Leréia reafirma amizade com Cachoeira e diz que troca de favores é normal

Isabela Vilar e Anderson Vieira - Agência Senado
10/10/2012 às 07:32.
Atualizado em 22/11/2021 às 01:58
 (Pedro França/Agência Senado)

(Pedro França/Agência Senado)

Em depoimento à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Cachoeira, o deputado Carlos Leréia (PSDB-GO) voltou a confirmar sua amizade com o principal investigado pela comissão, Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, preso em operação da Polícia Federal. Leréia negou ter conhecimento sobre os negócios ilegais do empresário goiano, acusado de comandar uma organização criminosa, mas confirmou ter trocado favores com ele, o que, na opinião do deputado, "é prática comum".

"Fazer favor para os outros e receber favor faz parte do meu cotidiano e do meu meio de vida, o que eu não escondo", afirmou.

Entre os favores confirmados pelo deputado estão nomeações a pedido de Cachoeira e orientações para a obtenção de visto para os Estados Unidos. Cachoeira, por outro lado, teria emprestado dinheiro a Leréia, além de ter emprestado ao deputado um rádio Nextel que teria sido usado em viagem aos Estados Unidos.

Leréia negou ter conhecimento das atividades ilegais de Cachoeira. O deputado lembrou que o amigo explorava jogos legais em Goiás, o que justificaria seus ganhos. Além disso, lembrou que o amigo é dono de um laboratório, o que também justificaria o dinheiro que possui. Questionado por integrantes da CPMI, Leréia afirmou que não é sua função denunciar “banca de jogo”.

Sobre a empreiteira Delta Construções, apontada pela PF como envolvida no esquema de Cachoeira, Carlos Leréia afirmou ter se encontrado várias vezes com o amigo na sede da construtora, que teria se tornado local de trabalho de Cachoeira depois de este separar-se de sua primeira mulher, Andréa Aprígio. Leréia, no entanto, disse achar normal a presença do amigo no escritório, já que ele era "bem relacionado".

"Não achei estranho ele estar com escritório na Delta, visto que sempre foi uma pessoa relacionada com meio-mundo: gente da Justiça, das artes, do empresariado. Carlinhos não era clandestino, não vivia na clandestinidade. Certa vez, até perguntei que negócios ele mantinha com a Delta, mas ele não quis me responder e não insisti", afirmou.

O deputado afirmou ser amigo de Cachoeira desde a década de 1980 e manter contato com sua família. Carlos Leréia afirmou nunca ter escondido a relação de amizade o principal investigado da CPMI e disse que erros de Cachoeira não acabariam com a amizade.

"Mesmo que ele tenha cometido erros, não deixarei de ser amigo dele. Se falhou, vai ter que responder, mas não vai deixar de ser meu amigo", completou.


Favores

O depoente também negou ter recebido dinheiro de Cachoeira, uma das acusações feitas a ele. Segundo o relator da CPMI, as gravações indicam o recebimento de valores pelo deputado. Na versão de Leréia, Cachoeira lhe emprestou dinheiro para saldar um financiamento rural. O valor seria pago quando recursos do deputado bloqueados pela Jjustiça fossem liberados, o que ainda não ocorreu.

"Até hoje não liberaram meu dinheiro e o dia em que liberarem e em que o Carlinhos sair da cadeia, vou pagar. Devo a ele R$ 120 mil, que ele me passou parcelados, conforme eu estava precisando", disse o deputado, que garantiu ter incluído em seu Imposto de Renda a informação sobre o empréstimo.

O deputado declarou, ainda, que Cachoeira intermediou um empréstimo com um empresário chamado Michel, da cidade de Anápolis. Os R$ 200 mil já teriam sido pagos pelo deputado.

Leréia é suspeito, ainda, de ter recebido de Cachoeira um telefone Nextel, usado também por integrantes da organização para evitar grampos. Segundo o deputado, há, em seu nome, cinco aparelhos da operadora, usados por ele e por funcionários em Brasília e Goiânia para economizar nas tarifas. O aparelho de Cachoeira, segundo Leréia, teria sido emprestado pelo amigo para uso durante uma viagem aos Estados Unidos e devolvido pouco tempo depois.

O deputado também negou ter beneficiado empresas de Cachoeira com emendas parlamentares.

"Quem sou eu, deputado de oposição, para direcionar uma emenda para quem quer que seja?" questionou, antes de afirmar que Cachoeira nunca pediu nada a ele, a não ser empregos para conhecidos, o que, segundo Leréia, é "prática comum".

Um dos pedidos teria sido atendido. Segundo o deputado, a pessoa indicada a pedido de Cachoeira ganha salário de R$ 2 mil. Além disso, Leréia afirmou ter solicitado ao governo, a pedido de Cachoeira, a manutenção de outra pessoa no emprego que já ocupava. Também houve um pedido de aumento de salário para outro servidor, o que, segundo o deputado, ainda não teria sido atendido.

O deputado disse ainda que abriria à CPMI seus sigilos fiscal, bancário e telefônico.


Polícia

Outra suspeita que paira sobre o deputado é de que ele teria avisado Cachoeira sobre uma operação policial que seria deflagrada. Leréia também negou a acusação. Segundo o deputado, na conversa gravada pela Polícia Federal, ele falava com Cachoeira sobre uma ameaça de morte que teria recebido. Leréia disse ter ficado sabendo pelo delegado Marcos Martins que alguém queria tirar sua vida. Depois disso, teria ligado para o amigo para pedir sua ajuda na "busca pela verdade".

O depoimento foi questionado por deputados como Íris de Araújo (PMDB-GO) e Dr. Rosinha (PT-PR), que disseram considerar improvável que o deputado não soubesse das atividades ilegais de Cachoeira. Já aliados de partido, como o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), elogiaram as explicações e a disposição do deputado de comparecer à CPMI.

"Vossa Excelência respondeu de forma sincera, objetiva e não deixou a menor dúvida", afirmou.

Para Sampaio, o fato de Leréia ser amigo de Cachoeira não quer dizer que tinha conhecimento das ilegalidades. Como exemplo, citou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, apesar da amizade com acusados pelo mensalão, disse não ter conhecimento das práticas criminosas.

"Quero usar esse exemplo porque, à época, a relação de amizade não nos fez concluir, na CPMI [dos Correios], que o presidente Lula tivesse qualquer conhecimento, quando a amizade era existente, evidente e notória", afirmou Sampaio.

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