
Uma colaboração entre três Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) da Fapesp – o Centro de Pesquisa em Biologia de Bactérias e Bacteriófagos, o Instituto Paulista de Resistência aos Antimicrobianos e o Centro de Pesquisa em Alimentos – resultou na descoberta de 62 novos tipos de fagos, como são chamados os vírus que infectam bactérias.
Esses achados abrem caminho para o desenvolvimento de estratégias de controle biológico contra bactérias de interesse médico e industrial, como aquelas responsáveis por infecções hospitalares ou contaminações em alimentos.
O projeto foi liderado por Julio Cezar Franco, docente da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e pesquisador-colaborador no Cepid B3. Contou com a parceria da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) e do Zoológico de São Paulo.
O trabalho, que se estendeu por um ano, é fruto da iniciativa de Franco. Durante período sabático, afastou-se de suas atividades no campus de Diadema da Unifesp e dedicou-se às bancadas do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (IQ-USP), onde está sediado o Cepid B3, trabalhando em parceria com a professora Aline Maria da Silva (1959-2024).
As primeiras amostras de fagos e bactérias vieram do Cepid ARIES, sediado na Unifesp, e da Cetesb, agência estadual responsável pelo controle e monitoramento de atividades geradoras de poluição em São Paulo.
“Eu conversei com a Ana Gales, vice-coordenadora do ARIES, e ela me colocou em contato com Maria Inês Sato, gerente de Laboratórios de Análise Ambiental da Cetesb. A agência coleta amostras periódicas nas estações de tratamento de esgoto da Grande São Paulo, onde é possível encontrar diversos fagos com capacidade para infectar bactérias intestinais, por exemplo. Já as amostras cedidas pelo ARIES eram provenientes de locais diversos, como aeroportos e hospitais”, conta.
Em seguida, o pesquisador firmou colaboração com o Zoológico de São Paulo, que cedeu amostras de compostagem. E uma nova frente de cooperação foi estabelecida com o Cepid FoRC, da USP, que forneceu amostras de bactérias importantes em segurança dos alimentos, como a responsável pela salmonelose.
Com o material em mãos, Franco começou a isolar os fagos presentes nas amostras e a testá-los contra as bactérias. Para isso, cultivou os microrganismos de interesse em placas repletas de nutrientes até que cobrissem toda a superfície. Em seguida, depositou um pouco de cada amostra com os fagos em alguns pontos espaçados.
Se o vírus presente na amostra tivesse a capacidade de infectar e matar a bactéria em questão, era possível notar espaços transparentes sobre o “tapete de bactérias”, chamados placas de lise. “Esse é o local onde o fago matou a bactéria”, explica. O processo foi repetido centenas de vezes e trouxe resultados inéditos: “No final das contas, eu consegui isolar 62 novos fagos”, diz Franco.
Achados têm potencial para impulsionar novas estratégias em áreas como saúde, indústria e alimentação
Além de representar um avanço acadêmico importante, os achados têm potencial para impulsionar novas estratégias em áreas como saúde, indústria e alimentação. “Esse trabalho ajuda a encontrar alternativas para combater bactérias resistentes a antibióticos, um problema grave nos hospitais”, afirma o pesquisador, que também aponta a possibilidade de, no futuro, utilizar alguns desses fagos no controle de bactérias contaminantes em alimentos, evitando surtos de doenças.
Franco ressalta ainda a importância de criar coleções e bancos de fagos isolados para viabilizar essas soluções, como o uso em fagoterapia, algo que faz parte das perspectivas do projeto para os próximos anos.
“Agora é o momento de isolar o DNA, sequenciar os genomas das bactérias e dos fagos e fazer estudos mais aprofundados dessas interações, saber como o vírus infecta a bactéria e buscar formas de aumentar a eficiência”, pontua.
De acordo com Franco, a ideia é estimular ainda mais as parcerias entre os Cepids e as interações entre os alunos das diferentes instituições. “Tudo que se planta agora tem a chance de se desenvolver e você pode colher frutos depois. São universidades públicas que estão se debruçando na ciência para resolver problemas de saúde pública; os objetivos são comuns e as demandas são da sociedade”, diz o pesquisador, que deve continuar atuando simultaneamente como colaborador do Cepid B3 e docente da Unifesp.
* Com informações de Bianca Bosso, do Cepid B3
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