Parlamentares receberam R$ 529 mi em emendas e órgãos públicos sofrem com a escassez de recursos

Filipe Motta
fmotta@hojeemdia.com.br
06/07/2017 às 22:24.
Atualizado em 15/11/2021 às 09:25
 (editoria de arte)

(editoria de arte)

Enquanto o presidente Michel Temer (PMDB-SP) amplia a liberação de emendas parlamentares, num processo de barganha política que busca salvar o seu governo, áreas críticas das políticas públicas do país vêm enfrentando dificuldades financeiras.

Dados do Sistema de Gastos Orçamentários do Governo Federal (Siafi) apontam que somente em junho houve a liberação de R$ 529 milhões em emendas parlamentares, num total de R$ 1,48 bilhão no ano.

A liberação dos valores, que se referem ao orçamento de 2017 e a restos a pagar de anos anteriores, busca garantir apoio ao presidente no momento em que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara pode votar a admissibilidade de Temer ser julgado no Supremo Tribunal Federal (STF).

O grosso do dinheiro (R$ 1,2 bilhão ou 83,5%) foi destinado a membros da Câmara. Dentre os parlamentares mais beneficiados estão tucanos e peemedebistas de peso, como os senadores José Serra (PSDB-SP), com R$ 9,6 milhões, e Marta Suplicy (PMDB-SP), com R$ 9,4 milhões, e o deputado federal Baleia Rossi (PMDB-SP), com R$ 7,5 milhões.

Como a origem desses parlamentares sugere, o estado mais beneficiado pelas emendas foi São Paulo, como R$ 221,7 milhões. Minas Gerais vem em segundo lugar, com R$ 125 milhões recebidos.

Ao mesmo tempo, episódios recentes como o anúncio de suspensão de atividades por parte da Polícia Rodoviária Federal, a paralisação na emissão de passaportes, os relatos da falta de dinheiro nas universidades e a queixa de municípios de falta de verba para saúde e educação apontam a escassez de recursos para a execução de políticas estruturantes.

Polícia
No caso da Polícia Rodoviária Federal, o mesmo Sistema de Gastos Orçamentários aponta que dos R$ 4,49 bilhões autorizados para serem gastos pela instituição em 2017, R$ 3,3 bilhões tinham sido empenhados (“contratados”) até 30 de junho e R$ 2 bilhões haviam sido pagos. No ano passado, auge da crise econômica que o país enfrenta, a PRF teve R$ 3,4 bilhões em despesas pagas.

Já no caso da Polícia Federal, que é responsável também pela condução de parte das investigações da Operação “Lava Jato”, dos R$ 7,1 milhões autorizados para o ano, somente R$ 3,6 milhões haviam sido empenhados até 30 de junho e R$ 3 bilhões pagos. Nesta semana, o governo inclusive pediu reforço de R$ 102,4 milhões ao Congresso para que a emissão dos passaportes pela entidade seja regularizada, após a paralisação do serviço ter sido alardeada.

Prioridade
O professor de finanças públicas do Ibmec, Thiago Borges, lembra que desde que a Emenda Constitucional 86 (do chamado orçamento impositivo) foi aprovada em 2015, o governo federal é obrigado a liberar até 1,2% da receita corrente líquida do ano anterior para emendas parlamentares.
A grande questão, reforça, é que o chefe do Executivo tem o poder de escolher qual o melhor momento do ano para fazer a liberação do recurso. E, como as contas do governo sugerem, do ponto de vista contábil, este não seria o momento mais oportuno.

“É uma decisão política se esses recursos devem ser liberado nesse momento. Isso acaba levando a questionamentos, como se seria a melhor decisão liberar o recurso das emendas agora, dado que outras áreas passam por dificuldades? Não seria mais adequado esperar outro momento do ano”, avalia.

 Corte de verba do Dnit pode comprometer manutenção de rodovias

Outro setor que enfrenta dificuldades na execução orçamentária é o Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (DNIT). Em 2016, o órgão responsável pela manutenção de estradas federais teve R$ 7,2 bilhões empenhados e R$ R$ 3,8 bilhões pagos. Neste ano, os valores caíram para R$ 6,3 bilhões e com R$ 1,5 bilhão, respectivamente, pagos até 30 de junho.

As prefeituras também, que sofrem com a escassez de recursos, continuam esperando o aumento dos repasses pelo governo federal. Nos últimos anos, prefeitos têm cobrado de forma recorrente reajustes dos repasses de para programas executados em parcerias com a União, em áreas como saúde, educação e assistência social.

O presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Julvan Lacerda (PDMB), prefeito de Moema, dá como exemplo o caso do Programa Saúde da Família (PSF). Ele afirma que o Ministério da Saúde repassa, em média, R$ 11 mil por mês para cada equipe do programa – que envolve um médico, enfermeiros e agentes de saúde. No entanto, na prática, o custo da manutenção da equipe chega a R$ 30 mil, sendo a diferença coberta pelo município, com o valor podendo ser ainda maior, nos casos de cidades mais distantes, nas quais os salários dos médicos tendem a ser maiores.

“Um município de pequeno porte tem cerca de três equipes no PSF e a gente acaba tendo que cobrir 2/3 do valor de um programa que, apesar de fundamental, foi pensando pela União. Já vem de muito tempo a defasagem e os municípios não têm conseguindo honrar seus compromissos”, enfatiza Julvan.

Outro exemplo clássico lembrado pelo prefeito é o da merenda escolar, que custa, em média, R$ 4 por aluno, por dia, mas que os municípios recebem apenas, R$ 0,36 diários por aluno.

Como aponta Thiago Borges, do Ibmec, a decisão do governo em priorizar a liberação das emendas parlamentares, faz com que ações fragmentadas, definidas pelos parlamentares, ganhem força, ante a possibilidade de mudanças em políticas públicas mais estruturais.
 

Suplementação orçamentária para passaporte é adiada


BRASÍLIA – O presidente do Congresso, Eunício Oliveira (PMDB-CE), afirmou ontem que a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e da autorização de crédito suplementar para a emissão de passaportes deverá ocorrer apenas na semana que vem. Segundo ele, a ideia é que uma sessão do Congresso seja convocada para o dia 13. Ele não descarta, porém, deixar para o dia 17, véspera do recesso parlamentar.

“Se a LDO ficar pronta, e o presidente da comissão disse que é possível, até o dia 13, farei no próprio dia 13. Senão, vou convocar uma reunião do Congresso para o dia 17 pela manhã para que a gente possa resolver essa questão dos passaportes da PF (Polícia Federal) e também a LDO”, afirmou.

O senador disse ter conversado ontem com o presidente da Comissão Mista do Orçamento, senador Dalírio Beber (PSDB-SC), e com o relator da LDO, deputado Marcus Pestana (PSDB-MG), para tentar antecipar a votação. Pelo calendário inicial da comissão, a LDO só estaria pronta para ser votada a partir do dia 14.

Reforço
O Projeto de Lei 8, enviado pela Presidência da República, reforça o orçamento da PF em R$ 102,4 milhões para garantir as emissões de passaportes até o fim do ano. Para conseguir a verba extra, deverão ser usados recursos reservados para o pagamento de convênios do Brasil com organismos internacionais.

Esse ponto de origem do dinheiro foi escolhido depois da repercussão negativa provocada pela proposta original do governo, que era tirar recursos do Ministério da Educação (MEC).

Remanejamento
Pelo projeto inicial, seriam remanejados R$ 34,4 milhões da área administrativa do MEC e R$ 68 milhões do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

O relator da matéria, deputado Fernando Franceschini (SD-PR), e o presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), senador Dário Berger (PMDB-SC), pediram ao Ministério do Planejamento que indicasse outra fonte de recursos.

A suspensão da emissão de passaportes afeta cerca de 10 mil pessoas por dia, conforme informou a PF, considerando o número médio de pedidos. O órgão mantém os agendamentos e o serviço nos postos de atendimento de todo o país, mas não tem previsão de entrega.
Agência Estado

 

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