Venda de terrenos suspeita de lesar Estado em R$ 42 milhões

Tatiana Moraes
tmoraes@hojeemdia.com.br
05/05/2017 às 21:17.
Atualizado em 15/11/2021 às 14:25

A Controladoria Geral do Estado (CGE) cobra R$ 42,8 milhões de oito empresas suspeitas de enriquecimento ilícito e de causar prejuízo ao desenvolvimento industrial de Minas e danos aos cofres públicos. Elas teriam comprado 18 terrenos a preço de custo da Companhia de Distritos Industriais (CDI), hoje Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig), superfaturado os valores e revendido as terras ou usado as áreas para quitar grandes dívidas, segundo a conclusão de uma auditoria da CGE a que o Hoje em Dia teve acesso com exclusividade.

Conforme contrato de venda da Codemig, as áreas deveriam ser transformadas em Distritos Industriais para fomento da economia estadual, o que não ocorreu. A maioria dos terrenos acabou invadida.

Dois dos 13 terrenos supostamente comercializados de forma ilegal foram ocupadas por famílias sem teto. As áreas abrigam as ocupações Irmã Dorothy e Eliana Silva

A CGE chegou às informações após denúncia da Organização não Governamental (ONG) Brasil Legal. As oito empresas que, segundo a CGE, teriam enriquecido ilicitamente foram Construtora Ourívio S/A, Mecominas Construções Ltda, Mecominas Mecanização e Empreendimentos Ltda, Banco Pottencial S/A, Parr Participações Ltda., Cetibrás Ltda, Géo Agropecuária Ltda. e Construtora RTM Ltda. Algumas sequer existem mais.

No mapa
Os terrenos estão localizados em Santa Luzia e no bairro Jatobá, no Barreiro, na capital. Eles foram adquiridos entre 1999 e 2002. Os valores, que hoje ultrapassam R$ 42 milhões, foram atualizados até 2015.

No ano seguinte, uma auditoria foi publicada pela CGE. “A partir da análise dos 19 processos de alienação constatamos que 18 imóveis foram transferidos a terceiros, com interveniência da CDI/Codemig, sem o cumprimento do objeto e de obrigações previstas nos instrumentos pactuados”, diz a auditoria.

Destino
De acordo com o relatório, 15 terrenos foram oferecidos como pagamento de dívidas junto a bancos. Outros três foram vendidos a construtoras de imóveis residenciais. Um último permaneceu sem uso pelo comprador e foi desapropriado em 22 de setembro de 2008 pela Prefeitura de Belo Horizonte.

“As dações em pagamento e a venda dos imóveis pelos adquirentes, com consentimento expresso da CDI/Codemig, configuraram ‘desvio de finalidade’, uma vez que os objetivos estatutários que fundamentaram a alienação não foram atingidos. Tais procedimentos consubstanciaram-se, exclusivamente, em vantagem financeira às empresas adquirentes para quitação de dívidas próprias ou de terceiros junto a credores”, afirma o texto.

Dos 19 terrenos que eram do Estado e deveriam ser utilizados para atrair empresas para fomentar a economia e, inclusive, criar empregos, três estão vazios. Outros cinco têm uso residencial. Dois foram desocupados para construção de Unidade Municipal de Educação Infantil (Umei). Quatro foram invadidos. Em dois, funcionam as ocupações Eliana Silva e Irmã Dorothy. Três são destinados a uso comercial.

Em outro caso semelhante, a Codemig é suspeita de lesar o Estado em R$ 117,2 mil

Empresas se recusam a prestar esclarecimentos

Das oito empresas citadas no relatório da Controladoria Geral do Estado, quatro têm o mesmo número de telefone: Construtora Ourívio, Mecominas Construções, Géo Agropecuário e Mecominas Mecanização e Empreendimentos. Elas não responderam aos pedidos de esclarecimentos feitos pelo Hoje em Dia.
Na primeira ligação, uma pessoa se identificou como Geisa e desligou o telefone sem prestar informações. Na segunda tentativa, ela riu quando a reportagem insistiu em ouvir as empresas. Foi deixado o contato do jornal, mas, até o fechamento desta edição, não houve resposta.

A reportagem não conseguiu falar com responsáveis pela Cetibras, Construtora RTM e Parr Participações. O Banco Pottencial não retornou às ligações.Por meio de nota, a Codemig informou “que está tomando as medidas necessárias para o devido atendimento do caso”.Flávio Tavares / N/A

Terreno ocupado por famílias foi negociado pelo governo e serviu para enriquecer empresas, segundo a CGE

De novo
Outra venda de terreno irregular é suspeita de ter sido concluída pela Codemig em 2005, quando o órgão era presidido por Oswaldo Borges, acusado na “Lava Jato” de operar dinheiro ilegal para o senador Aécio Neves (PSDB), conforme mostrou o Hoje em Dia na edição do último dia 21 de abril.

Pela comercialização da área, que hoje abriga a ocupação Camilo Torres, com ce[/TEXTO][TEXTO]ntenas de famílias, o Ministério Público (MP) cobra dele a quantia de R$ 117.181,01 (sem correção) como forma de ressarcimento ao erário.

Segundo o MP, em 1992 o terreno de 9,5 mil metros quadrados foi vendido à Borvultex Comércio e Indústria. Na ocasião não houve licitação ou avaliação prévia, embora já houvesse exigência.

“A supracitada venda contrariou o disposto pelo caput do artigo 18 da Constituição Estadual de 1989 que, à época, já exigia procedimento licitatório para a alienação de bens imóveis”, diz texto do Ministério Público.

A área pertencia à Companhia de Distritos Industriais de Minas Gerais (CDI), que em 2003 se transformou em Codemig. Criar um Distrito Industrial no local era condição contratual para que os terrenos fossem comercializados. O objetivo era promover a atração de indústrias a Minas Gerais, o que não ocorreu, conforme a Promotoria.

Em 2004, por esse motivo, o Estado entrou com ação pedindo devolução do imóvel. Em junho de 2005, o então presidente da Codemig, Oswaldo Borges, validou o contrato e permitiu que o terreno fosse novamente vendido a outra companhia: a Vitor Pneus.

A transação foi concluída por um preço inferior ao do mercado, conforme análise do MP. Segundo os documentos, o valor venal do imóvel, que é utilizado para pagamento de IPTU e normalmente é inferior ao valor real, era de R$ 232.203,00. A venda, no entanto, foi concluída por R$ 141.817,80.

“Considerando a diferença entre o valor venal atribuído ao imóvel à época e o valor pago pela empresa adquirente, é evidente o flagrante prejuízo financeiro causado aos cofres públicos”, diz o MP na ação. Oswaldo Borges não foi encontrado para esclarecer a ação. As empresas não quiseram comentar. O senador Aécio Neves nega qualquer envolvimento em questões apuradas pela “Lava Jato”.

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