Decisões da Justiça beneficiam quem comprou imóvel mas viu obras serem paralisadas

Evaldo Magalhães
efonseca@hojeemdia.com.br
16/03/2018 às 21:34.
Atualizado em 03/11/2021 às 01:54
 (EUGÊNIO MORAES/ARQUIVO HOJE EM DIA)

(EUGÊNIO MORAES/ARQUIVO HOJE EM DIA)

Duas importantes decisões da Justiça mineira nos primeiros meses do ano beneficiaram milhares de consumidores de Belo Horizonte que se sentiram lesados por construtoras, alimentando a esperança de que possam ter seus alegados prejuízos de alguma forma reparados. 

A mais relevante foi a derrubada, pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), em 28 de fevereiro, da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), movida pela prefeitura da capital, referente à Lei 11.002, aprovada pela Câmara Municipal em 2016. A estimativa de advogados ouvidos pelo Hoje em Dia é de que mais de 4 mil famílias da cidade possam ser favorecidas com a sentença, embora a Procuradoria-Geral do Município informe que “está analisando a possibilidade e o cabimento de recurso”.

A Lei 11.002, de autoria do ex-vereador Sérgio Fernando (PV), estabeleceu que compradores de imóveis de construtoras que abandonaram projetos habitacionais – em virtude de paralisação injustificada da obra, da existência da declaração de falência ou de recuperação judicial –, não mais precisariam pagar taxas e multas altíssimas, em razão de mudanças na Lei de Uso e Ocupação do Solo (Luos), para renovar as licenças e retomar os empreendimentos por conta própria. 
“Preocupada com a questão arrecadatória, a PBH, na atual gestão, entrou com essa Adin para invalidar a lei. Primeiro, pediu liminar, que foi negada, o que ocorreu também com a ação principal, considerada improcedente”, diz o advogado Tiago Soares Cunha, da Viana e Cunha Advocacia e Consultoria Imobiliária, que representa clientes de cinco empreendimentos abandonados em Belo Horizonte. 

“Esperamos que, agora, a prefeitura cumpra integralmente a lei existente, sem colocar obstáculos aos pedidos de renovação nos casos mencionados, livrando os consumidores, já lesados pelas construtoras, de pagamentos que consideramos injustos”, acrescenta.

Outorga
No caso do condomínio Villa Umbria, com duas torres e 76 apartamentos, no bairro Ouro Preto, na região da Pampulha, Cunha diz que, alegando problemas financeiros, a construtora Habitare abandonou a obra em 2014 – antes da entrada em vigor da Lei 11.002 –, com 28% do projeto já executado. 
Para retomar a construção por conta própria, compradores (pessoas físicas) das unidades, cerca de 60 famílias, criaram uma associação e requisitaram a renovação do alvará na prefeitura. 

Foram surpreendidos com a obrigatoriedade de pagamento da chamada “outorga onerosa”, no valor de quase R$ 800 mil. O motivo foi a alteração da Luos da capital em 2010 – posteriormente à obtenção da primeira licença –, o que reduziu o coeficiente de aproveitamento dos terrenos. 

“Parcelamos a conta em 183 parcelas de quase R$ 7 mil, mas, após a entrada em vigor da nova lei, fizemos uma solicitação à PBH e conseguimos suspender o pagamento, interrompido na terceira parcela, e agora tentamos a revalidação da licença”, informa o advogado. 

O engenheiro Conrado Teixeira Moreira, integrante da Associação dos Compradores do Empreendimento Villa Umbria (Acevilla), espera que a PBH não entre com recurso contra a derrubada da Adin. 

“Até 2012, pagamos R$ 13 milhões à construtora e, hoje, faltam R$ 21 milhões para concluir tudo”, diz. 

“Temos um custo mensal de condomínio, para manter o empreendimento, inclusive com zeladores e seguranças, e buscamos recursos para terminar nossos apartamentos. Não seria justo, depois de tudo que sofremos, arcar com mais custos”, diz. 

Embora o julgamento da Adin tenha sido no final de fevereiro, o acórdão só foi publicado na última sexta-feira. Os 23 desembargadores do Órgão Especial do TJMG acompanharam o voto do relator, Luiz Arthur Hilário, para o qual a alegação da PBH de que a Câmara teria legislado sobre matéria exclusiva do Executivo é improcedente. 

Cautelares impostas a empresários podem abrir precedentes no país


Outra decisão judicial que mexeu com o mercado imobiliário da capital, e que pode ter repercussões em todo o país, segundo o advogado Kênio Pereira, especialista no assunto, foi a aplicação, em janeiro, de medidas cautelares contra quatro empresários do ramo: Jânio Valeriano Alves; Juarez Viana Dolabela Marques; Jackson Cançado Ribeiro e Fernando Soares Magalhães Viana. 

Conforme determinação da 4ª Câmara Criminal do TJMG, eles teriam que comparecer em juízo quando convocados, estariam proibidos de se ausentar da Região Metropolitana de Belo Horizonte e deveriam entregar os passaportes. Os empresários são investigados por não entregar 443 imóveis a compradores de um empreendimento chamado Site Savassi, na Região Centro-Sul da cidade. 

Inacabado, segundo investigações da Delegacia de Defesa do Consumidor de Belo Horizonte e do Ministério Público, o empreendimento, que será um hotel, deveria ter sido entregue cinco meses antes da Copa do Mundo de 2014, mas até hoje estaria sem possibilidade de ocupação, gerando prejuízo financeiro estimado em R$ 245 milhões. 

A promotora que cuida do caso, Thais de Oliveira Leite, autora do pedido de cautelares, disse que aguarda a conclusão de inquérito na Polícia Civil para oferecer denúncia contra os investigados. 

Para o advogado Kênio Pereira, o caso é apenas um de muitos semelhantes: hotéis e apart-hotéis planejados para a Copa, comprados por dezenas de consumidores e que não foram entregues pelas construtoras no prazo.

“A decisão de aplicação dessas cautelares é inédita e pode se tornar um marco no poder Judiciário, pois há centenas de casos, em Minas e em todo o país, de construtores e incorporadores que recebem os valores dos adquirentes de apartamentos na planta, bem como fazem empréstimos nos bancos, e desviam os recursos”, afirmou.

Procuradas, a Maio Empreendimentos, a Paranasa Engenharia e Comércio S/A e a MRP Participações, que têm os investigados como sócios, divulgaram nota informando que todos os recursos recebidos dos compradores das unidades foram “integralmente aplicados no empreendimento, na aquisição do terreno e execução da obra até o estágio em que se encontra hoje” e que “a esses recursos somaram-se outros adicionais aportados pela incorporadora”. 

A nota também sustenta que o MP acolheu pedido de providência “de apenas um casal adquirente de duas unidades”, sem que tenha havido a apresentação de “quaisquer provas quanto às acusações formuladas”. 

“No curso do processo, quando então haverá julgamento do mérito, após a apreciação das provas apresentadas e ouvidos os empresários do empreendimento, os fatos serão devidamente esclarecidos”, informa o documento.

  

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