A síndrome de Luís de Camões

Hoje em Dia
02/01/2014 às 07:30.
Atualizado em 20/11/2021 às 15:06

O grande poeta Luís Vaz de Camões, uma das maiores figuras da literatura em língua portuguesa, sentenciava 500 anos atrás: “Jamais haverá ano novo se continuar a copiar os erros dos anos velhos”. Essa máxima serve de emblema para o que estamos vendo em Minas Gerais com relação às chuvas, enchentes e inundações e penalização sobretudo das populações mais carentes.   Como nos dizeres de Camões, as catástrofes climatológicas são fruto de anos e anos de omissão do poder público e falta de conscientização e de treinamento dos residentes às margens dos rios. O lixo e entulho lançados nas águas diminui a profundidade dos rios – o assoreamento –, o que provoca, na época das chuvas, o retorno do lixo e o transbordamento e inundação de cidades, casas, comércios, propriedades rurais.   O período de chuvas ocorre todos os anos. Em Minas, ele acontece por volta de outubro até março do ano seguinte. As atividades e intervenções humanas podem agravar ou minimizar os impactos causados pelos desastres naturais. Então, não há como explicar a omissão ou “esquecimento” das autoridades no sentido de criarem políticas sérias de prevenção de catástrofes.   O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) aponta que o “agravamento das catástrofes climáticas está diretamente associado ao desrespeito à natureza, através dos desmatamentos, queimadas, poluição dos rios, acúmulo de lixo, ocupação desordenada, ausência de plano diretor, entre outros”. Ou seja, a atividade humana é diretamente responsável pelo problema. Ela também pode, e deve, ser a solução.   Em recente entrevista radiofônica, o arquiteto e urbanista Jaime Lerner, prefeito de Curitiba por três vezes, comentou que conseguiu evitar a ocupação desordenada dos rios construindo campos de futebol em suas margens. Ao mesmo tempo, também preservava a vegetação ribeirinha, a chamada mata ciliar. Assim, conseguiu desestimular as invasões e o consequente assoreamento.   Outro exemplo é o caso do rio Tâmisa, na Inglaterra, que chegou a ser apelidado de o “Grande Fedor” no século 19, pela sujeira de suas águas. A partir de 1860, começou-se a pensar em como despoluí-lo. O problema é que todo o esgoto de Londres era lançado nele. Criou-se então o sistema de captação, que lançava a sujeira quilômetros abaixo. Funcionou por algum tempo, mas logo depois o rio voltou a ficar sujo. Só em 1950 é que foram instaladas as estações de tratamento, quando são retiradas as impurezas do esgotamento. Vinte anos depois o primeiro salmão subia o Tâmisa. Esse peixe é especialmente sensível à poluição. Então, o rio estava limpo.   Foram anos e anos de tentativa e fracasso, mas o intento foi perseguido e obtido. É isso o que a mentalidade brasileira precisa incorporar, ou vamos ter todos os anos as mesmas tristes manchetes nos jornais.

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por