Receita muda tributação das startups e setor teme fuga de talentos e investidores

Felipe Boutros
fboutros@hojeemdia.com.br
Publicado em 01/08/2017 às 21:15.Atualizado em 15/11/2021 às 09:52.
 (Maurício Vieira)
(Maurício Vieira)

O futuro das startups no Brasil e em Minas Gerais, estado celeiro desse tipo de empreendimento com mais de 600 delas em operação, pode estar seriamente comprometido. Essa é a leitura que integrantes do setor da tecnologia fazem após a Receita Federal, por meio da Instrução Normativa nº 1719/2017, determinar que os rendimentos de aportes feitos nesse tipo de empreendimento estarão sujeitos ao imposto de renda. As alíquotas variam de acordo com o tempo em que o investimento for mantido e variam de 22,5% – para prazos inferiores a 180 dias – a 15% – para os superiores a 720 dias.

Cassio Spina, presidente da Anjos do Brasil, entidade formada por investidores-anjo, vê a medida como um retrocesso. “Tributar uma startup é um contrassenso. Já temos muita dificuldade para conseguir investimento para o setor”,diz.

Desequilíbrio

Segundo ele, há um desequilíbrio quando comparamos com outros investimentos, tais como fundos de investimento imobiliário, cujos rendimentos, e até ações listadas na Bolsa. “Papéis de empresas com faturamento até R$ 400 milhões tem isenção de imposto sobre ganho de capital”, afirma.

Para Spina, tributar o investimento na pequena empresa inovadora que está começando é no mínimo desproporcional. Segundo números da consultoria Grant Thornton, divulgados pela Anjos do Brasil, cada R$ 1 investido em uma startup gera R$ 2,50 em tributos, além de empregos qualificados e renda para a sociedade.

O gestor da Pillow Aceleradora, em Belo Horizonte, Pedro Almeida, diz que o investimento-anjo é de alto risco e pode não compensar para quem tem capital disponível.
“A regulamentação é extremamente desfavorável para o mercado. Taxar um investimento desse no Brasil, onde deixar o dinheiro parado no banco já gera uma boa renda, diminui o incentivo. Pode valer muito mais a pena investir em tesouro direto, por exemplo”, explica. Segundo ele, as novas regras podem, inclusive, matar o empreendedorismo.

O investidor-anjo João Paulo Zica Fialho também lamenta a medida. “Acaba desestimulando. A gente já enfrenta a crise financeira, e começa a direcionar nossos investimentos para um negócio de risco, como startups. E agora ele começa a ser tributado?”, questiona. Fialho explica que o risco é alto, mas o ganho pode ser proporcional. “Se o negócio deslanchar, é bem rentável. Estávamos indo com um certo apetite, mas vamos dar uma freada”, diz.


Celeiro, Minas pode sofrer com falta de investimentos

De acordo com o levantamento “Global Accelerator Report” foram investidos globalmente, no ano passado, quase US$ 210 milhões (R$ 653 milhões) em 11.681 startups. Desse total, o Brasil foi responsável por US$ 4,3 milhões (R$ 13,3 milhões), o sétimo no ranking mundial, atrás de países como Chile, Espanha e México. Os Estados Unidos são os campeões com US$ 107,8 milhões (R$ 335,25 milhões).

600 startups estão em atuação em Minas. O Estado é um dos celeiros desse tipo de empreendimento

“Ainda temos muito o que crescer”, afirma o CEO da FCJ Participações, Paulo Sergio Justino, destacando a vocação de Minas Gerais para esse tipo de empreendimento. “Tem muita gente de fora vindo para cá . É um movimento bem legal. Temos boas universidades, um aparato muito grande de gente por aqui”, explica Justino.

De acordo com o subsecretário de Ciência, Tecnologia e Inovação de Minas Gerais, Leonardo Dias, hoje são aproximadamente 600 startups no Estado. Ele explica que um censo está sendo elaborado para dar um panorama mais detalhado do setor.

O gestor da Pillow Aceleradora, Pedro Almeida, concorda que Minas e Belo Horizonte têm uma vocação muito grande, com mão de obra muito qualificada, mas alerta que a capital está perdendo espaço para Recife e Florinópolis. “Está perdendo nos investimentos pelo conservadorismo financeiro característico dos mineiros. Várias startups deram muito certo, mas a gente tem dificuldade com essa parte financeira”, diz.

Consequência

A taxação sobre o retorno dos investimentos pode ser danoso para o setor no Brasil e em Minas, já que pode provocar uma fuga de talentos. “O investimento-anjo é de alto risco. Por isso a tributação tem que ser revista. A obtenção de capital, hoje, é o grande gargalo para as startups. Teremos uma grande migração de talentos do nosso país”, diz o subsecretário Leonardo Dias.

O presidente da Anjos do rasil, Cassio Spina, é ainda mais pessimista sobre a fuga de talentos. “Isso já acontece. Com essa falta de estímulo, o cenário vai permanecer como está, enquanto vários países tem uma cultura de investimentos. No Reino Unido, por exemplo, além das isenções, pode-se compensar até 50% do investimento no imposto devido”, diz

Paulo Sérgio Justino, da FCJ Participações, vê a medida como desestimulante. “Se em algum momento no futuro o Brasil quiser ser grande, ele terá que derrubar essa carga tributária”, alerta.

O empreendedor Felipe Magalhães, por exemplo, conseguiu investimento no Chile antes do Brasil. Só depois de muita batalha conseguiu o aporte aqui, no Seed, programa de aceleração do governo do Estado, quando lançou o site MelhorPlano (melhorplano.net) no qual usuários podem comparar planos e combos de telefone, internet e TV.

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