Elétricos: Falta energia para tamanha euforia

Marcelo Ramos
miramos@hojeemdia.com.br
23/11/2018 às 21:54.
Atualizado em 28/10/2021 às 02:10
 (Marcelo Ramos)

(Marcelo Ramos)

O Salão do Automóvel de São Paulo fechou as portas há uma semana, mas o principal assunto da mostra está longe de deixar de ser notícia. Anúncios de automóveis elétricos que chegam em 2019 têm gerado discussões acaloradas em rodas de cerveja, redes sociais e em cochichos com executivos, favoráveis ou contrários à tendência.

Um dos pilares para o início das vendas dos carros elétricos é o trecho do texto programa Rota 2030, que promete suavizar a cobrança do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) tanto dos elétricos quanto dos modelos híbridos. Pela regra atual, esses automóveis recolhem 25% de imposto. Com a aprovação do Rota 2030, que irá vigorar pelos próximos 11 anos, a alíquota aplicada variará de 7% a 20%, dependendo da eficiência.

Pilha fraca
Alguns especialistas acreditam que o “desconto” não é suficiente para estimular a compra desses carros, que têm forte impacto para reduzir os níveis de emissões de poluentes. Fato é que os automóveis elétricos custam uma fortuna.

O BMW i3, pioneiro no varejo nacional, sai por R$ 200 mil. A General Motors anunciou que lançará o Bolt EV (que inclusive tivemos a oportunidade de testar) em 2019 ao preço sugerido de R$ 175 mil. Já a Nissan abriu pré-venda do Leaf por R$ 170 mil. E por fim, a Renault anunciou o Zoe por R$ 150 mil. 

O grande problema é que o carro elétrico é caro em qualquer mercado. O preço salgado reflete no alto custo de produção, principalmente pelo valor das baterias, royalties sobre as tecnologias embarcadas e também pelo volume menor que de um carro convencional. Tudo isso encarece a fabricação. 

Na Alemanha, o i3 é vendido pelo equivalente a R$ 164 mil. Acontece que por aqui ainda incidem tributos como PIS, Cofins, ICMS e IPI. Ou seja, não é rentável para a BMW vender o carrinho por aqui. Mas ela enxerga como um investimento para fortalecer a marca.

A GM também não deverá colher muitos dividendos com a venda do Bolt EV. Nos Estados Unidos, o carrinho é vendido pelo equivalente a R$ 140 mil na versão básica e R$ 157 mil na versão mais sofisticada (que será a vendida por aqui). O Leaf é vendido nos EUA por US$ 30 mil, que numa conversão direta daria algo na cada dos R$ 112 mil. Já o Zoe custa o correspondente a R$ 100 mil.

Do outro lado do balcão
Se, para o fabricante, vender o elétrico exige um grande esforço de cálculo, para o consumidor a matemática também não é otimista. Por mais consciência ambiental que ele tenha, um compacto elétrico pode custar até quatro vezes o valor de um hatch com motor a combustão.

Só para se ter uma ideia, com os R$ 150 mil cobrados pelo Zoe (que é o mais barato, até o momento) o consumidor poderia gastar R$ 60 mil na aquisição de hatch compacto, com todos os ítens de conveniência disponíveis e ainda restariam R$ 90 mil. 

Tomada
Além disso, a recarga não é gratuita e nem rápida. O BMW i3, por exemplo, pode levar cerca de oito horas numa rede 220V –dobra se for em 110V. Com o carregador rápido, Wallbox, o tempo cai para 5 horas, mas ele custa R$ 7.500. Tudo isso sem contar o impacto que terá no relógio da companhia elétrica. 

Como não há uma regulamentação no Brasil para a recarga das baterias, muita gente que decidiu apostar nos elétricos precisou resolver o problema por conta própria. Uma solução é a instalação de células fotovoltaicas para gerar eletricidade a partir da captação da energia solar. 

O custo da instalação dessas placas para suprir uma residência com quatro moradores gira em torno de R$ 15 mil a R$ 20 mil, como explica o consultor da Econoterm, empresa de Contagem que comercializa sistema de captação de energia doméstica, Joel de Pinho. 

“Cada automóvel elétrico tem sua especificação. Daí é preciso saber qual é o modelo para elaborar um orçamento adequado. Hoje ter um carro elétrico é coisa para rico. Mas a tendência é que com o aumento da demanda tenhamos um barateamento de custo do carro e dos painéis solares”, explica o consultor, que estima, por alto, um investimento de pelo menos R$ 25 mil para instalar um sistema que suporte as necessidades da casa e também recarregar as baterias do automóvel.

A Renault e a construtora MRV firmaram parceria para demonstrar a viabilidade do uso desses painéis para “abastecer” os elétricos. A marca francesa cederá unidades do Zoe, que ficarão disponíveis para moradores de condomínios equipados com sistemas fotovoltaicos em Belo Horizonte. 

Corredores elétricos
Desde que iniciou as vendas do i3 no Brasil, em 2015, a BMW emplacou algo em torno de 350 unidades. Para estimular as vendas, a marca fechou parceiras com redes de shopping centers que oferecem pontos de recarga. Recentemente, inaugurou um corredor elétrico no trecho da rodovia BR-116 (presidente Dutra) no trecho que liga São Paulo ao Rio de Janeiro. São postos que permitem a recarga rápida das baterias (em até 1 hora) e que garantem cerca de 200 quilômetros de autonomia.

No entanto, o corredor da BMW cobre um trecho de apenas 450 quilômetros. Se consideramos que o Brasil tem 3 milhões de quilômetros de estradas, o corredor da Dutra é apenas o primeiro (e curto) passo.

O presidente da Nissan para América Latina, Jose Luis Valls, defende a necessidade de investimentos para construção de corredores elétricos. “É necessário que setores público e privado se envolvam para a construção de uma infraestrutura de pontos de recarga”, afirma.

Cana
Em junho o presidente da regional para América Latina, Antônio Filosa, indicou como a FCA enxerga a eletrificação de seu portfólio. Na ocasião, o executivo deixou certo é que modelos Jeep ganharão versões elétricas, mas não significa que serão comercializados aqui num futuro breve. Para ele, o foco no mercado brasileiro é a expansão do uso do etanol. 

“Nenhum outro país domina tanto a tecnologia do etanol como o Brasil. Eu sou apaixonado pelo etanol pois ele permite que o Brasil consiga a mesma eficiência energética dos híbridos e elétricos de demais mercados, na ordem de 30% nas reduções de emissões. Além disso, o etanol oferece as melhores condições para se obter molécula de hidrogênio, que é fundamental para viabilizar o Fuel Cell, que definitivamente é a melhor solução para mobilidade”, afirmou Filosa que, hoje, mesmo diante de tantos elétricos se preparando para desembarcar, ainda sustenta sua posição. 

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