Bancada evangélica ganha espaço e consolida-se como a maior da Câmara de BH

Filipe Motta
fmotta@hojeemdia.com.br
15/09/2017 às 21:02.
Atualizado em 15/11/2021 às 10:35
 (Abraao Bruck/CMBH )

(Abraao Bruck/CMBH )


Culto à tradicional família cristã, combate ao que chamam de ideologia de gênero, proteção aos interesses das comunidades religiosas das quais fazem parte. E uma carona na “onda Bolsonaro”. O grupo de 16 parlamentares evangélicos da Câmara de Belo Horizonte segue a toada de exposição de posicionamentos conservadores presente no Congresso e que se projeta nas “guerras” de palavras vivida nas redes sociais.

Nesse percurso, polarizam com as propostas dos cinco vereadores de esquerda da Casa e tentam, diante do prefeito Alexandre Kalil (PHS), mostrar força enquanto grupo hegemônico.

Dos últimos meses pra cá, o vereador Jair di Gregório (PP), liderança da Assembleia de Deus, caminha pelos corredores articulando a “bancada evangélica”. No início da semana passada, enquanto conversava com a reportagem, tirou o celular do bolso e mostrou as fotos dos membros de um grupo de Whatsapp com 25 vereadores. “Agora não é mais bancada evangélica. É bancada Cristã, a bancada da família”, disse Jair, enquanto enviava um convite virtual para o líder de governo, Léo Burguês (PSL), aderir ao grupo. Aos 16 evangélicos, somam-se parte dos católicos e um espírita.

“Falaram que era bancada Cristã. Sou católico. Então me coloca, eu falei”, contou Burguês.
Neste ano, a maior vitória do grupo conservador aconteceu à época da votação da reforma administrativa, projeto do Executivo. Na ocasião, a bancada conseguiu barrar a proposta de implementação de um conselho de políticas LGBT. A força dos evangélicos ficou expressa quando o prefeito Alexandre Kalil (PHS) desistiu de apoiar a criação do conselho para ver o restante do projeto aprovado.

“Não discriminamos ninguém, mas defendemos a família. Família é homem e mulher”, disse Elvis Côrtes (PSD).
O grupo ressuscitou uma nova versão do projeto “Escola sem Partido”. A matéria tinha sido arquivada, no início do ano, por articulações de vereadores de esquerda e já foi considerada inconstitucional pelo Ministério Público.

Durante a última semana, diante de rumores sobre a possibilidade de Belo Horizonte receber a exposição “Queermuseu” – fechada pelo Santander Cultural em Porto Alegre após mobilização de grupos conservadores –, a bancada rapidamente se reu[/TEXTO]niu, com a presença de Burguês, para construir e enviar a Kalil uma mensagem de repúdio à possibilidade.

“Se o secretário de Cultura (Juca Ferreira) trouxer a mostra, vamos para rua, junto com as famílias, para barrar. Pode nos taxar do que quiser. Pode falar que está censurando, o que for, mas não vai acontecer em BH de jeito nenhum”, declarou Jair.

Parlamentares tidos como moderados afirmam que há um “conservadorismo brucutu” na Casa. Algumas vezes, comparam membros do grupo evangélico com outro Jair, o Bolsonaro. A comparação com o presidenciável e deputado do PSC não ofende Jair de Gregório.

“Não vejo problema em comparar não. Vejo mais coisa que eu gosto nele do que não gosto. Mas ainda não diria que ele será nosso candidato”, disse Jair.


Novas regras para funcionamento e construção de templos religiosos entram no foco

Até mesmo as discussões sobre a aprovação do Plano Diretor para a capital mineira será alvo da bancada cristã. Parte dos vereadores teme que o projeto interfira na construção de novos templos e no funcionamento dos atuais - como restrição das vagas de garagem, tamanho das edificações e das calçadas.

“Não interessa só a nós. Tem a ver com a igreja católica, terreiro... Tudo quanto é religião”, disse Jair di Gregório.
Mesmo com a força que a bancada cristã ganha no Legislativo municipal, na semana passada, houve um recuo em uma das polêmicas propostas do grupo.

Um projeto de autoria do vereador Fernando Borja (PTdoB), que previa a aplicação de punições para adolescentes que cometessem atos de indisciplina em escolas, foi arquivado com votos de colegas evangélicos. O texto foi considerado duro demais por alguns. O resultado gerou bate boca no plenário.

“Eles tiveram dúvidas, muitos se abstiveram – não souberam se votariam sim ou não. Isso mostra que não é bem uma bancada, né?”, disse Borja, que é pastor da Igreja Batista da Lagoinha e mostrou-se indignado com a falta de apoio dos colegas.

Estado laico

A forma como parte das discussões são conduzidas é motivo de crítica de vereadores que não se alinham ao grupo.
“Sempre que se mistura questões religiosas com política temos fundamentalismo, intolerância. É preciso cuidado para que, dentre vários pontos, não se massacre outras religiões, como as de matriz africana, bem como outras configurações de família”, afirmou Arnaldo Godoy (PT).

Mateus Simões (Novo) também critica. “Além do risco de se misturar política e religião, o que contraria o princípio do Estado laico, há o risco dessa atuação virar palanque para a promoção pessoal de alguns”, disse.

Sobre a existência do Estado laico, Elvis Côrtes rebate. “Para mim é tudo balela. Se fosse para ser laico mesmo, não tinha crucifixo em lugar nenhum. Na minha maneira de ver, tinha que separar, mas as duas coisas se fundem lá no fundo. É a mesma coisa de separar alma e espírito. Não tem jeito”, argumentou.

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