Novo presidente da Amagis defende o voto de todos na escolha dos dirigentes

Paulo Leite - Hoje em Dia
11/01/2016 às 07:12.
Atualizado em 16/11/2021 às 00:58
 (Luiz Costa)

(Luiz Costa)

Aos 51 anos e há 22 na magistratura, o mineiro de Caratinga Mauricio Torres Soares é o novo presidente da Associação dos Magistrados Mineiros (Amagis). Acreditando na sintonia do exercício da Justiça com a sociedade e na democratização do Judiciário, o desembargador comanda a instituição no triênio 2016/2018.
 
Para a melhor compreensão do leitor, quais as atividades desenvolvidas pela Amagis?
A Amagis é o braço político da magistratura. Ela defende os interesses comuns dos juízes, de seus associados. Com essa função defendemos os interesses dos juízes, atendendo seus pleitos, questões relacionadas com suas atividades nas comarcas.
 
Aos 60 anos a entidade pensa em modernização?
O processo de modernização é contínuo, tudo tem que ser aprimorado. A própria Justiça inseriu em seus sistemas o processo eletrônico, mostra que esse é o caminho a ser seguido. A Associação deve sempre buscar novas idéias, novos propósitos, acompanhando a evolução da sociedade.
 
A imagem que se tem da atividade dos magistrados é a das mesas cheias de processos. Essa é a realidade brasileira?
Em parte sim. Engatinhamos nas novas práticas, como eu já citei o processo eletrônico, mas a maior parte dos juízes ainda não foi alcançada por esses métodos. Na maior parte das comarcas ainda vemos esse incomodo dos papéis acumulados em mesas e estantes.
 
Isso revela uma justiça morosa?
Com certeza, os novos métodos de trabalho vêm auxiliar na transformação dessa realidade, mas ainda buscamos uma maior agilidade. São diversos os fatores que contribuem para essa morosidade, dentre eles a falta de estrutura. Em pesquisa recente do Conselho Nacional de Justiça, juízes reclamam da falta de implementação do processo eletrônico, da falta de servidores. Tem juízes que trabalham tendo nas suas comarcas, que normalmente abrangem vários municípios, cinco, no máximo seis servidores. Isso estrangula os processos, as vezes não sendo cumpridas as determinações processuais dos juízes.
 
São suficientes os recursos destinados ao Judiciário brasileiro?
Lamentavelmente não. Em Minas Gerais temos um concurso em que foram aprovados cerca de 60 magistrados, e o Tribunal, por questões orçamentárias, não pode nomear nenhum deles. No Estado temos um déficit de cem juízes e também por problemas orçamentários já soube que em 2016 provavelmente só consigamos nomear de 25 a 30 dos aprovados.
 
O Código de Processos pode ser modernizado?
Sim. Já tivemos algumas reformas no Código, que é o que dá norte para a tramitação dos processos. Mas a meu ver elas são muito tímidas. Temos que fazer reformas mais profundas para atingir o ponto principal da questão que é a morosidade da Justiça. Ela incomoda tanto aos que se servem da Justiça, como os que prestam os serviços, pois é muito frustrante a sensação de impotência que o juiz tem por não resolver as demandas a tempo e a hora.
 
A atividade do juiz no Brasil é insegura?
Sim, hoje principalmente no interior, observamos que um interessado ou um réu chega a sala do juiz sem nenhum anteparo. Ele fica face a face com o juiz sem nenhuma obstrução. Precisamos dotar as comarcas do interior dessa proteção. Colocar detectores de metais nos fóruns, porque as vezes só nos resta lamentar fatos ocorridos e esse não é o melhor caminho. Essa é uma das lutas da Amagis, porém sabemos que por problemas orçamentários essas medidas não são tomadas.
 
Quanto a crise das instituições brasileiras atinge o Poder Judiciário?
Desde que ingressei na magistratura, há mais de 20 anos, vejo que os magistrados têm dificuldades de comunicar-se com os cidadãos. Somos servidores públicos, nossa função é servir os que dependem de nós, mas temos dificuldade de nos aproximar das pessoas. O que é feito pelo juiz tem que ser entendido pela sociedade, mas isso acaba sendo culpa nossa. Nos fechamos nos gabinetes, não mostrando o trabalho feito, realizado. Qual a razão de ele existir.

O embate recente entre os poderes Judiciário e o Legislativo no plano federal afeta as relações de poderes no país?
A meu ver esse embate é perfeitamente compreensível. Ele tem que existir no processo democrático. São os freios e contrapesos dos poderes. Um poder tem controlar e fiscalizar o outro. O Judiciário tem que fazer cumprir as leis, por isso é natural que esses enfrentamentos aconteçam. Não vejo isso como demérito. Em ocasiões de crise, como a que passamos, isso aflora e em outras, de épocas mais serenas, isso acontece num menor número de vezes. Mas isso é natural.

O que o senhor pensa sobre a democratização da Justiça.
Sou a favor. Os que são eleitos para dirigir o Judiciário sempre o foram por um colegiado muito pequeno. Isso atinge a organização, a todos os juizes, portanto é natural que todos queiram participar na escolha de pessoas, que na visão de cada um, melhor lhes represente. Isso é um avanço que deve vir num futuro próximo.

Qual sua opinião a respeito do ensino do Direito no país?
Tem crescido muito o número de escolas de Direito no país. Só no entorno de Belo Horizonte temos faculdades em Sete Lagoas, Divinópolis, Itaúna, ouço até dizer que em Minas Gerais temos mais faculdades de Direito do que na Europa. Não sou contra, mas temos que zelar pela qualidade do ensino. Podemos ter inúmeras escolas, mas com uma qualidade atestada. Uma prova de que essa qualidade não é observada é o fato de a OAB exigir uma prova. Fazendo com que os formandos provem ao órgão de classe estar aptos ao exercício da profissão.

Vivemos em pleno estado de direito? Se não, o que devemos fazer para tê-lo?
A nossa democracia é relativamente nova se compararmos a outro países, principalmente da Europa ou da América do Norte, com democracias sólidas. Entendo que o processo de amadurecimento nos leve a passar por alguns revezes, mas se pretendemos alcançar a plena democracia temos uma tarefa longa que só pode ser atingida com passos pequenos que nos levem a esse horizonte, mas creio que estamos em um bom caminho. Na maior parte das vezes estamos bem intencionados, Claro, cometemos alguns deslizes que são próprios desse amadurecimento, mas o destino de todas as democracias é passar por isso, na busca dessa maturidade. O que temos que fazer é continuar insistindo na busca do país que todos queremos. Precisamos nos destinar a essa busca, às vezes com mais vigor para que isso aconteça. Todos dependemos de uma democracia estável, todos queremos uma nação madura que evite muitas das coisas que observamos atualmente. Como eu disse, devemos conquistar esse estado com determinação, passo a passo.

“O que temos de fazer é continuar insistindo na busca do país que todos queremos. Precisamos nos destinar a essa busca, às vezes com mais vigor”
 
“Temos que fazer reformas mais profundas para atingir o ponto principal da questão que é a morosidade da Justiça. É frustrante a sensação de impotência que o juiz tem por não resolver as demandas a tempo e a hora”
 
No Estado de Minas Gerais são 296 comarcas instaladas, para atendimento aos 853 municípios mineiros. O déficit de juízes no Estado é de aproximadamente cem juízes.

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