vaidade!

As motivações podem ser por culpa, medo, aceitação ou vaidade, mas quem diz “sim” quando na verdade gostaria de dizer “não” é um prisioneiro de si mesmo, e mesmo afirmando que a doação é desapegada de interesses, na maioria das vezes não é verdade . Basta ver a decepção que nasce quando se depara com a ingratidão daqueles que tanto recebeu.

Aprender a dizer “não” e  ser justo consigo, além do sentimento de liberdade, demonstra grande maturidade emocional. Vale a pena tentar! 

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