Transparência sobre pagamento de impostos deve impactar nas relações de consumo

Milson Veloso - Do Portal HD
27/11/2012 às 13:47.
Atualizado em 21/11/2021 às 18:41
 (Milson Veloso)

(Milson Veloso)

A dona de casa Regiane Maria Nunes tem 25 anos e mora em Ibirité, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Na família, que inclui as duas filhas e o marido - trabalhador da construção civil - a renda mensal é de aproximadamente R$ 1 mil, sendo mais de R$ 300 gastos só com alimentação. Até às 12h30 desta terça-feira (27), Regiane e os outros cerca de 194 milhões de brasileiros pagaram R$ 1,358 trilhão em impostos. Ela não sabia disso, assim como a informação de que cerca de 27% do valor aplicado nos alimentos é referente à carga tributária. Porém, isso pode mudar ainda em 2012.

Um projeto de lei em análise na Casa Civil, aprovado pela Câmara dos Deputados em 13 de novembro e que deve ser sancionado ou vetado pela presidente Dilma Rousseff até o dia 11 de dezembro, garante que os consumidores tenham acesso aos dados sobre quanto do valor gasto nas compras é referente a impostos.

"Quando a gente souber disso, vai até poder reclamar do governo e pedir mais dinheiro para a educação e a saúde", diz a dona de casa.

Assim, como ela, o advogado presidente da Comissão de Direito Tributário da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais (OAB/MG), Renato Magalhães, acredita em uma conscientização social com a mudança. "A equação é uma só: nós temos um sistema tributário complexo e perverso, que não é de conhecimento da população. Para mudar isso, é preciso que haja um amplo movimento da sociedade. Contudo, esse apoio só vai existir quando as pessoas entenderem o que pagam em cada produto.", explica.

Para o tributarista, o governo tem apresentado uma preocupação grande em reduzir os juros nos últimos anos, a exemplo do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), e a decisão de divulgar essas informações para as pessoas poderá ter um impacto positivo nas políticas públicas. "No momento em que os administradores precisarem aumentar a carga tributária, isso ficará mais explícito a todos", complementa.

Apenas informação não muda nada

Os especialistas ouvidos pelo Portal HD apontam que a medida é um avanço, mas ainda não terá um impacto econômico no dia a dia dos brasileiros. A transparência em relação aos gastos com impostos já é realidade em outros países, como nos Estados Unidos, onde cada cliente tem acesso ao valor embutido no produto, informa o economista e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV/IBS), Mauro Rochlin.

"O dado dará uma certa consciência sobre quanto está pagando de imposto, mas o preço continuará o mesmo", diz. Mauro acredita que possa haver uma postura política diferente em relação às ações do governo por parte da população. Porém, essas mudanças não são rápidas. "Isso também poderia modificar os hábitos de consumo, mas seria algo a longo prazo e bem lento", esclarece, acrescentando que "o cliente via olhar sempre o preço final e não somente a carga tributária".

O ponto positivo, conforme o especialista, se refere à possibilidade de a população comparar as taxas incidentes em várias partes do país. "As pessoas poderão perceber que há diferença de um estado para o outro", complementa.


Proposta similar em Minas


Por aqui, um proposta em tramitação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), também estipula alterações na divulgação dos dados. O Projeto de Lei apresentado pelo deputado Wilson Batista (PSL), em 2011, dispõe sobre o esclarecimento dos consumidores em relação aos tributos incidentes nas mercadorias e serviços, por meio do detalhamento das taxas recolhidas nas notas fiscais em âmbito estadual.

A iniciativa foi avaliada em primeiro turno pelo plenário da casa, mas ainda não há uma definição. A deputada Liza Prado (PSB), vice-presidente da Comissão de Defesa do Consumidor na ALMG, defende medidas como essa e afirma que o direito básico do cidadão é o direito à informação. "Isso faz parte da educação para o consumo responsável e facilita que o consumidor tenha uma consciência financeira maior sobre o que paga nas compras", pontua.

De acordo com a parlamentar, se o projeto que está sendo avaliado em nível federal não seja aprovado, Minas Gerais poderá ter a própria legislação a respeito do tema. "No âmbito estadual, a gente também prevê melhorar o texto. Os deputados poderão analisá-lo e complementá-lo com outras propostas em caso de aprovação", antecipa.

Apesar de hoje não haver uma explicação aos clientes a respeito da quantia destinada em cada aquisição aos impostos, Liza Prado acredita que o mundo está trabalhando para termos consumidores mais engajados e coletivos. Entretanto, ela complementa que muitas pessoas ainda não têm nem o hábito de pesquisar o tema. "Isso é preciso para sabermos o que podemos exigir de políticas públicas em retorno aos juros", justifica.

Na Câmara Municipal de Belo Horizonte, segundo a assessoria de imprensa, não há nenhuma medida nesse sentido.


Conheça o projeto

A proposta aprovada pela Câmara, elaborada em 2007 pelo senador Renan Calheiros (PMDB), teve origem em uma iniciativa popular com 1,56 milhão de assinaturas. De acordo com o texto, os comerciantes deverão colocar nas notas o valor dos tributos incidentes sobre os produtos e serviços vendidos.

Conforme o relator do projeto na Comissão de Finanças e Tributação, deputado Guilherme Campos (PSD-SP), a medida mudará a relação do consumidor com as taxas cobradas. "Está despertando, na população, o sentimento de pagador de imposto. Ele saberá que, em cada transação, por mais cotidiana que seja, está pagando imposto: na hora que vai ao supermercado, posto de gasolina, ao fazer sua refeição", acredita.


Você sabia?

A carga de tributos no Brasil aumentou para 33,56% do Produto Interno Bruto (PIB) no ano de 2010, de acordo com a Receita Federal. Isso representa um crescimento de 0,42% em relação ao ano anterior, quando foi registrada uma carga de 33,14%.

Ao se comparar com outros países, nós estamos no alto do ranking, ficando com a segunda maior carga tributária da América Latina, por exemplo. De acordo com um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil perde apenas para a Argentina. A instituição utiliza um método diferente da Receita Federal, mas mostrou que os tributos alcançaram 32,4% do PIB brasileiro em 2010, enquanto o do país vizinho foi de 33,5%.

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