O bolso do brasileiro vem sofrendo sucessivos choques desde o início do ano. Depois da luz, gasolina, remédio e transporte público, é a vez da água, que a partir de maio ficará 15,04% mais cara. O aumento da conta da Copasa é mais um golpe para o consumidor, que vê a renda perder para a corrida dos reajustes sem fim.
“Se fosse um ou outro reajuste isolado, não faria tanta diferença. Porém, eles estão por toda a parte. E o salário já não está sendo suficiente para arcar com todas as despesas. Tanto é que estamos assistindo a um fenômeno de retirada de dinheiro das cadernetas de poupança”, diz o vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel José Ribeiro de Oliveira.
Para ele, com a restrição de crédito, a tendência é a de que o investimento mais popular do Brasil sofra novas baixas.
“Muitas famílias estão endividadas e o resgate da caderneta pode estar relacionado à necessidade de honrar compromissos financeiros. São vários aumentos de preços frente a uma renda que não cresce no mesmo ritmo”, diz.
Economia estagnada, juros nas alturas e corte de vagas no mercado de trabalho reforçam o gosto amargo para as famílias.
Desemprego
A taxa de desemprego medida pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua ficou em 7,4% no trimestre encerrado em fevereiro, alta de 13% em relação ao período entre setembro e novembro de 2014, quando estava em 6,5%, segundo o IBGE.
São 7,4 milhões de pessoas à procura de trabalho, 950 mil a mais que o contingente de desocupados no trimestre anterior.
“O salário do brasileiro não acompanha o aumento da inflação”, diz o professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP de Ribeirão Preto Fabiano Guasti Lima, que também é pesquisador e consultor do Instituto Assaf, entidade que desenvolve análises econômicas.
“Em 2014, só em impostos, o brasileiro pagou R$ 26 por dia, o que dá mais de R$ 9.300 por ano, por cidadão. O pior é que essa conta já ficou ainda mais cara neste ano, uma vez que o governo já promoveu uma série de reajustes em tributos e ressuscitou outros”, afirma Lima, referindo-se ao fim de medidas de desoneração fiscal.
Sem refresco
E não há sinais de alívio para o bolso no curto horizonte. Segundo a coordenadora de pesquisas da Fundação Ipead, Thaize Martins, a inflação de março em Belo Horizonte, que bateu em 1,25%, já foi a maior para o mês desde 2003. “E tudo indica que abril seguirá o mesmo caminho”, diz.
A situação é ainda mais difícil para a população de baixa renda. Levantamento do Dieese mostra que a cesta básica ficou 8,59% mais salgada de janeiro a março deste ano. No mês passado, o preço chegou a R$ 343,22.
Segundo a entidade, o salário mínimo necessário para a manutenção de uma família de quatro pessoas deveria equivaler a R$ 3.186, ou seja, quatro vezes mais do que o valor atual de R$ 788.
É essa a camada da população que também sente com mais força o impacto da alta da conta de luz. De janeiro para cá, o custo da energia elétrica subiu 49% nas residências e 73% para as indústrias, na comparação com o ano passado, segundo levantamento realizado pela TR Soluções, desenvolvedora de sistemas para o setor elétrico.
De carro ou de ônibus, andar pela cidade também ficou mais caro. O reajuste das passagens foi de 8,5%. Já o preço da gasolina subiu, em média, 12% nos postos da capital, segundo pesquisa da Agência Nacional do Petróleo (ANP) desde janeiro.
Conta de água chega mais cara a partir de junho
O reajuste de 15,04% na tarifa de água, a partir de 13 de maio, é mais do que o dobro do praticado em 2014, quando a alta foi de 7,07%. A variação também supera o índice oficial de inflação dos últimos 12 meses, que foi de 8,13%.
A energia levou a culpa pela alta, anunciada ontem pela Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais (Arsae-MG) .
Segundo Antonio Caram Filho, diretor-geral da Arsae, os custos com energia responderam por 5,58 pontos percentuais da taxa total autorizada. “Adotamos a mesma metodologia de cálculo desde 2011, tanto para a Copasa quanto para as outras concessionárias”, disse. Itens como gasto com pessoal, despesa de depreciação e manutenção da rede também pesaram na definição do índice.
Como a nova tarifa começa a ser aplicada em 13 de maio, a alta só será sentida a partir de junho, com a chegada dos primeiros boletos aos usuários de 630 municípios mineiros atendidos pela companhia.
Para usuários residenciais com consumo de 10 mil litros de água por mês e serviço de coleta de esgoto, por exemplo, o aumento na fatura será de R$5,20. O valor da conta passará de R$34,67 para R$39,87.
No entanto, consumidores precavidos já se anteciparam para a nova despesa. A consultora Cristina Lemos, por exemplo, reuniu a família para propor mudanças na rotina de casa. “Estamos realmente apertados e, agora, um vigia o outro. As luzes têm que ficar desligadas e o banho certamente será mais curto”, relata.
* Com informações de Raquem Ramos - Hoje em Dia