LITERATURA

Precursor do realismo fantástico no Brasil, escritor mineiro Murilo Rubião ganha novo site oficial

Da Redação
04/10/2022 às 16:58.
Atualizado em 04/10/2022 às 17:31
Página entra no ar nesta quinta-feira, reunindo fotos, manuscritos, um livro completo digitalizado e cartas de amigos (Divulgação)

Página entra no ar nesta quinta-feira, reunindo fotos, manuscritos, um livro completo digitalizado e cartas de amigos (Divulgação)

Assim como os contos de atmosfera onírica de Murilo Rubião, o processo criativo do escritor mineiro precursor do realismo fantástico no Brasil, popular a partir de meados do Século XX, também carrega uma aura de fascínio. Para abrir ao público esse acervo riquíssimo de memórias que envolvem a criação dos famosos contos do autor, será lançado nesta quinta-feira (6), o novo site oficial de Murilo Rubião.

Entre cartas, um livro na íntegra, trechos de obras originais, adaptações e fotografias, a plataforma abriga um podcast sobre a obra do escritor, além de manuscritos – incluindo anotações em uma Bíblia pessoal do escritor autodeclarado agnóstico – e depoimentos de literatos e críticos, como o do professor Antonio Candido, morto em 2017, em uma de suas últimas entrevistas.

A curadoria do site é fruto de uma parceria entre Sílvia Rubião, jornalista, editora, sobrinha de Murilo Rubião e gestora de sua obra, e o professor Cleber Cabral, pesquisador do Núcleo de Estudos dos Acervos de Escritores Mineiros e professor da Uninter. Parte do material digitalizado integra o Acervo de Escritores Mineiros da UFMG, que abriga milhares de itens disponibilizados pela família, a pedido do próprio Rubião. “O que antes ficava restrito ao público que podia ir até o campus da Universidade, agora estará ao alcance de estudantes, professores e pesquisadores de todos os lugares”, diz Sílvia.

“O conjunto do acervo de Murilo Rubião é composto por 9,6 mil peças, dentre móveis, obras de arte, livros, periódicos, documentos pessoais, manuscritos e correspondência. O material reunido faz um apanhado desde o ano de 1916 (ano de nascimento de Rubião) até 1991 – ano de sua morte. Diante de um montante tão expressivo de materiais, a principal dificuldade, ao compor o site institucional do escritor, consistiu em delimitar eixos para apresentar a vida de Rubião; a trajetória de sua obra, no campo ficcional; a história das leituras empreendidas pela crítica literária especializada; e os diálogos estabelecidos por outras linguagens artísticas (cinema, HQs, teatro, música) com a ficção rubiana”, atesta Cléber Cabral.

A programação digital e o design do site foram criados pelo escritório Nemer Fornaciari Design, com versão em inglês – além de contos em francês, espanhol e alemão, principais línguas nas quais Rubião foi traduzido. O site também conta com recursos de acessibilidade, incluindo tradução em Libras e ferramentas para deficientes visuais, como seleções de alto contraste, tamanho da fonte e tela em preto e branco. Com estética fluida e nostálgica, o site contempla um relicário sobre o processo criativo de Murilo Rubião, com cinco seções temáticas, que incluem Vida, Obra, Murilianas – adaptações das criações originais – e Galeria de Fotos.

Uma das novidades do lançamento, viabilizado pela Lei Municipal de Incentivo à Cultura, com patrocínio do Centro Universitário Uni-BH, serão palestras para estudantes do Ensino Médio, além da disponibilização no site de um material didático completo, originalmente editado em 2016, marco do centenário do escritor, reunindo sugestões de como trabalhar a obra de Murilo Rubião com adolescentes. Além disso, com a atualização do site, chegam ao público documentos raros e inéditos.

Entre as pérolas do novo acervo digital está a reprodução, na íntegra, com assinatura de Murilo Rubião, da primeira edição do livro “A Estrela Vermelha” (1953), de tiragem limitada, apresentando quatro contos do autor. Além desta relíquia, estão disponíveis dezenas de manuscritos originais de Murilo Rubião, incluindo textos incompletos para contos e novelas, e correções de obras publicadas, que revelam a característica peculiar de reescrever incansavelmente suas criações.

Preciosas são também algumas páginas da Bíblia do escritor, com grifos e anotações que referenciam suas obras. “Por diversas vezes, Murilo disse não ter crença religiosa. Era, contudo, um leitor frequente do Primeiro Testamento, de onde extraía as epígrafes que abrem todos os seus contos”, conta Sílvia. A partir de rascunhos de próprio punho, a memória de Rubião chega ao público para expor o rigor estilístico de suas percepções literárias mais pessoais, agora digitalizadas e ao alcance de todos. “Pode-se dizer que ele mais reescreveu do que escreveu, porque era um perfeccionista, sempre em busca da melhor forma, da palavra exata, da epígrafe mais adequada. Essas alterações mostram bem o seu processo criativo”, analisa Sílvia.

Com uma obra de exatos 33 contos, Murilo Rubião não deixou textos inéditos para publicação póstuma – o único conto considerado por ele pronto para publicação foi “A Diáspora”, que integra o livro “Contos Reunidos” (1998), organizado por Vera Lúcia Andrade. Sobre materiais inacabados ou inéditos de Rubião, Silvia relembra um caso emblemático para o escritor. “Certa vez, ele esqueceu em um táxi os originais de um novo livro. Uma perda incomensurável. Houve até uma campanha pela imprensa na tentativa de encontrá-los. Mas lamentavelmente foi inútil”, relembra Sílvia.

Conhecido como pioneiro do realismo fantástico moderno no Brasil – gênero comum a gênios como García Márquez, Borges e Julio Cortázar, por exemplo, no qual elementos de fantasia e realidade se misturam de forma propositalmente indistinguível – Murilo Rubião fez muitos amigos e admiradores no meio literário. Também chegou a ser comparado a Franz Kafka, embora seu primeiro contato com os livros do escritor tcheco tenha acontecido após publicar sua primeira obra, “O Ex-Mágico” (1947).

Para além do meio literário, Rubião conquistou a confiança de pessoas públicas, como Juscelino Kubitschek, tendo ocupado o cargo de chefe de gabinete do ex-presidente quando este foi governador de Minas Gerais. Entre a vida pública e a literária, dirigiu a Rádio Inconfidência e fundou o icônico Suplemento Literário de Minas Gerais, uma das publicações mais respeitadas do país.

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