Diretor esclarece como o documentário vira ficção em 'Dior e Eu'

Estadão Conteúdo
27/08/2015 às 10:15.
Atualizado em 17/11/2021 às 01:31
 (Divulgação)

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Para começar a falar sobre Dior e Eu talvez seja útil reportar-se aos documentários anteriores de Frédéric Tcheng sobre moda, e a seus títulos. Valentino - The Last Emperor e Diane Vreeland - The Eyes Has to Travel.

Como ditadora da moda nos EUA, Diana tinha um olhar acurado e a proposta de Tcheng é fazer com que os olhos do público viajem no olhar da famosa colunista e editora. No caso de Valentino, há uma reverência. Ele foi o imperador da moda, mas não terá sido também, e antes dele, Christian Dior?

O título do filme pega carona no título da própria biografia de Dior, que enlaça o público e o privado e mostra como o homem, transformado em mito, forçava o primeiro a acomodar-se/ajustar-se às dimensões épicas do segundo.

Dior, lembra Tcheng, viveu uma existência relativamente curta, apenas 52 anos, entre 1905 e 57. Ele queria ser artista plástico. Seu pai, comerciante de fertilizantes, queria que o filho estudasse para ser diplomata. Em Paris, seus desenhos o incentivaram a produzir moda. Associado a um empresário, fundou, em 1947, a Maison Dior.

Na França - no mundo -, que se reconstruía após a destruição da guerra, o New Look de Dior instituiu uma mistura de beleza e extravagância. Muito tecido, e o consequente desenvolvimento da indústria têxtil francesa. Exatamente 55 anos depois da morte de Christian Dior, Raf Simons foi contratado pela maison para criar a coleção de 2012.

"O que mais me impressionou foi constatar o grau de profissionalização da equipe que assessorou Raf. Todos cerraram fileiras, dedicados e competentes. Raf também me surpreendeu. Não imaginava que ele fosse tão tímido e controlado nem que conseguisse manter a calma para enfrentar as dificuldades que surgiram durante o processo", relata o diretor.

E, para Tcheng, qual foi a maior contribuição de Simons? "Como o próprio Christian Dior, ele tem a natureza de um artista plástico, de um grande pintor. Trabalha a cor, mas também a linha.

A arte de um grande designer de moda consiste em fazer a linha sonhar", ele define. Além dos próprios documentários, Tcheng estreia - na verdade estreou, em abril do ano passado, no Tribeca Festival de Robert De Niro - seu filme na trilha aberta por diversas ficções que também focaram figuras míticas da moda.

Duas ficções sobre Coco Chanel (Coco Antes de Chanel, de Anne Fontaine, com Audrey Tautou, e Coco Chanel & Igor Stravinski, de Jan Kounen, com Anna Mouglalis) e duas sobre Yves Saint Laurent (a de Jalil Lespert com Pierre Niney e a de Bertrand Bonello com Gaspard Ulliel), mais o documentário O Louco Amor de Yves Saint-Laurent, de Pierre Thoreton, sobre a ligação do estilista com Pierre Bergé.

Embora a versão de Lespert tenha levado a melhor no César, o Oscar francês, inclusive valendo a Niney o prêmio de ator, Tcheng concorda com o repórter - a versão de Bonello é superior, e até o ator dá de dez, Ulliel.

"Admiro muito Bonello, que possuiu um verdadeiro temperamento de cineasta, e de autor. Ele pegou uma fase mais criativa da vida de Yves, tem soluções visuais mais ousadas. O filme dele é uma verdadeira ficção sobre a moda de um artista", avalia. Todos esses filmes estrearam nos cinemas brasileiros e estão disponíveis no mercado de home entertainment.

Tcheng poderia ficar horas falando sobre todos esses filmes, mas é bom retornar a seu Raf Simons - que, como bom francês, carregando na pronúncia, ele chama de Símôns.

"Conviver com ele durante dois meses me revelou não apenas o magnífico artista que é, mas também o ser humano." Tcheng admite que se preparou muito, pesquisando sobre a persona de Simons. Apesar da calma aparente, deu-se conta da tremenda pressão que ele estava sofrendo.

"Não é que eu esperasse isso, pensando que seria bom para o filme, mas tornou-se evidente que ele estava chegando a seu limite. Sabia que ele iria ter um colapso. Ninguém com sensibilidade consegue resistir a tanto estresse. Comecei a me preparar, e a preparar a equipe para esse momento."

E ele veio. Num momento, Simons colapsa. Chora. "Foi muito, muito forte. Eu estava atento a suas mínimas reações e percebi que seria naquele momento. Tirei o olho do visor e o encarei. Foram apenas alguns segundos, quatro ou cinco, e ele desabou chorando. Nem que eu tivesse planejado a cena, e ele fosse o melhor ator do mundo, o efeito seria tão fulminante. Simons, o artista, se humanizou e vulnerabilizou completamente diante da minha câmera. Mas não quis ser invasivo. Ele se afasta e eu continuo filmando a distância, para que tenha seu momento de solidão."

Em seu tempo, Christian Dior vestiu algumas das mulheres mais ricas (e célebres) do mundo. O fascínio da marca não diminuiu com o tempo. Celebridades como Jennifer Lawrence, Marion Cotillard - uma aficionada da maison - e Sharon Stone adentraram o universo de Raf Simons chez Dior.

"Mas não fui eu que as filmei. Para isso, havia as câmeras dos fotógrafos e cinegrafistas." Um grande documentário? "Confesso que hesito um pouco em assimilar a definição. Sei que é um documentário, porque não inventei nada, mas ao mesmo tempo é uma ficção porque tem a arte, o suspense da coleção, da acolhida. Não sou nenhum (Alfred) Hitchcock, mas, para mim, o filme tem suspense até para satisfazer o mestre." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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