Bancada em conflito: disputas ideológicas podem prejudicar pautas importantes para Minas

Lucas Simões
23/03/2019 às 18:24.
Atualizado em 05/09/2021 às 17:56
 (Luís Macedo/Câmara dos Deputados)

(Luís Macedo/Câmara dos Deputados)

Os desdobramentos da polarização sem trégua entre direita e esquerda, mesmo após o fim da eleição presidencial protagonizada por PSL e PT em 2018, prometem dificultar a defesa de interesses comuns dos mineiros no Congresso. Na Câmara Federal, a criação de dois blocos de oposição, que promoveu um racha na esquerda, trouxe reflexos negativos para a negociação de prioridades como reforma da Previdência, pacto federativo e a eventual revisão da Lei Kandir. Por outro lado, nem todos os mineiros que integram o bloco da situação estão totalmente alinhados com as prioridades do governo de Jair Bolsonaro (PSL) que, de alguma maneira, interferem na realidade de Minas.

Dos 53 deputados federais mineiros eleitos, a maior bancada é a do PT, que soma oito parlamentares. Logo atrás está o PSL, que saltou de um representante para seis. Nesse clima, a reforma da Previdência tem provocado um forte lobby no Congresso, com ênfase nos dois partidos. 

Em Minas, o governador Romeu Zema (Novo) anunciou apoio total à proposta, a partir da criação, na semana passada, do Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Consud), formado por sete estados que têm barganhado em Brasília o apoio de parlamentares à proposta. A previsão é a de que Zema esteja hoje e amanhã na capital federal, onde, além de participar de uma reunião entre os governadores e integrantes do governo federal, deve ajudar a articular a defesa da reforma previdenciária. 

No entanto, o projeto não tem a simpatia integral de todos os deputados federais mineiros.Na própria ala de apoio governista, os deputados mineiros Charles Evangelista (PSL) e Delegado Marcelo Freitas (PSL), ambos estreantes na Casa, são favoráveis à reforma, mas com ressalvas. 
Outro novato na Câmara Federal, Tiago Mitraud (Novo), também tem pontos de divergência em relação ao projeto. “O Brasil está quebrado e precisa de uma reforma. Mas existem pontos que precisam de discussão, como a aposentadoria rural e, posteriormente, rever a questão dos militares. Uma coisa inadmissível é que servidores militares inativos tenham salários equiparados com os da ativa”, disse o deputado do Novo.

Na oposição, a situação é mais complexa. Enquanto o PT lidera um bloco de alta rejeição à reforma da Previdência — com apoio do PSOL, PSB, Rede — o outro bloco de oposição, liderado pelo PCdoB e encorpado por Avante, PPS, PHS e Patriota, fez ressalvas ao projeto, mas não tem levado a público críticas mais severas. 

O deputado federal mineiro André Janones (Avante) avalia que não é “prudente travar a pauta com uma rejeição drástica” ao projeto. “A reforma é necessária, mas ainda analiso como ela poderia ser feita. Certamente alguns pontos têm que mudar. Mas não dá para boicotar o projeto”, disse.

Em contrapartida, o deputado federal Reginaldo Lopes (PT), o segundo mais votado em Minas, faz uma aberta campanha pela não aprovação da reforma. O petista integra a Frente Parlamentar Mista em Defesa da Previdência Social, que tem promovido uma série de debates para barrar a proposta. “Aprovar esse projeto é condenar o futuro do país e, diante do clima tenso no governo de Bolsonaro, acho difícil ir para frente. A reforma é necessária, mas não essa reforma. Acho que toda a esquerda tem essa consciência, embora alguns parlamentares estejam tentando barganhar com o governo”, critica Lopes, sobre a divisão dos deputados de esquerda em dois blocos de oposição.

Os três senadores mineiros são favoráveis à reforma da Previdência, mas com ressalvas. Para Antonio Anastasia (PSDB), é necessária uma revisão. Em nota, a assessoria do tucano informou que o senador “considera a reforma da previdência necessária e vê méritos na proposta”, no entanto, “há pontos que merecem atenção, discussão e modificações, casos, por exemplo, da aposentadoria rural e do BPC”.

Pacto federativo divide opiniões, mas Lei Kandir é consenso

trelada à reforma da Previdência, a revisão do pacto federativo deverá ser encaminhada concomitantemente ao Congresso em formato de Proposta de Emenda à Constituição (PEC). O projeto está sendo elaborado pelo ministro da economia, Paulo Guedes. Ele adiou a apresentação de uma proposta, que seria feita nesta semana, para ouvir governadores e prefeitos. Entre os mineiros, apesar de a maioria dos parlamentares ser favorável à revisão, não há consenso sobre a atuação política.

Por um lado, deputados da oposição não querem que a revisão do pacto federativo seja condicionada à reforma da Previdência. “O Paulo Guedes quer enviar a PEC do pacto ao Senado, enquanto a Câmara analisa a reforma da Previdência. É injusto, porque pressiona as Casas a atrelarem as votações. Vamos trabalhar para isso não acontecer”, disse Rogério Correia (PT). 

Já na base do governo, há o desejo de os projetos serem aprovados ao mesmo tempo. “Uma coisa depende da outra. E o pacto é uma justiça aos estados e municípios brasileiros, que precisam de mais autonomia e recursos. Isso com certeza vai facilitar a adesão à reforma da Previdência, que é essencial”, avalia o deputado federal Junio Amaral (PSL), que cumpre o primeiro mandato.

Apenas na discussão da Lei Kandir os mineiros estão unidos na Câmara Federal. Dos R$ 637 bilhões estimados em perdas dos 27 estados e do Distrito Federal por causa da legislação criada em 1996, que isentou empresas de pagar ICMS sobre importação de produtos primários, Minas lidera o ranking dos que mais têm a receber: 21% dessa fatia, o equivalente a R$ 135 bilhões. 

O líder da bancada mineira na Câmara, o deputado federal Diego Andrade (PSD), sugeriu que a CPI de Brumadinho, criada na Casa, também avalie a revisão da Lei Kandir — que beneficia a atuação das mineradoras no Estado. “Hoje, acredito que a União tem mais consciência da bola de neve que virou para os estados, principalmente Minas Gerais, que tem sua economia baseada no minério e sofreu, nos últimos quatro anos, duas catástrofes. Tenho trabalhado para levar essa discussão para a CPI”, diz o deputado do PSD. 

Divergências sobre pacote anticrime e desarmamento

Além da urgência da discussão travada sobre a reforma da Previdência e o pacto federativo, a bancada mineira no Congresso também diverge sobre outras pautas igualmente polêmicas, como a revisão do Estatuto do Desarmamento e o pacote anticrime. As pautas são consideradas prioritárias para o presidente Jair Bolsonaro (PSL) porque foram mote de sua campanha eleitoral. 

Paralelamente à Previdência, o ministro da Justiça, Sérgio Moro, tenta dar celeridade ao pacote anticrime, constituído por 14 pontos principais que alteram o Código Penal, a Lei de Execução Penal, a Lei de Crimes Hediondos e o Código Penal. Um dos pontos mais polêmicos diz respeito à legítima defesa, que reduz a pena até a metade ou simplesmente deixa de aplicá-la, caso haja situação de “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”.

O deputado federal Reginaldo Lopes (PT) é um dos principais parlamentares contrários ao projeto. O petista lembra que a liberação do porte de arma por meio de decreto do presidente Bolsonaro alarmou a população. “O pacote anticrime é uma licença para policiais matarem em serviço. Não é anticrime, é a favor da matança. E o porte de arma liberado foi o início para a criação dessa cultura. Vamos impedir a posse de arma e anular esse pacote”, critica o petista. 

Já o deputado federal Junio Amaral (PSL) vê no projeto a chance de aperfeiçoar mecanismos já existentes. “Hoje, há uma dificuldade enorme de os policiais realizarem seu trabalho. A lei visa dar autonomia a eles. Assim como aconteceu com a liberação do porte de arma, o primeiro passo para, no futuro, termos a posse. O cidadão tem o direito de estar protegido”, afirma.

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