Vazamentos na rede e desvios de água provocam rombo de R$ 8 bilhões anuais

Bruno Moreno - Hoje em Dia
26/03/2015 às 07:11.
Atualizado em 16/11/2021 às 23:23
 (Eugênio Moraes/Hoje em Dia)

(Eugênio Moraes/Hoje em Dia)

Em 2013, o investimento em água e esgoto feito no Brasil foi de R$ 10 bilhões. Ao mesmo tempo, o equivalente a 80% desse valor foi perdido nos sistemas de distribuição das companhias de abastecimento. Isso porque, em média, 39% de toda a água produzida no país não é faturada. Ou seja, sai pelos dutos das empresas, mas se perde ou é desviada, e o valor não é pago.

A conta é do Instituto Trata Brasil, com base nos dados de 2013 do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), órgão vinculado ao Ministério das Cidades.

O Trata Brasil é conhecido por realizar estudos nas áreas de abastecimento de água e saneamento básico, mas foi a primeira vez que fez o cálculo do prejuízo financeiro. A ideia, de acordo com o presidente do instituto, Édson Carlos, é pegar carona na crise hídrica que a região Sudeste enfrenta e sensibilizar os gestores a priorizar a manutenção e ampliação da rede, além da fiscalização para evitar as ligações clandestinas, a falta de hidrômetros ou demais erros de medição.

Realizado em parceria com a GO Associados, o estudo “Perdas de Água: Desafios ao Avanço do Saneamento Básico e à Escassez Hídrica” apontou também a situação nas cem principais cidades brasileiras, em todos os 26 estados e no Distrito Federal.

O primeiro município mineiro que aparece no ranking é Uberlândia, em 18º lugar, onde a perda de faturamento é de 26%. A capital mineira está em 39º, com perdas de 34%, atrás de Uberaba e Juiz de Fora. Dentre os estados, Minas Gerais se encontra em situação intermediária, com perda de faturamento de 31%, enquanto a média nacional é de 39%.

Para todos

Se esses R$ 8 bilhões não se perdessem anualmente, poderiam ser utilizados, por exemplo, para que o país conseguisse zerar o déficit do acesso ao saneamento e à água tratada.

De acordo com o Trata Brasil, o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab) estima que sejam necessários investimentos de R$ 304 bilhões para que isso seja possível.

“O ganho bruto com a redução de perdas ao longo de 20 anos, considerando aumento das receitas e redução dos custos de produção, pode chegar a R$ 53,47 bilhões. A título de comparação, esse valor corresponde a cerca de 18% do investimento estimado pelo Plansab até 2033 para alcançar a universalização da água e esgoto”, aponta.

Para Édson Carlos, o foco na perda financeira é um importante viés para o debate, mas não o único. “Tem um problema ambiental de um lado, com uma baixa oferta de água. E, do outro, uma perda financeira que ajuda a manter o saneamento atrasado. Se a gente conseguisse transformar essa perda em esgoto, conseguiria atender mais de 16 milhões de pessoas com coleta e tratamento de esgoto a cada ano. Os números são muito fortes, qualquer que seja o olhar que você tenha”, argumenta.

Na opinião do especialista, se esse volume d’água não fosse perdido, a crise seria amenizada, mas não resolvida. “É só partir do princípio de que um terço da água não precisaria ser tirada da natureza”.

A Copasa, que atende a maioria das cidades mineiras, foi procurada, mas não se manifestou até o fechamento desta edição.

Reduzir as perdas não é prioridade para as empresas

As perdas no faturamento das companhias de tratamento de água no Brasil não são recentes, e também não serão solucionadas de um dia para o outro. Mas, para o presidente do Instituto Trata Brasil, Édson Carlos, é curioso que elas não tentem reverter o quadro.

“Se todo mundo pagasse pela água ou reduzisse as perdas, melhoraria o caixa das empresas, que dependeriam menos do governo federal. Mas, estranhamente, elas não têm buscado essa redução de perda. Isso é inaceitável para qualquer empreendimento. A gente quer inverter essa tendência”, afirma.

Para Édson, a solução poderá chegar quando o tema for tratado como prioridade. “Não estamos dizendo que é fácil. Não estamos dizendo que é barato. A gente sabe que é complexo, mas não dá para continuar desse jeito. É preciso a ajuda dos prefeitos para facilitar o trabalho das empresas de água e esgoto. Tem que cobrar atendimento de metas mais ousadas, e o governo federal ajudar com mais recursos para poder captar e reduzir perdas”, argumenta.

Um índice de perda de faturamento que seria mais aceitável gira em torno dos 15%, que é encontrado em países desenvolvidos. No entanto, há cidades como Tóquio, no Japão, em que a meta é alcançar 0% de perda na rede de distribuição de água e, consequentemente, no faturamento.

O Trata Brasil trabalha com três cenários. Na melhor das hipóteses, o Brasil deverá chegar, em 2033, com 15% de perdas na rede de água. Na possibilidade intermediária, 20% e, na mais conservadora, 25%.

Principais desafios

A evolução da redução de perdas médias no período de cinco anos (2009-2013) foi de 3,30 pontos percentuais para perdas de faturamento e 3,68 pontos percentuais em relação à distribuição. Ou seja, as perdas têm caído menos de 1 ponto percentual ao ano. Isso mostra a preeminência de mais velocidade no ritmo da redução. As principais medidas sugeridas pelo Trata Brasil são:

* Criar contratos com incentivos e foco na redução de perdas;

* Direcionar maior financiamento para ações dessa natureza. Necessidade de aumentar o financiamento para programas de redução de perdas no âmbito federal. No PAC 2, de um total de R$ 45 bilhões para Água e Esgotos, foram incluídos inicialmente apenas R$ 2 bilhões para perdas;

* Implementação de planos de gestão de perdas baseados no conhecimento do sistema, indicadores de desempenho e metas preestabelecidas;

* Aumentar o índice de uso do hidrômetro de maior precisão. Em Pelotas (RS), por exemplo, não é utilizado hidrômetro e a cobrança é com base na área construída do imóvel. Por isso, a perda de faturamento é a menor do país. No entanto, a perda na distribuição é de 46%;

* Criar e monitorar programas de redução de perdas sociais com a participação dos atores envolvidos;

* Replicar experiências exitosas de operadores públicos e operadores privados nas regiões mais deficitárias, especialmente as regiões Norte e Nordeste, onde se situam os maiores desafios.




 

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