Brasil arrisca viver nova ‘década perdida’

Raul Mariano - Hoje em Dia
04/10/2015 às 07:58.
Atualizado em 17/11/2021 às 01:56
 (Lucas Prates/Hoje em Dia)

(Lucas Prates/Hoje em Dia)

O histórico de desaceleração da economia brasileira nos últimos cinco anos já é apontado por economistas como um indicativo de que podemos estar vivendo mais uma ‘década perdida’, como convencionou-se chamar os anos 80. Com a repetição da combinação de baixo crescimento e intensos conflitos políticos, as comparações da crise atual com as dos 80 e 90 são inevitáveis.

O crescimento do Produto Interno Bruto, que no primeiro ano desta década foi de 7,5%, despencou para 0,1% em 2014 e fechará negativo neste ano. E a taxa Selic (o juro básico da economia), que atingiu o piso histórico de 7,25% ao ano em 2012, hoje está em 14,25%, o que inibe consumo e investimentos, retirando capacidade de reação da economia. E apesar dos juros, a inflação ainda se mostra inflexível, tendo fechado agosto último em 9,5%, contra os 5,9% registrados em 2010.

Sem a expectativa de mudanças de cenário para o próximo ano, a crise é agravada pela incapacidade de articulação política do governo que, a duras penas, tenta aprovar no Congresso um projeto de ajuste fiscal para equacionar contas públicas. Para o economista Flávio Constantino Barbosa, professor da PUC Minas, o país chegará a 2017 com um crescimento pouco expressivo. Ou seja, já se terá ‘perdido’ mais da metade da década.

“A história nos mostra que quando se chega a esse ponto é porque o modelo de desenvolvimento adotado fracassou. O ex-presidente Fernando Collor caiu devido a uma combinação de crise política com economia muito ruim. Será necessário um caminho diferente deste que ficou esgotado nos últimos 15 anos”, explica.

Atenuantes

As maiores diferenças entre as crises das décadas de 80 e 90 e o momento atual estão ligadas à segurança oferecida pelo Brasil aos credores internacionais. Hoje, o país possui uma reserva de mais de US$ 370 bilhões, o que garante a capacidade de honrar os pagamentos externos. Na década de 1980, a inexistência de reservas da moeda americana foi o que tirou credibilidade e capacidade de financiamento do país para ultrapassar a crise. O Brasil, à época, ficou impossibilitado de pagar os compromissos externos que já possuía desde a década de 1970.

Na avaliação do vice-presidente do Conselho Regional de Economia de Minas Gerais (Corecon-MG), Pedro Paulo Pettersen, o componente político é o grande diferencial da crise vivida pelo país atualmente.

Ele explica que as previsões de variação negativa não existiam até dezembro de 2014 e só surgiram com o agravamento das relações entre o Executivo federal e o Congresso. “Chegamos ao final de 2014 com pleno emprego. A renda também era estável. Se a década será ou não perdida, vai depender diretamente da situação política”, analisa.

Endividamento em dólar tira capacidade de reação da economia

As mudanças no cenário econômico internacional também ajudam a aprofundar a crise brasileira. Com a disparada do dólar, que chegou a atingir cotação de R$ 4,20 na última semana, parte da dívida de governos e das empresas também aumenta. Apenas em Minas, a dívida indexada ao câmbio saltou de R$ 15,94 bilhões para R$ 21,6 bilhões entre dezembro de 2014 e agosto de 2015. Um crescimento de 35,47%, segundo dados da Secretaria de Estado da Fazenda.

“Existe, também, um endividamento elevadíssimo das empresas. As consequências acabam sendo demissões em um quadro que já é extremamente recessivo”, explica a professora de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV/IBS), Virene Roxo Matesco. No entanto, ela ressalta que o país já passou por momentos muito mais difíceis no passado e conseguiu se recuperar. “No início da década de 1980, o PIB chegou a cair 4,35%, resultado bem mais expressivo do que o 1% projetado para 2016”, explica.

Com o anúncio de cortes de oito ministérios, 30 secretarias, três mil cargos comissionados e a redução de 10% dos salários dos ministros anunciados pela presidente Dilma Rousseff nesta semana, a expectativa dos especialistas é que o mercado comece a reagir positivamente às iniciativas do governo.

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