Onda de reajustes acirra disputas em condomínios

Janaína Oliveira - Hoje em Dia
19/04/2015 às 07:47.
Atualizado em 16/11/2021 às 23:42
 (Lucas Prates)

(Lucas Prates)

Turbinado pelo aumento expressivo das tarifas de energia elétrica e de água, o valor do condomínio vai pesar mais no bolso de quem mora em prédios. As taxas condominiais devem ficar 30% mais caras, em média, com o repasse, em até 90 dias, da alta do custo das contas de Cemig e Copasa, segundo projeção da GW Administradora de Condomínios. Ainda ajuda a salgar a mensalidade a inadimplência, que só vem crescendo.   Segundo levantamento da Câmara do Mercado Imobiliário e Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (CMI/Secovi-MG), o calote aumentou 8,6% no ano passado, na comparação com 2013. E em fevereiro deste ano, chegou ao perigoso patamar de 11,78%.   Como o “rombo” é rateado assim como as demais despesas do condomínio – porteiros, faxina, elevador, energia elétrica e lazer –, a alta nos custos pode acirrar a briga entre proprietários de apartamentos padrão e donos de coberturas e áreas privativas, que normalmente pagam um valor maior.   Isso porque a maioria das convenções prevê a fração ideal para cálculo, ou seja, a cota é baseada na metragem do apartamento.   “Neste ano, puxados pelos reajustes da luz e da água, os custos dos condomínios subirão expressivamente. Com o impacto maior no bolso, é provável que muitos proprietários de coberturas, que hoje pagam muito mais que os vizinhos, recorram à Justiça para igualar o valor da cota. Nesse cenário, acredito que o volume de processos contra a cobrança pela fração ideal cresça em torno de 20%”, afirma o presidente da Câmara de Direito Imobiliário da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Minas Gerais, Kênio de Souza Pereira.   Além do desejo de aliviar a conta bancária, decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) devem encorajar os proprietários a buscar um pagamento mais justo, na avaliação do advogado.   Precedente   Julgamento recente da Corte abriu precedente para que moradores de coberturas ou apartamentos térreos com áreas privativas possam pagar valor de condomínio igual aos demais condôminos.   “Já que tal fato (ser dono de um imóvel com maior metragem), por si só não aumenta a despesa do condomínio, não confere ao proprietário maior benefício do que os demais e, finalmente, a área maior não prejudica os demais condôminos”, afirma decisão do tribunal.   Em outra ação, desta vez movida por uma proprietária de apartamento padrão contra o condomínio que dividia as despesas igualmente entre as unidades tipo e cobertura, os ministros do STJ não aceitaram a alegação de que o apartamento menor gasta menos do que o maior, e assim julgou ser correto o rateio igualitário.   “O pagamento dos funcionários, a manutenção das áreas comuns e os encargos tributários incidentes sobre essas áreas beneficiam de forma equivalente todos os moradores, independentemente de sua fração ideal. Os custos, em sua maior parte, não são proporcionais aos tamanhos das unidades, mas das áreas comuns, cuja responsabilidade e aproveitamento são de todos os condôminos indistintamente”, diz trecho do acórdão.   Para Pereira, moradores de condomínios compostos por 300 apartamentos de 2 e 3 quartos e algumas coberturas, com enormes áreas de lazer, serão os primeiros a engrossar as demandas na Justiça.   Moradores de apartamentos maiores alegam que os gastos são os mesmos   Depois de anos de briga na Justiça, a aposentada Olinda Aguiar, proprietária de um apartamento térreo na Serra, Zona Sul de Belo Horizonte, ganhou o direito ao pagamento igualitário da taxa de condomínio. Com a decisão, eliminou-se o rateio pela fração ideal que determinava que dona Olinda pagasse 131% a mais que os demais vizinhos.   “Como os juízes entenderam que o pagamento igualitário seria retroativo a 10 anos, passei a ser credora do condomínio. Com o crédito, estou sem pagar condomínio desde 2012”, conta. Como possui um amplo jardim em casa, ficou ajustado que ela pagaria 20% a mais em relação à água. “Foi uma solução justa”, comemora.   Proprietário de uma cobertura de um edifício na rua Tupis, no Centro, o aposentado José Pereira pagava 188% a mais que os vizinhos. “A cada reajuste era uma facada”, lembra.   Insatisfeito, ele recorreu aos tribunais. E conseguiu baixar o valor da taxa. “Não uso mais porteiro ou faxineira que os outros. E na minha casa só moram três pessoas. Então o sentimento é que a justiça foi feita”, afirma.   Busca de acordo com os vizinhos deve ser o primeiro passo   Diante da escalada das tarifas de água e energia elétrica, além do aumento da inadimplência, a necessidade de reajustar as taxas de condomínio é consenso entre os especialistas do setor imobiliário. Mas a questão da equiparação do valor para todos os moradores é polêmica e gera controvérsia.   “Não só os reajustes estão assustando. A inadimplência também é motivo de grande preocupação. Geralmente, quando o índice está em 10%, o síndico ainda consegue controlar e usar o fundo de reserva. Mas quando passa disso, como agora, em que o percentual já está em quase 12%, não há outra saída senão aumentar a taxa e ratear a falta de arrecadação”, diz o vice-presidente das Administradoras de Condomínio da CMI/Secovi-MG, Leonardo Mota.   Porém, mesmo com a disparada nos gastos, ele não vê com bons olhos a corrida à Justiça pela paridade dos valores das taxas de condomínio.   “A lei diz que a taxa de condomínio é calculada por fração ideal, salvo se a convenção estabelecer algo diferente. Quem se sentir injustiçado pode pedir uma reunião de condomínio, expor os motivos e propor um acordo. Em alguns casos, pode-se chegar à conclusão de que é justo o proprietário da cobertura pagar a mais apenas pela água, por exemplo”, afirma Mota.   Negociação   O diálogo também é defendido pelo sócio da GW Administradora de Condomínios, Gilberto Vespúcio.   “Em alguns casos, quem mora na cobertura pode ter que pagar até o dobro, considerando-se a fração ideal. Já em convenções mais modernas, a regra vale apenas em caso de reformas no prédio. E o acréscimo da água gira em torno de 20%, 25%, dependendo da área. Pode ser uma forma mais justa de dividir a despesa”, diz Vespúcio.   O advogado do setor imobiliário Kênio Pereira defende um valor similar para vizinhos do mesmo edifício, independentemente do tamanho do apartamento.   Ele toma como base a divisão de despesas para troca de uma fechadura. Cita como exemplo um prédio com 20 unidades, sendo 19 apartamentos tipo e uma cobertura, com fração ideal 85% maior que os demais apartamentos.   “O síndico fará três chaves para cada um dos apartamentos, ao preço de R$ 5 a unidade. Assim, serão 60 chaves. Mas ao dividir o custo de R$ 300 por 20,85, o resultado comprovará que a cobertura pagará parte das despesas dos apartamentos tipo. Ao aplicar a fração ideal para dividir essa despesa, como também é feito com todas as demais que decorrem das áreas comuns, cada apartamento tipo pagará R$14,39 pelas três chaves, ou seja, 4,2% a menos do que seria o correto”, diz.   Já a cobertura, nos cálculos do advogado, pagará R$26,60, ou seja, o correspondente a 5,32 chaves. “Isso foge ao bom senso”, defende.

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