'Fizemos 36 chamamentos de médicos sem candidatos', diz Lucinéia Carvalhais, diretora da Fhemig

Maria Amélia Ávila
mvarginha@hojeemdia.com.br
09/08/2021 às 08:38.
Atualizado em 05/12/2021 às 05:38
 (Fernando Michael/Hoje em Dia )

(Fernando Michael/Hoje em Dia )

Dos 125 chamamentos públicos que fez em busca de médicos para suas unidades de tratamento intensivo (UTIs) que tratam pacientes com Covid-19, a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) confirma que não houve candidatos em 36. Com isso, a maior fundação hospitalar da América do Sul continua à procura desses médicos intensivistas, segundo conta em entrevista ao Hoje em Dia a diretora Assistencial da instituição, Lucinéia Carvalhais.

Ela explica que as equipes estão completas, mas a falta de médicos intensivistas limitou a abertura de 10 leitos nos CTIs dos hospitais Eduardo de Menezes e Júlia Kubitschek, em Belo Horizonte. Essa mesma carência de médicos impossibilitou, segundo a diretora da Fhemig, a expansão de CTI em Patos de Minas. 

Qual é a ocupação de leitos de UTI e enfermaria Covid na Rede Fhemig? 

Os atendimentos foram centralizados em Patos de Minas, Juiz de Fora e Belo Horizonte. As taxas de ocupação são variáveis nas unidades da Rede Fhemig, dependendo do comportamento epidemiológico da pandemia em cada uma dessas regiões. Em Patos de Minas, a situação é mais pressionada, é uma localização onde ainda trabalhamos com dados de ocupação mais alta no CTI Covid. Em Juiz de Fora, a situação é mais confortável, a ponto de o município já ter manifestado a possibilidade da regressão de leitos de CTI no Hospital João Penido. Em Belo Horizonte, a taxa de ocupação das nossas unidades acompanha a taxa de ocupação geral do município. A situação neste momento é bastante confortável, com taxas de ocupação de enfermarias em torno de 50% ou menos, e de terapia intensiva um pouco acima disso, em torno de 60% a 70%, com pequenas variações. 

“A situação neste momento é bastante confortável, com taxas de ocupação de enfermarias em torno de 50%, ou menos, e de terapia intensiva um pouco acima disso, em torno de 60% a 70%, com pequenas variações”

Qual é a situação do estoque dos kits intubação, já que houve problemas em março e abril? 

A Fhemig, como todas as unidades públicas, privadas e filantrópicas, passou por uma situação bastante complicada, pela escassez no mercado. No entanto, não existe um medicamento único para atuar no “famoso” kit intubação. Existem medicamentos equivalentes, que podem ser substituídos por outras opções. Fizemos readaptação dos nossos protocolos de escolha prioritária para utilizar medicamentos que não são inferiores, mas são decisões protocolares de segunda ou terceira escolhas da Fhemig. Com essas intervenções, de manejo de estoque nos nossos hospitais, e a utilização de opções terapêuticas que tínhamos em estoque em quantidade menor, não tivemos nenhuma desas-sistência, nenhum desabastecimento que gerasse perda de qualidade assistencial. Perdemos alguns medicamentos no mercado,  mas conseguimos fazer substituições por outras opções. Fizemos compras excepcionais, emergenciais, para atingir estabilidade do estoque. Passamos por momento de muito estresse, com quantitativo pequeno, mas não chegamos a ter falta de medicamento que impedisse ou fizesse cair a qualidade assistencial. 

Hoje o estoque está normalizado?

Nós ainda temos problema no mercado. A Fhemig tem compras realizadas que ainda estão com atraso nas entregas pelos fornecedores, mas não estamos tendo desabastecimento. Não é uma situação confortável para dizer, por exemplo, que não é uma preocupação nossa. Estamos mantendo vários medicamentos, acima de 30 medicamentos, que não são só do kit intubação, em monitoramento sistemático, semanal, com intervalos menores. Ainda nos causa preocupação, por questões mercadológicas e até de importação, mas hoje temos uma situação muito tranquila em relação àquele momento em que muitos hospitais só tinham estoque para um dia ou que ficaram sem os insumos de manutenção da vida no país todo. 

"A Fhemig tem compras que ainda estão com atraso nas entregas pelos fornecedores, mas não estamos tendo desabastecimento”

Com a diminuição da ocupação dos leitos, o que será feito com a Unidade Alternativa de Assistência à Saúde Galba Velloso (Uaas-GV)? 

A Fhemig vocacionou essa unidade para dar suporte aos demais hospitais da rede que usaram todo seu quadro de recursos humanos e área física para atendimento à Covid, como Eduardo de Menezes e Júlia Kubitschek, e para dar retaguarda também a leitos gerais de clínica médica para o SUS. Foi um momento de muito sofrimento e muito estresse, em que precisamos retirar pacientes que eram atendidos, interromper a linha de cuidados, de atendimentos habituais do Hospital Eduardo de Menezes na infectologia; do Hospital Júlia Kubitschek, nas doenças respiratórias e cirurgia torácica, para dedicar equipes, espaço físico e insumos para resposta à pandemia. Por isso, foi implantada a Unidade Alternativa de Assistência à Saúde Galba Velloso no espaço do antigo hospital. Os pacientes que não tinham critério para alta foram acolhidos no Hospital Raul Soares, que teve expansão de leitos para isso. À medida em que a pandemia caminha para o controle, com o sucesso das medidas de mitigação, especialmente da vacina, os hospitais que estavam vocacionados para Covid começam a regredir o atendimento a esses pacientes e passam a assumir seus pacientes tradicionais. 

A Rede Fhemig está preparada para um novo aumento de casos, já que está aí a variante Delta, com mais poder de transmissão? 

Estamos preparados. A Fhemig foi a primeira unidade pública a produzir um documento, que está no site, que é um Plano de Capacidade Plena Hospitalar, que fala justamente sobre isso. Nós somos prestadores de serviços ao SUS, de alta complexidade. Esse documento descreve toda a disponibilidade da fundação em responder à pandemia. Esperamos que não tenhamos um descontrole, mas, caso aconteça, temos capacidade de aumentar de forma imediata a nossa resposta, dependendo da necessidade regional. A epidemia se comporta de forma diferente nas regiões e fazemos a ampliação de leitos conforme a necessidade. Hoje, se tivermos um cenário infeliz, seja com a Delta ou com uma outra cepa, conseguimos responder nos quesitos captação de recursos humanos, insumos, área física, equipamentos, medicamentos. Temos uma dificuldade comum, tanto a rede pública como a rede privada, que é a captação de médicos.


A Fhemig tem divulgado praticamente toda semana editais para a contração de médicos. Qual é o déficit desses profissionais na rede?

Isso chegou a ser limitante para a expansão de leitos. Hoje, temos equipes completas, algumas equipes com déficit, mas conseguimos supri-lo pagando plantões extras. Fizemos 125 chamamentos emergenciais para compor equipes médicas das nossas unidades e, desses, 36 sem candidatos. Isso é muito marcante! Uma fundação grande, que tem uma estrutura boa, que oferta uma condição boa de cuidado ao paciente e aos profissionais de saúde, ter esse número de chamamentos sem candidatos é um sinal de que o mercado traz essa limitação para toda a rede pública e impacta também na rede privada. O que nos deixa em prejuízo em relação à rede privada é a capacidade que ela tem para se moldar ao mercado e fazer adaptações de resposta imediata, como, por exemplo, a questão salarial. 

Qual é o déficit e quais as especialidades com mais necessidade?

O maior déficit que a Fhemig tem de especialidade é o médico com experiência e conhecimento para atuação em terapia intensiva. Hoje temos déficits pontuais, é muito dinâmico. Fazemos os chamamentos e vamos repondo. Periodicamente, temos desligamentos e reposições. Mas tivemos limitações e o reflexo foi que não conseguimos abrir 10 leitos no CTI do Hospital Eduardo de Menezes, 10 leitos no Hospital Júlia Kubitschek; assim como não conseguimos expandir leitos de CTI em Patos de Minas, pela carência de médicos. 

O Estado divulgou recentemente que as cirurgias eletivas podem ser retomadas. Como está a fila por esses procedimentos nos hospitais da rede?

A Rede Fhemig é uma prestadora importante de cirurgias eletivas, especialmente em Belo Horizonte, Juiz de Fora e Patos de Minas. Quem faz a gestão e o envio desse paciente para o atendimento dos hospitais da Fhemig, assim como nos outros hospitais do SUS, é o próprio município. Temos informações dos municípios sobre a alta demanda e estamos preparados, estamos nos organizando para o momento da autorização do retorno. Temos uma preocupação grande em relação aos medicamentos usados no centro cirúrgico no momento em que o paciente está sob anestesia geral, sob sedação para passar pelo procedimento, que não tivemos falta, mas são os mesmos do kit intubação. Acompanhamos muito de perto, com desejo de retomar esse serviço, com preocupação em relação a esses insumos, mas isso vai de acordo com a condição da epidemiologia nas ondas de cada município onde a Rede Fhemig atua. Claro que sabemos que está represado, pelo esforço vocacionado para a Covid e pela suspensão para a segurança dos pacientes das cirurgias eletivas. 

Em março, havia 5 mil pessoas aguardando transplantes em Minas – 21,5% a mais do que em 2020. Como está a fila? 

O MG Transplantes é uma das unidades da Fhemig que trabalha com a organização e alguns processos de captação no Estado. O cenário no ano passado foi muito ruim, com queda de doadores, especialmente quando houve a parada geral. A fila é grande, nacional, varia em relação ao tipo de órgão, da captação, que pode ser de vivos, alguém que tenha compatibilidade na família ou óbito. A pandemia impactou fortemente porque o cenário mudou muito, com esforço voltado para o atendimento da Covid. Agora, a situação é menos desfavorável do que foi no ano passado, principalmente nos meses de março a junho, quando houve uma baixa absoluta. Está se restabelecendo aos poucos.

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