(CRISTIANO MACHADO)
Um dia após a aprovação do projeto de lei que regulamenta a terceirização no país, pela Câmara dos Deputados, o ministro do Trabalho e Emprego, Manoel Dias, em visita a Belo Horizonte, admitiu considerar prejudicial ao trabalhador o ponto que permite a prática nas chamadas atividades-fim. O ministro evitou avaliar os impactos da lei, afirmando desconhecer os detalhes do projeto aprovado.
“Se for mantido no projeto original (o texto que estende a permissão para terceirizar atividades-fim), que estava no Congresso, (a lei) não é boa. Mas não posso confirmar porque não li ainda (o parecer aprovado na quarta-feira), não tive oportunidade porque estou desde 5 horas em atividades aqui em Belo Horizonte”, afirmou Dias.
Dias garantiu que o governo Federal não permitirá “subtração dos direitos dos trabalhadores”. Apesar de admitir que hoje são recorrentes os casos de terceirizadas que deixam de investir em segurança do trabalho e no pagamento de direitos trabalhistas, o ministro elogiou os outros pontos do polêmico texto.
“Se as contratantes forem realmente obrigadas a reservar um percentual do valor pago à terceirizada para garantir os pagamentos do trabalhador, os direitos estão garantidos. Hoje a terceirização existe e a falta de regulamentação cria uma insegurança jurídica para os empregadores e trabalhadores. Se aprovada, a lei vai aumentar as oportunidades de trabalho, já que muitos setores vão se formalizar”, acredita Dias.
O presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Olavo Machado Junior, fez coro aos elogios e rechaçou qualquer possibilidade de prejuízo ao trabalhador, mesmo com a manutenção do texto que permite a terceirização da atividade-fim. “Temos que valorizar a competência do trabalhador. Não interessa se a atividade é fim ou é meio. Precisamos acabar com o mito de que a terceirização vai precarizar. Precarizar por quê? Vou deixar precarizar? Não, vai criar muitos empregos”, disse.
A exemplo do ministro do Trabalho, o secretário de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social de Minas Gerais, André Quintão, enalteceu a regulamentação do serviço terceirizado, mas mostrou-se preocupado com os direitos trabalhistas. “A terceirização em si não é fator negativo, mas ela tem que ser muito bem acompanhada, monitorada. Os direitos dos trabalhadores têm que ser respeitados”, disse Quintão.
Indagado sobre o cenário econômico do país, o ministro do Trabalho disse que “momentos de dificuldade são superáveis” e ainda relativizou as medidas do governo Federal que restringem direitos trabalhistas. “Com o governo tomando as medidas necessárias na área fiscal, que não são grandes ações, são pequenas ações, o mercado brasileiro não vai parar”, defendeu.
Norma em xeque
Durante a série de reuniões com representantes sindicais, do comércio e da indústria realizadas na última quinta-feira (9) na capital mineira, o ministro Manoel Dias foi bastante cobrado em visita à Fiemg. A principal queixa do setor é relativa a uma norma que regulamenta a segurança no trabalho em máquinas e equipamentos, a chamada NR-12 (Norma Regulamentadora 12).
“Não somos contra a fiscalização, achamos necessária, mas achamos também que tem de haver um pouco de bom senso”, disse Olavo Machado.
O ministro afirmou que uma comissão começa a trabalhar na próxima semana na atualização da norma.
Nova regra deixará mão de obra mais barata
Bastou a Câmara dos Deputados aprovar o Projeto de Lei 4330/2004, que regulamenta contratos de terceirização inclusive da atividade-fim, barateando o custo de mão de obra , para que a polêmica envolvendo o tema voltasse à tona e colocasse em lados opostos empresários e trabalhadores.
Caso aprovada no Senado na próxima semana e sancionda pela presidente Dilma Rousseff, a lei permitirá a terceirização das atividades-fim das empresas e não apenas das atividades-meio. Isso viabilizará, por exemplo, que uma empresa de arquitetura contrate um arquiteto terceirizado e não somente pessoal de recepção, limpeza e segurança.
Apenas em Minas Gerais, cerca de 1,2 milhão de trabalhadores estavam na condição de terceirizados, segundo o levantamento mais recente feito pela CUT em parceria com o Dieese. O número equivale a quase 10% de toda a mão de obra terceirizada no país.
De acordo com o desembargador do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (TRT-MG), Marcelo Lamego Pertence, a mudança pode fazer com que o número de contratos de terceirização dobre de tamanho no Estado e traga prejuízos ao trabalhador.
“Esse é o primeiro passo para acabar com o Direito do Trabalho, que existe para combater desigualdades contratuais. Todos os benefícios adquiridos pelas classes profissionais serão perdidos porque os contratos podem ser rescindidos caso o trabalhador contratado faça exigências. Que pressão esses trabalhadores poderão exercer para adquirir melhores condições perante o contratante?”, questiona.
Para os defensores do projeto, um dos principais benefícios da mudança será a geração de postos de trabalho e a uniformização das regras para tratamento dos terceirizados, conforme afirma o presidente do Conselho de Relações do Trabalho da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Osmâni Teixeira de Abreu.
“Um problemas sério é a insegurança jurídica. Sem a aprovação desta lei, cada juiz julga a questão à sua maneira. Para uma realidade de 12 milhões de terceirizados em todo o país, a medida vai regular o mercado e trazer proteção ao trabalhador”, comenta.
Outro ponto positivo apontado por Abreu seria a garantia de acerto exigida pela lei nos casos de falência. “A lei vai impedir empresas de falirem deixando de pagar os funcionários porque obriga a criação de fundos para o acerto com esses trabalhadores”, afirma.
Centenas de pessoas foram às ruas protestar em BH
Os trabalhadores foram às ruas na última quinta-feira (9) para protestar contra a aprovação pela Câmara dos Deputados do texto que regulamenta a terceirização no país. O objetivo era chamar a atenção da população para o que a Central Sindical e Popular (CSP Conlutas), que convocou a manifestação, classifica como “malefícios para os empregados”. Eles participarão de uma paralisação nacional na próxima quinta-feira, em que todas as centrais serão envolvidas.
Os manifestantes, convocados pela CSP Conlutas, saíram da Praça 7 e seguiram rumo à rodoviária pela avenida Afonso Pena, voltando ao ponto inicial pela avenida Caetés. Por onde eles passavam, o trânsito era interrompido.
De acordo com o coordenador-geral da entidade, Gilberto Gomes, ao aprovar o texto, a Câmara começou o processo de “destruição” da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
“O Brasil é recordista de mortes de acidentes de trabalho. E a maioria dos acidentes acontece com os terceirizados, que não recebem o tratamento adequado”, afirma.
Ainda de acordo com ele, a sociedade não conhece o teor do projeto e, portanto, não tem se importado.
“Quando as pessoas souberem que o emprego delas está em xeque, elas irão se importar”, afirma Gomes, que representa movimentos sindicais, populares e da juventude.
A terceirização vai retirar gradativamente os direitos dos trabalhadores, na avaliação do assessor de formação da Federação Sindical e Democrática dos Metalúrgicos de Minas Gerais, Geraldo de Araújo Silva. A redução salarial também é citada por ele.
“Quem trabalha em uma empresa terceirizada recebe até 50% menos do que uma pessoa que tem a carteira assinada pela companhia principal. Sem contar que os benefícios são diferentes. Participação nos lucros, por exemplo, o terceirizado não recebe”, aponta.
O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Divinópolis, Anderson William Santos, também acredita que a regulamentação da terceirização, inclusive da atividade-fim, enfraquecerá os trabalhadores e fortalecerá as empresas.
“É um desastre, fortalecem o poder privado, enquanto tiram os nossos direitos”, critica o líder sindical.
Durante a manifestação, os trabalhadores protestaram, ainda, contra as medidas provisórias 664, que muda as regras para concessão do auxílio-doença e pensão por morte, e 665, que altera a concessão de seguro-desemprego e abono salarial.