Pauta congelada: Escola sem Partido impede tramitação de propostas no Legislativo de BH

Paulo Henrique Lobato
10/10/2019 às 20:23.
Atualizado em 05/09/2021 às 22:10
 (Riva Moreira)

(Riva Moreira)

Propostas importantes para Belo Horizonte, como um projeto que poderá atrair até R$ 100 milhões em investimentos para o município, aguardam o fim do impasse na Câmara Municipal por causa do Projeto de Lei 274/17, apelidado de Escola sem Partido. O texto, de autoria da bancada ligada a movimentos religiosos, tornou-se uma “pedra no sapato” na Casa, pois trava a pauta no Legislativo há 11 dias.

A oposição, que tem minoria na Câmara, usa normas regimentais para impedir o avanço do Escola sem Partido. Uma das estratégias é aproveitar ao máximo o tempo de fala no microfone do plenário. Os defensores do projeto, por sua vez, tentam acelerar a votação. 

Entre os projetos considerados importantes, mas que estacionaram, está o 747/19, que trata da concessão por 25 anos de seis feiras e mercados, como o Santa Tereza e o Cruzeiro, à iniciativa privada. A PBH Ativos, estatal criada em 2001 para dar suporte técnico especializado à prefeitura na execução das políticas públicas, estima que as concessões poderão atrair investimentos de R$ 40 milhões a R$ 100 milhões, gerando emprego e renda.

Além dos mercados do Santa Tereza e do Cruzeiro, fazem parte desta lista a Feira Coberta do Padre Eustáquio, a Central de Abastecimento do bairro São Paulo, o Mercado Popular da Lagoinha e o quarto andar do Mercado Novo, no Centro.

O outro projeto na fila é o 750/19, que cria a carreira do advogado público autárquico e institui o plano de carreira da categoria, com vencimentos que vão de R$ 6,3 mil a R$ 12,4 mil. 

O texto permite um rearranjo entre auditores e advogados da prefeitura para que o profissional lotado em um órgão ou autarquia possa advogar naquele em que não foi concursado. A título de exemplo, o profissional aprovado em concurso na Sudecap poderá defender os interesses do município nas secretarias de Meio Ambiente, Educação ou Saúde.

A estratégia geraria economia aos cofres públicos e celeridade nas causas de interesse da cidade.

Prejuízos
“Essa paralisação causa uma perda para Belo Horizonte. São 11 dias (com a pauta travada). Levando-se em conta que a Câmara Municipal custa R$ 250 milhões por mês, e que há 10 sessões no mês, o custo (com a paralisação) é de R$ 25 milhões por dia”, calculou o vereador Mateus Simões (Novo), favorável à desobstrução da pauta.

Parlamentares da oposição, contudo, lembram que manobras regimentais fazem parte da democracia. 

O vereador Gilson Reis (PC do B), contrário ao Escola sem Partido, destaca que a proposta de lei é inconstitucional e que, na hipótese de o projeto ser aprovado, a bancada irá recorrer à Justiça.

“Queremos que o projeto seja retirado de pauta. O Supremo (Tribunal Federal) entendeu (em liminar) que (a Escola sem Partido) é inconstitucional”, disse Reis, se referindo a uma liminar concedida pelo ministro do STF Luís Barroso que suspendeu os efeitos de uma lei semelhante aprovada em Alagoas.

Já o líder do governo na Câmara Municipal, Léo Burguês (PSL), procurou amenizar o impasse entre oposição e religiosos. Para ele, os projetos à espera do fim do imbróglio serão aprovados posteriormente. “O Legislativo não está parado. Pelo contrário, estamos trabalhando. Até tarde, inclusive” afirmou.
Assinado por 21 dos 41 vereadores de Belo Horizonte, o projeto que institui a “Escola sem Partido” foi protocolado na Câmara Municipal de Belo Horizonte em junho de 2017 e está pronto para ser votado  em primeiro turno.

 Em dia mais ameno, acordo permite votação de requerimentos 

Após um acordo entre a frente cristã e o bloco de esquerda da Câmara Municipal de Belo Horizonte, na tarde de ontem, os vereadores votaram três dos 12 requerimentos do projeto da Escola sem Partido. A sessão no plenário foi encerrada no fim da tarde por falta de quórum.

Diferentemente do que ocorreu na tarde de quarta-feira (9), quando houve tumultos e agressões nas dependências da Casa, inclusive envolvendo parlamentares, o dia, ontem, foi tranquilo. Mesmo assim, um forte esquema de segurança foi montado dentro e fora da Câmara.

Segundo o vereador Wesley da Autoescola (PRB), que é o líder da frente cristã, autora do projeto, o objetivo é que os nove requerimentos que ainda restam sejam votados já na sessão de hoje. Ele acredita que na segunda-feira (14) finalmente seja possível votar o polêmico projeto.

Ontem, dezenas de estudantes e professores lotaram a entrada da Câmara, em protesto contra o projeto, que eles consideram uma “mordaça à educação”. Questionado, o líder da frente cristã disse que era para a Casa estar repleta de apoiadores do Escola sem Partido, porém, após a confusão de quarta-feira, o bloco usou as redes sociais para pedir que eles não comparecessem.

“Os professores, a esquerda, se opõem ao projeto, mas nós agimos com muita tranquilidade, pois nós temos uma grande população cristã em BH, estimo que mais de 60% da população, que apoia o projeto”, disse Wesley. 

Minorias
Já a vereadora Cida Falabella (Psol), do bloco da esquerda, defendeu que a obstrução é um instrumento que as minorias políticas têm para impedir que a maioria “tratore” com projetos que não são de interesse da sociedade. 

“Um projeto que não tem profundidade de debate na sociedade, construído a partir de fake news, com teorias inventadas. O nosso objetivo era promover o debate”, defende.

Ela explicou ainda que o bloco sabia que a obstrução seria um enfrentamento longo, mas que também tinha consciência de que em algum momento ela chegaria ao fim. “Não estamos fechados ao diálogo, nós clamamos por uma interlocução. A obstrução acontece para existir algum tipo de diálogo, o que não aconteceu”, finalizou a parlamentar. (José Vítor Camilo)
 

 Reis acusa Simões de agressão e registra boletim de ocorrência

O vereador Gilson Reis (PCdoB), que aparece sendo empurrado pelo vereador Mateus Simões (Novo) em um vídeo gravado nas dependências Câmara Municipal de Belo Horizonte durante sessão plenária da última quarta-feira (9), afirmou que já registrou um boletim de ocorrência na Polícia Civil contra o parlamentar do Novo por agressão e calúnia.

“Meus advogados estão analisando o que pode ser feito no âmbito administrativo e tomaremos as medidas necessárias. Não podemos permitir que a Câmara Municipal se torne um MMA”, declarou Reis.

Simões, por sua vez, se defendeu com a alegação de que apenas reagiu a uma agressão do vereador do PCdoB, mas se desculpou durante pronunciamento em plenário. “Eu lhe desculpo, Gilson Reis, porque você é um inconsequente, mas também peço desculpas pela minha intemperança”, disse o parlamentar.

Mesmo assim, Reis afirmou que iria ao Instituto Médico Legal (IML) para realizar o exame de corpo de delito e seguir com as providências legais contra Mateus Simões.

 SAIBA MAIS

O Projeto de Lei 274/17, que trata da instituição do Programa Escola Sem Partido em Belo Horizonte, prevê que “o poder público não permitirá qualquer prática capaz de comprometer o desenvolvimento de sua personalidade em harmonia com a respectiva identidade biológica de sexo, sendo vedada, especialmente, a aplicação dos postulados da teoria ou ideologia de gênero”. Também proíbe o professor de apresentar suas opiniões aos alunos durante as aulas. A proposta é defendida por uma frente de vereadores ligados a movimentos religiosos. Já os críticos do projeto dizem que ele impõe “uma visão única e retrógrada dentro da escola”.

Os parlamentares de esquerda classificam a proposta como inconstitucional, com base em decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso, que concedeu liminar suspendendo uma lei do Estado de Alagoas, que traz conteúdo semelhante ao do PL 274/17. Na liminar, Barroso afirma que a lei alagoana “viola o direito à educação e invade competência exclusiva da União”. A Advocacia Geral da União (AGU) também considerou a lei de Alagoas inconstitucional por usurpar competência da União. AGU alegou ainda que a lei afronta o princípio constitucional (previsto no artigo 206 da Constituição) de que “o ensino deve respeitar o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas”. 

  

“Nós não estamos fechados ao diálogo, nós clamamos por uma interlocução. Pedimos a retirada do projeto, que é polêmico, e ficamos sem ter com quem conversar. A obstrução acontece para existir algum tipo de diálogo, o que não aconteceu, e é um dos motivos para que ela se arrastasse tanto”Cida FalabellaVereadora do PSOL

  

  

“Os professores, a esquerda, se opõem ao projeto (da Escola sem Partido), mas nós agimos com muita tranquilidade, pois nós temos uma grande população cristã em Belo Horizonte, estimo que mais de 60% da população, que apoia muito esse projeto”Wesley da AutoescolaVereador do PRB
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