A hora da verdade

Publicado em 22/05/2024 às 06:00.

Cristiane Helena de Paula Lima Cabral*

Criado há mais de vinte e seis anos, o Tribunal Penal Internacional (TPI) foi uma resposta da sociedade internacional à ausência de um órgão responsável por proceder ao julgamento de indivíduos que cometessem crimes contra toda uma população ou um determinado grupo de pessoas. Até então, as ações ficavam a cargo de Tribunais ad hoc sem que houvesse uma jurisdição internacional como um todo.

Tendo como histórico os Tribunais de Nuremberg, Tóquio, Ruanda e Antiga Iugoslávia, o TPI traz em seu estatuto a competência para processar e julgar àqueles que cometem crimes de guerra, genocídio, agressão e crimes contra humanidade. São aquelas condutas que ultrapassam as fronteiras de um Estado e que, indiretamente, refletem em toda a ordem internacional, e, portanto, não podem ficar sem qualquer tipo de responsabilização.

Cabe pontuar que não há julgamento sem a presença do réu e que a pena máxima aplicável é de trinta anos, com a possibilidade de adoção da pena de prisão perpétua a depender da gravidade do caso.

Atualmente seu tratado constituidor tem a ratificação de cento e vinte e quatro Estados, dentre eles o Brasil (mas não conta, por exemplo, com a adesão dos Estados Unidos, Rússia e Israel), tendo assim jurisdição nestes territórios, mas de forma subsidiária, ou seja, atua quando não houver qualquer tipo responsabilização interna por parte dos seus membros.

Desde a sua criação, o TPI se ateve a julgar e processar, especialmente, os Chefes de Estado/Governos africanos, o que provocou diversas críticas, principalmente por não abordar assuntos polêmicos como Guantánamo e a Guerra no Iraque e Afeganistão pós 11 de setembro.

Porém, recentemente, o Tribunal deu um passo importante na proteção dos direitos humanos dos indivíduos envolvidos em conflitos armados a partir do momento em que o seu procurador Karim Khan pede que sejam expedidos mandados de prisão contra o Primeiro-Ministro israelense, Benjamin Netanyahu, o seu ministro da Defesa, Yoav Gallant, e três líderes do Hamas, o seu chefe Yahya Sinwar, o comandante militar do grupo, Mohammed Al-masri e, o chefe do órgão político Ismail Haniyeh, por supostos crimes de guerra.

A eventual autorização da expedição do mandado de prisão encontrará barreiras para o seu cumprimento já que Israel não faz parte do TPI. Porém, caso Netanyahu viaje para algum dos 124 países partes do Tribunal ela deverá ser cumprida.

Como exemplo, pontue-se que Vladmir Putin não tem viajado muito para fora da Rússia, justamente evitando ser preso pelo TPI. Quando o faz, preocupa-se em ir para Estados que não reconhecem a jurisdição do Tribunal (o TPI expediu um mandado de prisão contra o presidente Russo em 2023).

Apesar de todas as críticas que envolvem essa decisão, principalmente por parte dos aliados de Israel (e aqui, os Estados Unidos, em especial), não se pode deixar de elogiar a referida deliberação haja vista a necessária responsabilização de ambos os lados por todas as atrocidades praticadas naquela região.

Porém, o grande questionamento que fica é: o Tribunal vai conseguir prender Netanyahu e os líderes do Hamas? Aguardemos o desenrolar dessa história.

* Doutora em Direito Público Internacional pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Professora do Curso de Direito das Faculdades Kennedy e Promove. E-mail para contato: crishelenalima@gmail.com

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