Pelo menos oito em cada 10 empresas em Minas operam com alguma irregularidade

Felipe Boutros
fboutros@hojeemdia.com.br
21/09/2017 às 20:37.
Atualizado em 15/11/2021 às 10:40
 (Maurício Vieira)

(Maurício Vieira)

 A burocracia nas mais diferentes esferas da administração pública são uma grande e insistente pedra no caminho dos empreendedores mineiros. De acordo com relatório da Endeavor, organização para o fomento do empreendedorismo, 86% das empresas brasileiras operam hoje com pelo menos uma irregularidade. Em Minas, mais de 84% das empresas sofrem desse o mal.

No indicador que analisa o percentual das empresas com alguma irregularidade em relação às obrigações municipais, das capitais analisadas, Belo Horizonte é a única que teve piora: em 2016, era a capital com menor índice de empresas com irregularidades na prefeitura (42,4%). Neste ano, entretanto, com 51,6%, ficou em quarto lugar em um ranking de sete cidades.

São classificadas como irregularidades falhas no preenchimento de fichas e documentos ou impostos não recolhidos.
“A gente percebe que tem uma série de entraves que o empreendedor acaba enfrentando no Brasil. Ele quer gerar emprego e renda, mas é como se ele corresse com um elástico na cintura. Hoje, o empresário gasta 85 por dias do ano resolvendo pendências burocráticas”, diz a coordenadora da Endeavor em Minas Gerais, Júlia Ribeiro.

Via sacra

A burocracia começa antes mesmo de abrir a empresa. Hoje, no Brasil, são gastos, em média, 80 dias em procedimentos como obtenção de alvarás e registros na junta comercial, entre outros. A mesma morosidade se estende ao fechamento. A pesquisa levantou que hoje existem 3,7 milhões de CNPJs “zumbis” no país, que representam quase 20% do total. Eles são ativos na Receita Federal, porém sem atividade efetiva. Em Minas, são 12,2 mil cadastros “mortos-vivos”.

Segundo Júlia, as irregularidades mostram a dificuldade do empresário em acompanhar as diversas mudanças que são feitas na legislação tributária.

Alterações

No Estado, entre 2013 e 2017, foram feitas 157 alterações na legislação do ICMS. Só em 2016, foram mais de 40. Em Belo Horizonte, foram 42 alterações no ISS nos últimos quatro anos, o dobro da média nacional, de acordo com a Endeavor.

“É necessário que haja uma simplificação dos processos. Isso ajudaria nos custos do empreendedor, que poderia reverter isso em mais geração de renda, impostos e empregos. É necessário que os gestores públicos coloquem essa discussão como uma prioridade”, diz a coordenadora da Endeavor.

O secretário-adjunto de Desenvolvimento Econômico de Belo Horizonte, Bruno Miranda, acredita que o número de irregularidades junto à prefeitura possa ter crescido devido a uma fiscalização mais rigorosa. Mas ele admite que é necessário melhorar o ambiente de negócios na capital.

“A gente sabe da necessidade do município desburocratizar. Estamos desenvolvendo, junto com o Sebrae e a Junta Comercial, a Sala Mineira do Empreendedor, no qual os sistemas da prefeitura e do Estado serão integrados para facilitar a vida de quem quer empreender”, diz Miranda, sem especificar uma data para o lançamento.

 Empresário precisa preencher, na média, 24 fichas sobre ISS

Além da mudança constante na legislação dos impostos, as empresas precisam cumprir normas para comprovar que o pagamento e as exigências legais estão corretos.

Para cumprir as obrigações acessórias municipais, que são relacionadas ao ISS, uma empresa optante pelo Simples Nacional precisa preencher, na média, 24 fichas de informações complementares para fiscalização. No caso das estaduais, que dizem respeito ao ICMS, são necessárias, em média, outras 24 fichas. Qualquer deslize no cumprimento das obrigações pode gerar multas.

Na Rock Content, startup de Belo Horizonte, a emissão de notas fiscais junto ao sistema da prefeitura está criando uma dor de cabeça. O diretor financeiro da empresa, Marcelo Freitas, acredita que irá gastar mais 15 dias para ter uma solução completa.

“Para abrir a empresa já é uma dificuldade. Depois, para mantê-la, tem que recorrer a serviços específicos de contabilidade e despachantes para resolver pendências que você nem sabe que poderiam aparecer. As informações são desencontradas, tem gente que propõe solução que não é viável. O emaranhado fiscal dificulta a solução do problema e não nos permite fazer o serviço, faturar e gerar impostos. É uma cadeia improdutiva”, lamenta o executivo.

Mas o que é problema para uns, pode ser oportunidade de negócio para outros, já que a burocracia vai além do recolhimento de impostos. A DM Sistemas aproveitou a falta de regras em comum nos sistemas de vales-transporte entre os municípios e criou uma interface que automatiza a recarga de créditos do transporte público.

Segundo os sócios Carlos Bernardo Mascarenhas e Délio Lázaro, o sistema proporciona uma economia de até 40% para empresas que gastam, em média, R$ 100 mil com o benefício. “Como cada município tem uma regra para as operadoras de transporte público, elas gastavam muito tempo e recurso gerenciando esse setor. Com a ferramenta, a interface é unificada. Tanto faz se a operadora de transporte é de Betim, BH ou Contagem, por exemplo”, diz Mascarenhas.


ALÉM DISSO

No interior do Estado, empreendedores também enfrentam problemas com a burocracia. O site Chico Rei, comércio eletrônico especializado em camisetas, enfrenta dificuldade para aprovar a construção da nova sede da empresa. O processo já se arrasta há três anos, o que levou o fundador do site, Bruno Imbrizi, a começar as obras sem toda a documentação necessária, já que a morosidade estava impactando a produtividade.

“Nos últimos anos, diversos setores da prefeitura foram acionados, nenhum com eficiência. Por isso mesmo começamos a construção do prédio sem a aprovação completa. Caso contrário, ficaríamos sem um local para a produção em 2016. Nos últimos três anos, já perdi quase um mês de trabalho apenas no processo de aprovação da obra”, diz Imbrizi.

Em uma situação oposta, a Rocca, produtora de doce de leites de Pouso Alegre, teve o seu negócio acelerado graças ao incentivo do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), que, por meio de um programa de incentivo, certificou seus produtos a nível estadual em um prazo menor do que o habitual.

“Conseguimos vender o doce de leite para duas grandes redes varejistas de Belo Horizonte. As vendas, hoje, representam 40% do nosso faturamento”, afirma Raphael Figueiredo, sócio do empreendimento.

  

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