MP se esforça para não deixar 30% das comarcas de Minas sem representante

Giulia Mendes - Hoje em Dia
Hoje em Dia - Belo Horizonte
16/03/2015 às 08:01.
Atualizado em 18/11/2021 às 06:21
 (LUCAS PRATES/Hoje em Dia)

(LUCAS PRATES/Hoje em Dia)

Minas Gerais tem hoje pouco mais de mil promotores que se desdobram para atender todo o Estado. Atualmente, 87 comarcas mineiras não contam com promotores titulares – quase 30% das 296. O órgão não tem orçamento para dar posse a todos os 40 aprovados no último concurso. O procurador de Justiça Nedens Ulisses Vieira, presidente da Associação Mineira do Ministério Público (AMMP), explica como o órgão contorna essa carência para continuar combatendo o crime organizado.

O número de promotores e procuradores em Minas Gerais é suficiente?

O Ministério Público ainda tem um déficit. Estamos aquém da necessidade e temos muitos cargos vagos. Comparativamente com a magistratura, que é o nosso paradigma, temos menos promotores do que juízes. Isso faz com que tenhamos várias comarcas dividindo promotores com outras.

O que fazer diante dessa situação?

A solução adotada pela Procuradoria Geral, há muito tempo, é fazer com que um promotor titular de determinada comarca seja substituto em outra, ou que ele coopere em mais de uma comarca. Para tentar fazer frente às demandas de duas ou três comarcas, é feito um esforço de toda a classe, mas isso acarreta problemas. Uma comarca precisa ter um promotor de Justiça fisicamente representado, que seja referência e representação do Ministério Público. Aquele que vai acolher as demandas judiciais e extrajudiciais, já que muitas delas podem ser resolvidas por aconselhamento. Além disso, traz segurança para a sociedade ter um promotor, um juiz, um delegado e um comando da Policia Militar no município ou na comarca. Essa participação do Ministério Público fica deficiente quando é feita apenas por cooperação ou substituição.

Qual seria a solução?

Seria mais concursos. No início do mês, demos posse a 24 promotores, sendo que passaram 40. Mas o orçamento não permitiu que fossem empossados todos os novos promotores. Eles passam por um curso, um treinamento e, de acordo com a ordem de classificação, escolhem uma comarca entre as vagas disponíveis. A prioridade são as comarcas de difícil provimento, no Vale do Jequitinhonha e no Norte de Minas.

Existe ameaça de redução do orçamento do Ministério Público tendo em vista a situação financeira do Estado?

Tenho acompanhado esse assunto pela imprensa e também com o Procurador-geral de Justiça, Carlos André Bittencourt. Estão havendo conversas para acertar a questão orçamentária. Eu acho, à primeira vista, que seria inviável uma diminuição do nosso orçamento, porque o Ministério Público, como ocorre com o Poder Judiciário, necessita do orçamento que foi proposto para realizar suas atividades.

A remuneração é adequada? A carreira de promotor público está atrativa?

A carreira, no aspecto remuneratório, é atrativa, sim. Nós temos uma boa remuneração. Não é nada exagerado, mas é uma remuneração bastante razoável. Não existem mais as dificuldades que a minha e outras gerações enfrentaram no início de carreira. Mas o que acho mais importante é que possamos encantar, emocionar e motivar os novos promotores, aqueles jovens homens e mulheres que saem da faculdade para exercer uma função que vai ao encontro da sociedade, do cidadão. Trata-se de um profissional que tem autonomia, que tem prerrogativas importantes, que tem instrumentos para crer que pode contribuir para uma mudança positiva da sociedade. Acho que esse é o encantamento que pode atrair os novos promotores de Justiça.

A movimentação nacional do Ministério Público contra a aprovação da PEC 37 foi coordenada a partir da sua atuação. O resultado foi satisfatório?

A minha atuação na coordenação nacional aconteceu em função da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), da qual faço parte como primeiro vice-presidente. Foi uma atuação das entidades de classe. Houve também coordenação nacional. Nós trabalhamos em conjunto com o Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais que orientava todas as instituições, o Ministério Público em todos os estados e o da União. Foi um trabalho de fôlego, que demandou mais de um ano. Em vários momentos, se a PEC 37 fosse colocada em votação, ela passaria. Acho que foi importante esse trabalho porque houve uma união muito grande do Ministério Público brasileiro.

Como fica a relação do MP com outras instâncias que defendiam a aprovação da PEC 37?

Não queremos investigar tudo, não queremos suprir a atividade da Polícia Judiciária, representada pelo delegado de polícia nos estados e o delegado federal em nível nacional. Queremos cumprir o nosso papel de combate à criminalidade mais violenta e organizada, investigando casos pontuais, casos esses que ainda não foram investigados. Aí está a importância desse trabalho do Ministério Público.

Mas houve desgastes?

Eu acredito, sinceramente, que a PEC 37 trouxe um prejuízo nas relações entre o Ministério Público e a Polícia Judiciária, tanto no âmbito do Estado quanto federal. Cotidianamente, o trabalho realizado na investigação criminal é feito em conjunto e, em muitas vezes, complementarmente. Quero acreditar que, passado esse momento, vamos conseguir analisar melhor o quadro. A realidade é que só vamos cumprir o nosso papel de prestar uma segurança publica eficiente à sociedade e ao cidadão, combater a criminalidade violenta e organizada, se trabalharmos juntos, integrados. O caso do atentado ao promotor Marcus Vinícius Ribeiro, em Monte Carmelo, é um exemplo de apuração rápida e eficiente que deu uma resposta não ao Ministério Público, mas principalmente à sociedade local, de maneira pronta. Isso só ocorreu porque Ministério Público, Polícia Civil, Polícia Federal, promotores e juizes atuaram em conjunto.

Como o sr. avalia o envolvimento da sociedade na votação da PEC 37?

Foi um aspecto extremamente positivo. A sociedade percebeu a importância da atuação do Ministério Público nas mais diversas áreas.

Na sua opinião, existe necessidade de aperfeiçoamento do Código Penal? Como o Ministério Público pode contribuir com isso?

A Conamp, que congrega mais de 17 mil membros do Ministério Público brasileiro, tem participado nos últimos anos do acompanhamento do processo legislativo. Temos várias comissões que atuam autonomamente ou paralelamente para levar sugestões e propostas para o aprimoramento do legislativo, especialmente no combate à criminalidade. Já tivemos oportunidade, em diversos momentos, de cooperar com o Legislativo no aperfeiçoamento da legislação no combate à criminalidade organizada. Vários projetos que hoje são leis tiveram a contribuição do Ministério Público.

Estruturalmente, onde está o principal problema da Justiça brasileira?

Acho que o maior problema que a Justiça, ou o sistema de Justiça, enfrenta é a demanda cada vez maior e uma resposta lenta. Temos que conseguir meios e instrumentos, inclusive legislativos para dar uma resposta mais efetiva, mais imediata e eficiente.

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