Mais de um ano após as enchentes no Rio Grande do Sul, o estado ainda trabalha para reconstruir escolas e prepará-las para futuros desastres climáticos. De acordo com a secretária estadual de Educação, Raquel Teixeira, oito escolas e a própria Secretaria de Educação ainda não retornaram aos edifícios onde funcionavam s unidades atingidos pelas cheias.
Segundo Raquel, não se trata apenas de reconstruir os edifícios, mas de colocar em prática um plano de contingência que torne não apenas os prédios, mas toda a comunidade escolar, mais preparados para tempestades, alagamentos e outros fenômenos naturais. Ao longo dos últimos anos têm se intensificado na região a ocorrência de ciclones, chuvas e calor extremo.
Junto ao Banco Mundial foram mapeadas 730 escolas que correm risco de destruição. Dessas, 87 foram consideradas mais vulneráveis e suscetíveis a futuros desastres. Essas escolas já começaram a implementar o plano de forma piloto.
“A gente não sabe exatamente quando virá e o que importa é que as escolas estejam preparadas, as pessoas estejam preparadas emocionalmente, mentalmente e em termos de conhecimento, cientificamente, sabendo o que fazer para que não haja quebra na continuidade do aprendizado. O Japão aprendeu a conviver com tsunami, a Califórnia com terremoto, a Itália com vulcão, o Rio Grande do Sul está aprendendo a conviver com as características climáticas da região”, disse a secretária.
Ela participou, nessa terça-feira (21), do II Fórum Internacional de Sustentabilidade e Educação, promovido pela Fundação Santillana e pela Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, Ciência e Cultura (OEI). Com o tema A escola de hoje: resiliente, inclusiva e tecnológica, o evento discute o papel da educação na construção de sociedades mais justas e sustentáveis.
Participação da comunidade
Raquel compartilhou a experiência do Rio Grande do Sul, mostrando a necessidade de envolver toda a comunidade escolar no desenvolvimento de uma educação atenta à crise climática.
“Nós tivemos escolas de sete dias a 52 dias sem aula. E é claro que isso requer intervenção pedagógica diferenciada em cada um dos blocos de escolas. Não é simples fazer isso e nós chegamos à conclusão que tínhamos que nos preparar para não sermos pegos novamente nessa situação”, afirmou.
Por meio de parcerias e consultorias nacionais e internacionais, junto com as escolas, foram preparados os planos de contingência, espécies de guias que definem o que fazer antes, durante e após a emergência.
“A escola é o espaço onde a criança aprende, adquire novas rotinas, novos hábitos e influencia a família, influencia a comunidade e o plano de contingência só faz sentido se ele for discutido por toda a comunidade, escola por escola. Porque o plano de contingência depende de onde a escola está localizada, que tipo de evento vai acontecer ali, como é que ela se distribui, qual que é um ponto de saída.
Para ela, tudo tem que ser muito conhecido, muito combinado, porque o que leva as pessoas ao desespero é não saber o que fazer. " Portanto, a partir do momento em que cada escola trabalha um plano de contingência com a sua realidade, nós teremos uma sociedade muito mais preparada”, afirma.
Um exemplo de estrutura desenvolvida a partir do desastre é o Ginásio Resiliente, que pode tanto ser usado para a prática esportiva, quanto para ser um espaço de acolhimento emergencial. Para isso, possui uma estrutura reforçada para segurança e durabilidade e, apesar de ser integrado ao ambiente escolar, pode se tornar um abrigo e funcionar de forma independente, permitindo a continuidade do ensino.
No primeiro semestre de 2024, o Rio Grande do Sul enfrentou o maior desastre natural do estado. Ao todo, as inundações impactaram 478 das 497 cidades gaúchas, afetando diretamente cerca 2,4 milhões de habitantes. O número de mortes chegou a 184, além de 806 feridos e 25 pessoas até hoje são dadas como desaparecidas.
Educação e sustentabilidade
A experiência do Rio Grande do Sul foi inclusive levada a Valência, na Espanha, que também foi gravemente afetada por tempestades em novembro de 2024.
O arquiteto espanhol fundador do escritório Espacios Maestros, José Picó, que também participou do evento, foi um dos que trabalharam na reconstrução de uma escola na região. Ali também se priorizou a escuta da comunidade escolar para a construção de uma nova instituição de ensino.
“A água atingiu uma altura de dois metros dentro da escola. Levou todas as divisórias, os móveis e, junto com toda aquela comunidade, com absoluta resiliência, as próprias famílias participaram da transformação. Junto com elas, redesenhamos a escola”, conta Picó.
O arquiteto defende que as escolas devem se adaptar às necessidades atuais, não apenas de serem resilientes a desastres climáticos, mas integradas à natureza, sustentáveis e serem ambientes de acolhimento que favoreçam a aprendizagem e a inclusão. Ele ressalta que muitos modelos de edifícios e de espaços como os refeitórios datam da revolução industrial, de 1760.
Picó mostra exemplos de escolas reformadas pelo escritório tanto na Espanha, quanto no Brasil e México. A prioridade é por espaços que atendam às necessidades de cada comunidade.
“É a comunidade educacional quem decide como seus espaços devem ser, não uma equipe externa de arquitetura. São eles que sabem quais são seus problemas e necessidades”.
Outra prioridade é garantir, segundo ele, “o bem-estar do planeta”. Picó mostra um dos projetos desenvolvidos: “A escola criou percursos em todos os pátios, em todo o perímetro externo da escola, para trabalhar com a biodiversidade, com a agricultura, com as energias alternativas. Junto com todos eles, estamos implementando uma série de dinâmicas para essa transformação, cuidando não apenas da educação dos espaços internos, mas também dos espaços externos, da naturalização desses espaços e do compromisso com a sustentabilidade”.
Prêmio Escolas Sustentáveis
Ao final do evento foi anunciado o projeto vencedor da etapa internacional do Prêmio Escolas Sustentáveis. Nesta edição, a escola vencedora foi a colombiana Institución Educativa Comercial de Envigado, com o projeto Metodologia de Pesquisa Socioambiental GCA. Trata-se de uma rota pedagógica e didática, alinhada às Políticas Públicas de Educação Ambiental da Colômbia, que orienta a comunidade escolar a se tornar gestora de projetos ambientais, sociais, econômicos e tecnológicos a serviço da coletividade. A instituição recebeu o equivalente a R$ 25 mil.
O Prêmio Escolas Sustentáveis, promovido pela Santillana, pela OEI e pela Fundação Santillana, reconhece projetos de desenvolvimento socioambiental implementados por instituições de ensino do Brasil, México e da Colômbia que beneficiem comunidades locais. A premiação está na terceira edição, que contou com cerca de mil candidaturas.
Duas iniciativas em cada país, uma na categoria Educação Infantil - Fundamental e outra na categoria Ensino Médio, foram selecionadas para a final, considerando critérios como impacto, eficácia, grau de criatividade e inovação. Essas escolas receberam prêmio em dinheiro no valor de US$ 3 mil (aproximadamente R$ 16 mil).
Na categoria Ensino Médio, a finalista brasileira foi a Escola Estadual Brasil, em Limeira (SP), reconhecida pelo projeto AquaTerraAlert, que criou um sistema pioneiro de alerta precoce para inundações e deslizamentos de terra.
Na categoria Educação Infantil - Fundamental, a finalista foi IncluARTE – SustentART, do centro educacional Creche Municipal Magdalena Arce Daou, em Manaus. O projeto combina sustentabilidade, arte e inclusão para transformar um território degradado pelos impactos.