Fora do top 10 dos destinos turísticos, Brasil ignora investimentos no setor

Patrícia Scofield - Hoje em Dia
19/12/2014 às 07:44.
Atualizado em 18/11/2021 às 05:26
 (FLAVIO TAVARES)

(FLAVIO TAVARES)

Relatório inédito do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a colocação do Brasil no cenário do turismo mundial, o “FiscTurismo”, mostra que o país ainda é um fracasso nesse segmento. Além de o país não aparecer na lista dos destinos mais visitados do planeta, no ano passado, o Ministério do Turismo investiu apenas 7% do orçamento em ações nessa área.

O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) Turismo aplicou 0,48% do valor empenhado em 2013. Em 2014, até julho, foram liquidados apenas 5%. O empenho é o valor que o órgão público reserva para efetuar um pagamento planejado, o que pode ocorrer após a assinatura de um contrato de prestação de serviço, por exemplo. Quando o serviço é executado, o valor é liquidado. Só quando o prestador de serviço receber o montante correspondente à empreitada concluída, este é considerado o valor pago.

 

Balança comercial

Além disso, a balança comercial brasileira de 2013 teve saldo negativo de cerca de US$ 19 bilhões - os brasileiros que foram para o exterior gastaram mais do que o dinheiro deixado no país por estrangeiros (veja infografia).

“Verifica-se que o Brasil tem enorme potencial turístico a ser explorado. É preciso que as políticas públicas priorizem mais o setor, e que os responsáveis pelas ações de apoio ao turismo otimizem a gestão dos recursos públicos. Alguns problemas ainda persistem na execução das ações de apoio a projetos de infraestrutura turística”, informa o TCU no relatório. 

Em relação às obras de infraestrutura, o TCU fez um recorte de pesquisa dos contratos firmados entre 2010 a 2014, ano da Copa do Mundo no Brasil, e constatou que o total de empreendimentos concluídos para incentivo do turismo foi de 22%. Entre essas obras estão a implantação ou reforma dos Centros de Atendimento ao Turista (CAT), a sinalização turística e acessibilidade, previstas na Matriz de Responsabilidade da Copa e incluídos no PAC Turismo.

Em Belo Horizonte, a prefeitura publicou o edital para reforma dos CATs do Mercado das Flores, no Centro, e da Orla da Lagoa da Pampulha apenas em setembro deste ano. Bem depois do Mundial. Aberta em abril deste ano, a licitação para reforma do CAT do Mercado das Flores foi interrompida por falta de interessados no projeto. As informações foram confirmadas pela Belotur. 

 

BHC&VB

Mas para o presidente da Belo Horizonte Convention & Visitors Bureau (BHC&VB), Antônio Claret Nametala, o Mundial em BH “funcionou bem e não teve ninguém reclamando. Tivemos um boom por causa do Mundial”. A BHC&VB é uma entidade sem fins lucrativos criada para divulgar a capital mineira fora do Estado, parceira da PBH.

Para Nametala, uma das formas de incrementar o setor no Brasil é investir em um programa efetivo e reduzir a tributação sobre produtos turísticos, procurados principalmente por estrangeiros. “Estamos no caminho, mas a tributação ainda é uma dificuldade. Os souvenirs têm preços altos em função das taxas cobradas pelo governo”.  

 

Custo-benefício impõe roteiros internacionais a turista mineira

A falta de infraestrutura no turismo brasileiro, apontada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), é atestada por viajantes. Para a administradora de empresas Maria Elisa Borges, de 33 anos, o Brasil deveria ter malhas ferroviária e rodoviária “mais atraentes para o turismo”.

“Sinto falta de viajar de trem e poder admirar a paisagem, como fazemos fora do Brasil. Seria uma vista maravilhosa no Sul do país, por exemplo. As viagens de ônibus são longas e nos aeroportos, às vezes ficamos horas sem informações precisas”, avalia.

Desde 2009, a mineira Maria Elisa faz apenas roteiros internacionais, pelo menos duas vezes por ano, por acreditar que eles têm um melhor custo-benefício do que as viagens nacionais. Dos dez países mais visitados no mundo (veja infografia), a empresária só não conhece Rússia e Tailândia.

“Não gosto de ir para a praia, então isso já reduz muito minhas possibilidades de destino no Brasil. Costumo fechar hotel e passeios sozinha, pela internet, para eliminar as taxas cobradas pelas operadoras de turismo”, diz. “Mesmo com a alta do dólar, viajar para o Sul ou Nordeste do país ainda sai mais caro do que ir a Buenos Aires, por exemplo. As passagens de avião são caríssimas”.

 

Boas práticas de gestão

Apesar de listar falhas, a equipe de fiscalização do TCU identificou ações do Ministério do Turismo que podem ser consideradas “boas práticas de gestão”, em outras palavras, seriam “modelo para os órgãos da administração pública”.

A principal é o Sistema de Acompanhamento de Contratos de Repasse (Siacor). Trata-se de uma ferramenta que permite que a população tenha acesso às informações sobre os contratos vigentes, cancelados e concluídos.  

Ceará foi o Estado com mais investimentos em 2013, enquanto a região Norte ficou à mingua

O Brasil tem nada menos que 50 países em sua frente no ranking das 140 nações mais competitivas no setor de turismo, revela o levantamento feito pelo Tribunal de Contas da União. Para chegar a esta conclusão, a entidade World Travel & Tourism Council (WTTC), citada pelo Tribunal, avaliou algumas classificações.

O país é o 60º em infraestrutura turística; o 129º em transporte terrestre; e o 126º em competitividade de preços, apesar de ser considerado o 1º em recursos naturais e o 23º em recursos culturais.

“O Brasil precisa trilhar um caminho para se tornar mais competitivo no cenário turístico internacional e atrair mais turistas, a fim de aumentar o fluxo de divisas e gerar mais empregos no trade turístico”, acrescenta o TCU no documento. 

Entre os estados brasileiros pesquisados, o Ceará se sobressai como a localidade que recebeu mais investimentos em 2013. A região menos favorecida é a Norte. O relatório não informa quanto foi aplicado em cada um dos estados, nem mesmo a posição de Minas Gerais em relação às demais unidades federativas.

 

Plano nacional

No plano nacional, os principais trabalhos desempenhados pelo Ministério do Turismo foram o programa “Bem Receber Copa” e o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) Turismo, ambos voltados para a capacitação de quem pretende se profissionalizar.

Procurado pela reportagem, a assessoria de imprensa da Pasta informou que a resposta do Ministério do Turismo está publicada junto ao relatório do TCU. Ao Tribunal, informou-se haver “plena concordância” com o relatório. O ministério destacou que vai considerar o levantamento para planejar suas metas e indicadores futuros.

Quanto aos problemas identificados, o Ministério do Turismo informou estar elaborando o Manual de Instruções para Contratação e Execução dos Contratos de Repasse. “Esse manual busca soluções que promovam uma maior rapidez na execução dos projetos de apoio à infraestrutura turística, principalmente no que tange à fase inicial de execução dos contratos de repasse, de forma a garantir uma maior efetividade, eficácia e eficiência”, afirma o texto.

O ministério ressalta inclusive que utiliza o Programa Temático Turismo do PPA 2012–2015 como orientador de seus trabalhos e parâmetro para medir a efetividade dos mesmos. O TCU, porém, argumenta não haver “correlação direta entre as metas definidas com os indicadores previstos, o que dificulta a avaliação do cumprimento dos objetivos estabelecidos”.  

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