Brutalismo: de simplificador de acabamentos a estilo moderno, ousado e elegante

Patrícia Santos Dumont
26/03/2019 às 15:45.
Atualizado em 05/09/2021 às 17:58
 (Pinterest/Divulgação)

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Simples que virou sofisticado. Assim pode ser definido o brutalismo – estilo arquitetônico que nasceu no pós-guerra como solução para a escassez de materiais e que se transformou em referência moderna e ousada na arquitetura e na decoração. Caracterizado pelo uso de materiais em estado natural (bruto), cria uma estética “limpa” e refinada nos locais onde aparece.

Algumas das “marcas registradas” dessa linguagem são lajes em concreto e vigas em aço, ambas com aparentes fios de iluminação, canos e tubulação, tudo propositalmente deixado à mostra. A ideia por trás da estética naturalista, “sem maquiagem”, explicam as arquitetas Natália Botelho e Paola Corteletti, do escritório Botti Arquitetura, em Belo Horizonte, é valorizar a história da edificação e não a imagem passada por ela. 

“A busca pelo brutalismo está na necessidade, muitas vezes inconsciente, de querermos algo prático, funcional. No mundo acelerado e imediatista que vivemos, as pessoas buscam descomplicar o que presenciam e experimentam no dia a dia”, detalham as profissionais, justificando a “volta” do estilo secular, presente na arquitetura propriamente dita e também no designer de interiores. 

Sem firulas

Derivado da expressão francesa béton brut (concreto bruto, na tradução para o português), o movimento arquitetônico nasceu entre as décadas de 1950 e 1960. Naquela época, era necessário conduzir a construção civil num contexto de crise, de escassez de materiais, portanto. Obras simples, sem firulas, eram palavra de ordem. Nelas, o objetivo era que a construção cumprisse a função esperada. 

“Utilizavam-se menos adornos, apostando em peças de mobiliário autoral brasileiro e, assim, tropicalizando o movimento. A preocupação não era tanta com a estética no sentido da linguagem arquitetônica, mas com a funcionalidade do projeto”, reforça o arquiteto Junior Piacesi relembrando a origem da estética brutalista.

Passados mais de 50 anos, não é difícil encontrar heranças do movimento tanto arquitetura quanto na decoração. Segundo Junior Piacesi, o brutalismo pode ser empregado em qualquer ambiente, desde que o resultado desejado esteja claro. “Em uma sala de jantar, por exemplo, a referência materializada numa estética mais pesada e austera pode ser cansativa e extremamente desgastante para o usuário, já que trata-se de um ambiente de permanência longa. Um lavabo, por sua vez, receberia bem essas características mais pesadas”, detalha. 

Quem deseja aderir à estética mais realista pode anotar algumas referências ensinadas pela arquiteta Nina Abadjieff: concreto bruto, revestimentos mais rústicos, como tijolos, paredes com materiais expostos, elementos estruturais como vigas e colunas aparentes, menos ornamentação, madeira, vidros, estruturas metálicas. 

“Quando o movimento começou, as pessoas não estavam prontas para o conceito de honestidade na arquitetura. Hoje, as necessidades e prioridades são outras. É possível aderir ao conceito do ‘menos é mais’. A simplicidade das formas, a permeabilidade, o concreto aparente e o ar industrial são mais valorizados”, opina. Acervo da Biblioteca da FAU/USP

EXEMPLAR CLÁSSICO - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP é um dos exemplares de estética brutalista em São Paulo: colunas à mostra e concreto aparente são marcas registradas

Capital paulista é uma das cidades com maior número de edifícios com estética brutalista​

Maior cidade brasileira, São Paulo é também berço de importantes exemplares do brutalismo. Um dos mais emblemáticos, destacado por profissionais da área, é o edifício-sede da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) – projetado em 1961 e concluído oito anos depois. 

Marco da arquitetura moderna no Brasil, tem concreto armado, esquadrias e acabamentos aparentes, além de outros componentes de aspecto industrial que ajudam a reforçar a importância dos materiais naquilo que os arquitetos consideram como honestidade construtiva.

“O brutalismo foi marcado pela releitura de técnicas e materiais que já haviam sido utilizados vastamente na arquitetura moderna. Foi nesse estilo que o concreto aparente ganhou força, como fica claro nas obras de Lina Bo Bardi e Paulo Mendes da Rocha, por exemplo”, explica o arquiteto Junior Piacesi. 

Os profissionais mencionados por ele foram responsáveis pelos projetos do Museu de Arte de São Paulo (Masp) e do Sesc Pompeia, e pelo Ginásio do Clube Paulistano e do Museu Brasileiro da Escultura e Ecologia, respectivamente. Os quatro edifícios estão localizados na capital paulista. 

Tudo à mostra

Revisitado na decoração atual, o estilo arquitetônico preza pela simplicidade na forma de se pensar o uso dos materiais – um dos valores do milênio, conforme reforça o arquiteto belo-horizontino. “É o desejo de não se esconder o que é utilizado, de priorizar a transparência no uso de materiais. Algo como uma verdade estética”, coloca Junior Piacesi. 
Em projetos residenciais, o brutalismo aparece na leveza, na economia de adornos e enfeites e na sofisticação e elegância comprovadas mais na concepção do projeto e da decoração do que no conceito propriamente dito. 

Queridinho na decoração moderna, opção de acabamento prático e barato, o cimento queimado pode ser usado sem medo por quem deseja apostar na tendência mais “bruta” dentro de casa. Embora não seja característica obrigatória dessa estética, faz as vezes do concreto armado em ambientes internos.Henrique Queiroga/Divulgação

CHIQUE - Projeto da Botti Arquitetura, de Belo Horizonte, prova que é possível recorrer ao brutalismo e ter um ambiente sofisticado, cheio de personalidade. Arquitetas aplicaram cimento queimado na parede de fundo, material que faz as vezes do concreto aparente, mas capricharam na decoração

Veja outras ideias para aderir ao brutalismo em casa:Pinterest/Divulgação

SEM MAQUIAGEM - Assim como é possível quebrar a rigidez com móveis leves, modernos ou cores em paredes e acessórios, dá para fazer a linha “100% bruta” com uma ou mais referências ao estilo arquitetônico, como os banquinhos da cozinha acima, com pés de ferro, e os fios aparentes das lumináriasPinterest/Divulgação

SEM REBOCO - Tijolinhos da parede foram deixados à mostra de propósito; ideia foi criar um ambiente moderno, arrojado e irreverente, que não escondesse a essência da concepçãoFotos: Pinterest/Divulgação

MARCA REGISTRADA - Principal característica do estilo arquitetônico é o uso do concreto aparente ou de materiais que traduzam esse aspecto. Nos três ambientes retratados pelas fotos – sala de estar, quarto e sala de jantar – esse é o ponto em comum. Para deixar os espaços mais modernos e leves, cores e mobiliário foram escolhidos a dedo. No primeiro projeto, a estética brutalista é combinada a peças modernas e arrojadas; no segundo, espécie de dossel com pegada industrial compõe a decoração mais “crua”; no terceiro, tons de cinza e azul arrematam as escolhas

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