Nova aposentadoria beneficia trabalhador, mas pode estrangular governo

Tatiana Moraes - Hoje em Dia
15/05/2015 às 06:14.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:02
 (Zeca Ribeiro)

(Zeca Ribeiro)

Uma emenda à Medida Provisória (MP) 664, aprovada quarta-feira na Câmara dos Deputados, pode mudar a vida do trabalhador brasileiro. Chamada de Fórmula 85/95, a emenda muda os cálculos da previdência e permite que pessoas que contribuíram por mais tempo com o INSS possam deixar o trabalho mais cedo, sem redução na renda. Quem está prestes a se aposentar torce pela aprovação da fórmula, que segue para avaliação do Senado.

Se for aprovada no Congresso, a presidente Dilma Rousseff já sinalizou que deve vetar a medida, que, nesse caso, volta à Câmara. Embora seja boa para o trabalhador, a antecipação do benefício, com o pagamento do teto, corrói os cofres públicos.

A Fórmula 85/95 é uma alternativa ao fator previdenciário, que reduz a renda da aposentadoria para quem ainda não possui idade (60 para mulheres e 65 para homens) ou tempo de contribuição (30 anos, mulheres; e 35, homens) mínimos exigidos. Se a fórmula for aprovada, valerá a partir de 2016. No caso das mulheres, a soma da idade com do tempo de contribuição precisa atingir 85, permitindo, assim, se aposentarem com o teto (R$ 4.663,75). Para os homens, a soma deve perfazer 95.

Na marca

Proprietário de uma oficina mecânica no Vista Alegre, região Oeste da cidade, Natércio Corrêa Goulart Santana tem 59 anos de idade e contribui para a previdência há 36 anos. A soma dá 95, o mínimo necessário para que ele possa se aposentar pela fórmula 85/95.

No entanto, se Santana optar por se aposentar hoje, com base no atual cálculo previdenciário, ele receberá aproximadamente 84% da renda. Por isso, o empresário continua trabalhando. “Comecei a trabalhar muito cedo, mas naquela época não tinha carteira assinada. Se eu pudesse parar agora seria muito melhor”, afirma.

Com 60 anos, a psicóloga Maria Aydee de Moraes Miranda acabou de se aposentar. Ela contribuiu por 30 anos com a previdência e, por isso, deixou o mercado de trabalho recebendo o teto. Porém, se a medida já vigorasse, a psicóloga já poderia ter se aposentado há mais tempo, visto que a soma da idade com o tempo de contribuição resultaram em 90, cinco a mais do que o necessário. “Acho justo que as pessoas que trabalham e contribuem desde cedo possam se aposentar antes. Mas também sei que os cofres públicos podem não comportar. É uma situação delicada”, pondera.

O conselheiro do Conselho Regional de Contabilidade de Minas Gerais (CRC-MG) Antônio Baião de Amorim acredita que a Fórmula 85/95 seja uma boa alternativa para fugir do fator previdenciário. “A medida beneficiará milhares de pessoas, que receberão o teto. O trabalhador merece esse retorno”, diz.

Os deputados aprovaram, nesta quinta-feira (14), o relatório do deputado Carlos Zarattini (PT-SP) para a MP 664/14, que muda as regras para o direito à pensão por morte, limitando o seu recebimento pelo cônjuge ou companheiro segundo a expectativa de vida


 

Renan sinaliza que Senado deve impor nova derrota ao governo

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), sinalizou ontem que os senadores devem impor nova derrota ao governo mantendo a emenda que altera o fator previdenciário. Renan disse que o Senado “não vai recusar a troca” do mecanismo que retarda as aposentadorias para os trabalhadores.

“O Senado já decidiu há anos sobre o fator previdenciário. É óbvio que, tendo uma nova oportunidade, (o Senado) não vai recusar a troca dessa regra que delonga as aposentadorias”, afirmou.

Questionado se o Senado vai manter a nova fórmula de cálculo das aposentadorias aprovada pela Câmara, Renan disse que o modelo ainda será definido pelos parlamentares.

“Eu não vi ainda a fórmula, mas como o Senado já resolveu acabar com o fator previdenciário, é óbvio que vai aproveitar essa oportunidade para colocar no lugar do fator previdenciário uma regra que seja mais favorável aos trabalhadores e aposentados” ponderou Renan.

Pelos cálculos do governo, se os trabalhadores passarem a não optar pelo fator na hora de se aposentar a partir deste ano, os gastos da Previdência com aposentadoria vão aumentar em R$ 40 bilhões em dez anos; e R$ 300 bilhões nos próximos 20.

Renan vem fazendo sucessivas defesas de medidas favoráveis aos trabalhadores desde que o governo editou as duas medidas provisórias do ajuste fiscal. Os deputados aprovaram ambas, mas no caso do fator previdenciário, impuseram uma derrota ao Planalto com o apoio de deputados do PT e PMDB. As MPs começam a ser analisadas pelo Senado na semana que vem.

Temer

O vice-presidente Michel Temer minimizou ontem as derrotas sofridas pelo governo durante a votação das emendas à Medida Provisória (MP) 664 na Câmara dos Deputados.

A emenda foi incluída no texto à revelia do governo, que queria discutir as mudanças na Previdência em um fórum com a participação de centrais sindicais, empresários e parlamentares. Segundo Temer, a mudança aprovada pelos deputados não elimina o fator previdenciário e, apesar da emenda, o assunto continuará a ser debatido no grupo criado pelo Executivo.

“A comissão certa seguramente será instalada e trabalhará porque há bastante tempo o governo pensa em modificar o fator.”

Novo round no embate entre o Planalto e o Congresso


Sancionada em 1999, a Lei 9.876, que instituiu o fator previdenciário, tinha por objetivo inibir as aposentadorias precoces. Segundo seus idealizadores, a equação idade ou tempo de contribuição, com a expectativa de sobrevida no momento de se aposentar, seria uma alternativa de controle de gastos da Previdência Social.

Na prática, porém, não foi isso que aconteceu. O fator previdenciário tornou-se um perverso mecanismo que reduz entre 35% e 40% os benefícios previdenciários no momento da aposentadoria do trabalhador ou trabalhadora pelo Regime Geral de Previdência Social, a cargo do INSS.

Para corrigir essa injustiça, sobretudo para aqueles assalariados que começaram a trabalhar mais cedo, o senador Paulo Paim (PT-RS) apresentou e aprovou no Senado, em 2008, o projeto de lei 296/03, que extingue o fator previdenciário.

Na Câmara, a proposta começou a tramitar em 17 de abril de 2008, como Projeto de Lei 3.299, sendo que a “fórmula 85/95” já estava prevista em duas propostas de emenda. Curiosamente, uma mais antiga era de autoria do então deputado Pepe Vargas (PT-RS), hoje ministro da Secretaria de Direitos Humanos. Essa proposta foi debatida entre parlamentares, governo e centrais sindicais com objetivo de se construir um acordo na época, mas a negociação foi interrompida.

Em 2012, a discussão sobre o fator previdenciário entrou na pauta da Comissão de Negociação de Desenvolvimento Econômico e Social e lá foi elaborada uma outra redação de emenda. Em linhas gerais, manteve a proposta de Pepe Vargas, com alterações pontuais, como a exigência de o empregador arcar com as contribuições previdenciárias até a aposentadoria, caso demitisse um trabalhador que estivesse a 12 meses de se aposentar.

Mas como sempre mostrou-se contrário ao fim do fator previdenciário, o governo fez de tudo para inviabilizar o projeto. Acenou com várias promessas. Tudo em vão até ser surpreendido na quarta-feira com a aprovação da emenda do deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP). Um novo round nessa disputa entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional.

Líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE) avalia que “não é o caso” de se falar sobre um possível veto de Dilma à emenda que muda o fator previdenciário
 

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