Fatura da Copa: PBH cobra multa de hotéis que receberam incentivos e não ficaram prontos

Lucas Simões
05/04/2019 às 21:48.
Atualizado em 05/09/2021 às 18:07
 (RIVA MOREIRA)

(RIVA MOREIRA)

Pelo menos 13 proprietários de hotéis em Belo Horizonte que não terminaram as obras dos empreendimentos para a Copa do Mundo de 2014 terão que quitar um débito milionário com a prefeitura, sem direito a descontos. Em decreto assinado nesta semana, o prefeito Alexandre Kalil (PHS) exige o pagamento integral de multas — algumas podem ultrapassar R$ 100 milhões. A prefeitura, porém, vai negociar o prazo caso a caso.

O decreto 17.086, publicado no “Diário Oficial do Município” no último dia 3, tenta dar fim à novela dos empreendimentos inacabados, que se tornaram “elefantes brancos” pela cidade. 

Ao todo, 35 hotéis foram beneficiados pela Lei de Operação Urbana dos Hotéis Copa do Mundo FIFA Brasil 2014 (Lei 9.952/10). Entre as obrigações, havia a exigência de que os empreendimentos estivessem prontos até 30 de março de 2014 e que funcionassem por pelo menos dez anos. 

Das 35 unidades, 13 não cumpriram as metas e terão que pagar integralmente as multas previstas na lei e agora cobradas pelo município. As condições para o acerto, no entanto, só serão definidas a partir do início da negociação que as secretarias municipais da Fazenda e de Regulação Urbana pretendem fazer com cada empresário.

O decreto de Kalil modifica a Lei 10.911/2010, sancionada pelo ex-prefeito Marcio Lacerda (PSB), mas que não conseguiu solucionar o imbróglio da rede hoteleira. À época, a prefeitura, além de permitir o pagamento das multas em 15 anos, ofereceu ao empresariado um desconto de até 60% sobre os valores. 
Mesmo assim, nenhum empreendimento aderiu à proposta. “Muita gente se endividou nesse período. Esperaram um retorno e, como não houve tanta demanda, ficaram no prejuízo e não tiveram como terminar as obras”, avalia Maarten Van Sluys , consultor hoteleiro da JR & MvS Consultores.

Cinco anos após o Mundial, o novo decreto tenta outra solução, mas pode encontrar dificuldade para conseguir a adesão do setor hoteleiro. Para o advogado Kênio Pereira, presidente da Comissão de Mercado Imobiliário da OAB-MG, a Lei 9.952, de 2010, que permitiu o aumento do potencial construtivo de empreendimentos hoteleiros, inflou o mercado imobiliário da capital, que não teve uma demanda esperada para ocupar todos os novos hotéis. 

Atualmente, a taxa de ocupação dos hotéis da capital é de 35%, sendo que o ideal seria um percentual próximo de 70%, segundo a Associação Brasileira de Indústria de hotéis de Minas Gerais (ABIH-MG).

Por isso, ao invés de exigir o pagamento das multas nessas condições, Kênio defende uma revisão da legislação.

“Foi um erro estimular tantos hotéis, porque a ocupação da cidade já é baixa nesse setor. Não houve essa demanda toda em 2014 e, depois, os projetos de hotéis viraram elefantes brancos. Minha análise é que deveria haver uma condição melhor para pagar a multa. Por que qual empresário vai querer gastar para tentar terminar uma obra e pagar a multa integralmente?”, questiona Kênio.

Pelo decreto, o pagamento da multa é condição para que a prefeitura permita que os hotéis possam concluir as obras em até quatro anos ou que os empreendimentos inacabados sejam destinados a outros fins que não o ramo hoteleiro. Porém, caso o empresário opte pela segunda opção, a atividade diversa deve ser “permitida pela legislação vigente” e não pode implicar “a necessidade de aprovação de novo projeto arquitetônico”, como está disposto no artigo 2º do decreto.

Para Leonardo Matos, diretor do Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (Secovi-MG), o ideal seria que os empresários tivessem facilidade para alterar os empreendimentos. 

“Muitos desistiram do ramo de hotéis. Precisam de condições mais fáceis para tornar o empreendimento viável. Só que a exigência de pagar a multa integral, sem nenhuma conversa, não ajuda em nada”, avalia.

 Apenas um empreendimento tem previsão para ser concluído 


Dos 13 empreendimentos que serão obrigados a pagar multas por não terem terminado as obras para a Copa do Mundo de 2014, apenas um tem projeto para inaugurar o hotel, a partir do ano que vem, segundo apurou a reportagem do Hoje em Dia.

Situado no encontro das avenidas Getúlio Vargas com Contorno, o empreendimento Site Savassi, idealizado pelas construtoras Maio e Paranasa, contempla dois hotéis das bandeiras Novohotel e Ibis Budget. O projeto inicial previa 443 apartamentos e um estacionamento. 

Previsto para ser inaugurado em 30 de março de 2014, três meses antes do vencimento do prazo para empreendimentos construídos para a Copa do Mundo, conforme a Lei 9.952/10, o hotel deve ser inaugurado até o fim de 2020, segundo a construtora Maio. Apesar disso, a construtora não comentou se pretende pagar a multa exigida pelo decreto Nº 17.086, do prefeito Alexandre Kalil (PHS), para conseguir a liberação do Alvará de Localização e Funcionamento.

Segundo o advogado Kênio Pereira, presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG, os empresários que quiserem levar adiante as obras devem tentar negociar com a prefeitura os termos do decreto. 

“Não sei se o prefeito tem a intenção de rever o decreto. Mas duvido que alguém vá arcar com a multa integralmente, ainda mais na situação ruim que o mercado de hotéis vive. Há muitas opções e pouca demanda”, avalia Kênio.

Das dezenas de empreendimentos previstos para a Copa do Mundo de 2014, parte ainda está no “esqueleto” da construção. É o caso do Bristol Stadium Hotel, na avenida Alfredo Camarate, no bairro São Luiz, na região da Pampulha.

Com previsão de ter 344 apartamentos, as obras foram anunciadas em 2012, visando o Mundial, mas a CRM Construtora, responsável pelo empreendimento, não deu continuidade à construção e não informou o motivo da suspensão dos trabalhos. A reportagem tentou contato com a construtora, sem sucesso.

Outro famoso empreendimento anunciado para a Copa do Mundo, mas que nunca foi concluído, é o hotel Golden Tulip, no cruzamento da avenida do Contorno com a rua Rio de Janeiro, próximo à rodoviária. 

Idealizado pelo grupo norte-americano Wyndham, em parceria com as incorporadoras RFM, Pacific Realty e a construtora M.Roscoeo, o hotel teria 334 apartamentos e é uma adaptação do edifício Beira-Rio, considerado um dos maiores elefantes brancos da capital, com 27 andares. 

À época do anúncio do hotel, o apresentador Roberto Justus chegou a fazer propaganda do empreendimento. Questionada sobre as obras, a construtora M. Roscoe não retornou à reportagem.

 

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