Emprestou, dançou: cresce o número de negativados que cederam o nome a amigo ou parentes

Tatiana Moraes
14/06/2019 às 21:29.
Atualizado em 05/09/2021 às 19:07
 (José Vítor Camilo)

(José Vítor Camilo)

Pelo menos duas em cada dez pessoas “negativadas” entraram na lista suja do crédito após emprestar o nome para um amigo ou até mesmo um parente que simplesmente não honrou a dívida assumida. Pior: em 53% dos casos, quem arca com o prejuízo é quem tentou ajudar o comprador. Especialistas alertam que a prática deve ser evitada ao máximo.

Os dados são da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil). Conforme o estudo, o cartão de crédito é a forma mais usada para “emprestar o nome”, aparecendo em 35% dos casos. 

“Uma amiga estava organizando a festa de 15 anos da filha e eu emprestei meu cartão para ela comprar roupas para a família. Ela também pagou algumas coisas da festa com o cartão. O boleto ficou algum tempo sem aparecer e eu achei que ela estava pagando, até que descobri que eu estava com o nome sujo”, lamenta a copeira L.A. 

Ela foi ao banco e tentou negociar a dívida. O problema é que, com os juros, o valor já tinha quase triplicado, passando de R$ 580 para algo em torno de R$ 1,8 mil.
L.A. fez um acordo com a instituição financeira e pagou R$ 580. O objetivo era parcelar o restante do débito. “Mas eles falaram que o acordo não tinha sido concretizado e pediram para eu depositar mais R$ 480. Paguei e agora estou acertando o restante, parcelado”, diz. Clique para ampliar

Depois do cartão de crédito, emprestar cartão de loja é a maneira mais comum de entrar na lista de negativados: responde por 20% das ocorrências. Os financiamentos aparecem em seguida, com 17%.

A dona de casa Renilde Ramos engrossa essa estatística. Ela fez um empréstimo para ajudar uma amiga há algum tempo e a pessoa não quitou a dívida. 
“Foi uma dor de cabeça enorme para mim. Não aconselho ninguém a emprestar o nome porque se a pessoa não pagar é você que terá que arcar com o prejuízo”, lamenta.

A professora de Economia das Faculdades Promove Mafalda Ruivo afirma que o consumidor deve evitar ao máximo emprestar o nome para terceiros.

“A pessoa precisa falar ‘não’, mesmo que seja difícil. Depois que comprar, a dívida é do dono do cartão, ou do financiamento. Não vai adiantar falar que não foi você quem comprou. Além disso, o cartão de crédito é de uso pessoal e intransferível”, explica.

Já o economista Paulo Vieira pondera que se a pessoa quiser mesmo ajudar o amigo ou parente, o ideal é que faça a compra para a pessoa. Emprestar a senha ou o cartão deve ser uma prática abolida. 

“Em alguns casos, a pessoa ajuda mesmo. Se alguém precisar fazer uma compra no supermercado, por exemplo, a pessoa pode ir lá e comprar. Não precisa emprestar o cartão”, diz. 

Ele destaca, ainda, que é bom que a pessoa que pretende ceder avalie se ela tem condições de pagar a conta, caso o outro não quite a fatura.

“É uma questão que deve ser levada em consideração. É importante que a pessoa esteja preparada para o caso de ela ter que assumir o pagamento, afinal, os índices são altos”, alerta Vieira. 

Após o calote na dívida, relacionamento entre as partes fica abalado em 94% dos casos

A proximidade é algo que acaba facilitando o empréstimo de nome, seja por cartão de crédito, cartão de loja ou financiamento. Em 27% dos casos a abordagem partiu de amigos. Em seguida, aparecem os pais (14%), filhos (14%) e cônjuges (13%). Os colegas de trabalho ficaram em quarto lugar na lista, com 12% das citações.

Na avaliação do educador financeiro do SPC Brasil, José Vignoli, emprestar o nome para amigos ou conhecidos é uma atitude solidária, mas muito arriscada. “A pessoa que pede esse tipo de favor, geralmente, já tem o próprio nome com restrição ou está com a vida financeira desorganizada, então o risco de não receber o valor gasto é alto”, alerta.

Apesar dos transtornos financeiros gerados pela atitude, 45% dos entrevistados voltaram a emprestar o nome a outras pessoas, principalmente pelo pedido ter vindo de alguém muito próximo (22%) ou por não querer prejudicar o relacionamento com a outra pessoa (10%).

O relacionamento, aliás, fica abalado em 94% dos casos em que houve calote. “Eu ainda tenho contato com a pessoa, mas fiquei magoada com o que ela fez comigo”, diz a dona de casa Renilde Ramos, que fez um empréstimo para uma amiga e não recebeu o montante.

Já a copeira L.A., que ajudou uma amiga a fazer a festa de 15 anos da filha e também não recebeu o dinheiro gasto, diz entender o momento econômico pelo qual as pessoas passam. “Ela diz que está com muita dificuldade e que vai pagar quando melhorar. Eu entendo a situação dela”, afirma. 

É uma possibilidade. Das pessoas que emprestaram o nome e ficaram a ver navios, 68% cobraram dos devedores e 55% receberam o capital depois que a dívida foi paga. 

Os produtos eletrônicos, como computadores, celulares e TVs (22%) despontam como o principal tipo de aquisição feita em nome de terceiros. Depois aparecem eletrodomésticos (19%), materiais de construção (11%) e móveis para casa (10%). Outra constatação é que 32% dos entrevistados não sabiam o que seria adquirido com a compra feita em seu nome.

“Muitas vezes, a melhor ajuda é orientar esse amigo ou familiar a dar prioridade para o pagamento de dívidas, em vez de estimular que a pessoa assuma mais compromissos sem saber se ela terá condições de arcar com o pagamento mais para frente”, explica Vignoli.

  

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