Vantagem do álcool em relação à gasolina pode superar 70%

Heraldo Leite
hleite@hojeemdia.com.br
19/01/2018 às 22:31.
Atualizado em 03/11/2021 às 00:52
 (LUCAS PRATES)

(LUCAS PRATES)

À frente de três entidades que reúnem o tripé bioenergia, etanol e açúcar, o economista Mário Ferreira Campos Filho é um dos mais atuantes defensores do uso dos biocombustíveis – em especial o etanol, ou álcool combustível – como alternativa econômica e por razões ambientais. Ele sustenta que a que a relação entre o preço da gasolina e do etanol pode ser superior aos 70% usados como referência para comprovar a vantagem do álcool combustível. Segundo ele, dependendo do modelo do automóvel esta relação pode chegar a 75% o que torna o etanol ainda mais vantajoso que a gasolina. 

Presidente da Associação das Indústrias Sucroenergéticas de Minas Gerais, do Sindicato da Indústria de Fabricação do Álcool do Estado de Minas Gerais e do Sindicato da Indústria do Açúcar no Estado de Minas Gerais, Mário Campos tem mais de uma década de dedicação e envolvimento com o setor. Entusiasta dos biocombustíveis, sustenta que o incremento deste setor, além de diminuir a emissão de gases poluentes, impulsionará um segmento que tem peso significativo na economia mineira: em todo Estado são 34 unidades que geram 180 mil empregos diretos e indiretos. Estas unidades estão instaladas em 26 municípios e atingem outros 130 municípios.

Com a sanção do presidente Michel Temer, no final do ano passado, do projeto que cria a Política Nacional de Biocombustíveis – conhecida como RenovaBio – o setor vislumbra grandes mudanças, já que a nova política contempla o incentivo à produção de biocombustíveis, o cumprimento das metas do Acordo de Paris, além de conferir regras mais claras: a chamada previsibilidade para o mercado. 

Nesta entrevista, Mário Campos fala sobre as perspectivas do setor sucroalcooleiro para o ano de 2018.

Com os constantes reajustes da gasolina, o etanol tem se tornado mais vantajoso para o consumidor e mais rentável para as indústrias do que o açúcar? 
Em Minas Gerais, na primeira semana de janeiro a diferença média entre os preços da gasolina e do etanol era de 70,5%, ou seja, no limite. Mas frisamos que cada veículo flex tem uma tecnologia embarcada e cada motorista tem uma forma de dirigir. E os veículos hoje têm um selo do Inmetro que estima o consumo, como se faz em geladeiras, por exemplo. E o consumidor pode ter surpresas ao fazer as contas. No ano passado o Instituto Mauá, de São Paulo, pegou quatro veículos de categorias diferentes – popular 1.0 e 1.6, utilitário, e sedã médio – e fez testes de campo em que ficou comprovado, efetivamente, que a relação de consumo é maior do que aquela que o fabricante está anunciando. 

E por que isso?
Por dois motivos. O primeiro: quando o fabricante faz os testes para o selo Inmetro, ele utiliza uma gasolina com 22% de mistura de álcool anidro. Enquanto que na bomba esta mistura é de 27%. Esta diferença altera a relação. Estes 70% divulgados como ideais você encontra numa questão química. Mas, com a evolução dos motores, da forma de dirigir e com a mistura da mistura a relação as coisas ficaram diferentes. Então a relação econômica de se colocar o combustível pode chegar a 75%. O importante é que o consumidor conheça seu carro. Não estou dizendo que todos os modelos vão chegar a 75%. Mas é melhor o motorista prestar atenção e fazer os cálculos.

O mercado oscila muito. Quando, por exemplo, o preço do açúcar cai no mercado internacional o etanol passa a ser mais atraente e vice-versa. As indústrias conseguem acompanhar estas oscilações, optando por um ou outro produto?
A capacidade de produção das usinas que chamamos de mistas é dada por sua capacidade de moer cana e da fábrica internalizar essa sacarose que vai virar açúcar ou o etanol. Dificilmente temos uma planta que tem uma flexibilidade muito grande. O quadro que temos é que aqueles que são muito açucareiros conseguem destinar em torno de 65% para a produção de açúcar e 35% para o etanol. Mas há algumas indústrias que produz meio a meio e outras com maior produção de etanol. Nós temos vários modelos de negócio: empresas voltadas para a exportação, empresas com atuação no mercado interno e usinas que vendem açúcar para outras marcas. Existe flexibilidade, mas ela não é tão relevante o quanto a opinião pública acha.

Como o setor avalia a mudança na política de preços da Petrobras para os combustíveis? 
Nós sofremos muito, principalmente no primeiro mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, quando houve interferência no mercado. Há dez ou 12 anos nós crescemos, houve uma alta nos preços do petróleo e o mundo começou a se preocupar mais com a questão ambiental e os biocombustíveis começaram a aparecer como alternativa. E naquele momento se pensou que o Brasil seria um grande produtor e exportador de bicombustíveis. Mas durante este período houve uma grande interferência na Petrobras, principalmente na precificação. Obviamente que se o nosso competidor - a gasolina – tem seu preço artificialmente mantido, os concorrentes ficam prejudicados. O setor cresceu e triplicou durante pelo menos oito anos e aí vem a maior empresa do país, manteve preços constantes, e a gente não consegue ter rentabilidade. Seja para pagar o investimento, seja para cobrir os custos de produção. O que aconteceu é que entramos numa espiral de dificuldades financeiras e houve uma quebradeira geral no setor. Em todo o Brasil foram fechadas 80 usinas – 11 no estado de Minas Gerais.

Foi o período em que os Estados mexeram nas alíquotas do ICMS?
Em 2004, São Paulo tinha reduzido o ICMS do etanol hidratado de 25% para 12%. Então nós, naquela época, chamamos o governo do Estado, colocamos que nós tínhamos investido e acreditado no mercado de Minas Gerais e não encontrávamos aqui no Estado mercado para nosso produto. Enquanto isso, nosso concorrente que era a gasolina, era produzido aqui na Regap (Refinaria Gabriel Passos, em Betim), mas Minas não tem petróleo. Então estávamos perdendo oportunidade de consumir um produto que estava sendo produzido aqui dentro do Estado. 

Também foi neste período em que no Sul de Minas e Triângulo era mais barato sair de Minas e ir abastecer no interior de São Paulo. Hoje como estão as alíquotas do ICMS? 
Hoje é de 16% no etanol e 31% para gasolina. A diferença de alíquota, que são 15 pontos percentuais, é a maior do país.


E este referencial é bom?
Excelente. Obviamente que nós queríamos alíquotas mais baixas. A parcela de imposto dentro do preço de combustíveis ela é muito significativa. Vou dar um exemplo, no caso do etanol, o preço ao produtor comparado com o preço de bomba, ele é apenas 55% do preço final. Se você está pagando R$3 por litro de etanol, o produtor só está recebendo 55% daquilo. O restante é logística, tributos estaduais e federais, repasses ao distribuidor e margens dos postos de combustíveis.

O segmento sempre se empenhou pela aprovação da RenovaBio, que tem agora seis meses para ser regulamentado. O que esperar daqui para diante?
Devemos ter um comitê gestor que vai definir as diretrizes. Um dos propósitos do RenovaBio é diminuir o uso dos combustíveis fósseis e aumentar a produção e o consumo de combustíveis limpos e renováveis. Então aumentar a participação dos biocombustíveis nos próximos anos você resolve uma série de problemas. Primeiro: você reduz a dependência externa de combustíveis. Segundo: você cumpre o acordo climático. Terceiro: você promove o desenvolvimento regional, pois a produção de biocombustíveis está no interior do país.
 

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