Ministério Público acusa militar de genocídio contra povo Krenak

Rosiane Cunha*
18/10/2019 às 18:49.
Atualizado em 05/09/2021 às 22:18
 ( LEONARDO MORAIS/Hoje em Dia)

( LEONARDO MORAIS/Hoje em Dia)

Leonardo Morais/Hoje em Dia 

Na região de Resplendor, ainda vivem cerca de 300 índios Krenak

O policial militar reformado Manoel dos Santos Pinheiro, conhecido como capitão Pinheiro, foi denunciado pelo Ministério Público Federal (MPF), em Governador Valadares, no Leste do Estado, pelo crime de genocídio. A petição, subscrita pelos procuradores da República Lilian Miranda Machado e Edmundo Antonio Dias Netto Junior, está sob avaliação da Justiça Federal, que decidirá se acolhe ou não a denúncia.

A informação foi divulgada nesta sexta-feira (18) e conforme o MPF, como ex-comandante da patrulha rural da PM mineira, Pinheiro foi nomeado pela ditadura, em dezembro de 1968, chefe regional da Funai (Fundação Nacional do Índio) de Minas e Bahia. O major comandou o chamado “reformatório” Krenak, uma prisão de indígenas e criou e coordenou a GRIN (Guarda Rural Indígena), responsável, segundo o MPF, pela “remoção forçada (exílio) do território tradicionalmente ocupado” pelos krenaks.

Os procuradores apontam que os episódios são “graves violações aos direitos humanos”, praticadas com nítida intenção de destruição do grupo étnico krenak.  “Percebe-se, portanto, que atuação incisiva do oficial reformado, diretamente ou por meio dos guardas da Grin e dos militares, todos a seu comando, deu-se com o objetivo nítido de controlar o comportamento dos índios Krenak, limitando seu direito de reprodução, de ir e vir e de cultuar suas tradições, na ânsia de destruir esse grupo étnico indígena, cuja extinção não ocorreu devido à enorme capacidade de resistência demonstrada pelos indígenas”.

Conforme a lei 2.889, de 1956, pratica crime de genocídio quem “com intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso” pratica cinco atos, dentre os quais “causar lesão à integridade física ou mental de membros do grupo”, “submeter intencionalmente o grupo a condições de existência capazes de ocasionar-lhes a destruição e física total ou parcial” e “adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo”.

Os índios foram levados de Resplendor para Carmésia e só em 1997 conseguiram recuperar a posse de seu território original.

Segundo o Ministério Público, Pinheiro mora em Congonhas, na região Central do Estado. Ele já foi procurado pelo MPF para se manifestar, mas optou pelo silêncio. 

Guarda Rural

Em 1969, foi criada a Guarda Rural Indígena (Grin), um grupamento composto por indígenas de várias etnias, cujo comando era exercido pelo chefe da Ajudância Minas Bahia, uma instância regional da Fundação Nacional do Índio (Funai). A função era ocupada, à época, por Manoel dos Santos Pinheiro. Além de ser capitão da PMMG, o acusado podia, nos termos da portaria da Funai que criou a Grin, solicitar o apoio das polícias militares estaduais, para o comando dos grupamentos da guarda rural.

A solenidade de formatura da 1ª turma da Grin ocorreu na presença do então governador de Minas Gerais, Israel Pinheiro e de outras  autoridades federais. Durante o desfile, foi exibido um índio dependurado em um pau de arara. A cena, que foi filmada, é a única registrada no Brasil que mostra, em um evento público, um ato de tortura.Cena do filme "Arara"de Jesco Von Puttmaker

Para o Reformatório Krenak foram enviados indígenas de mais de 15 etnias de 11 estados das cinco regiões do país. Manoel dos Santos Pinheiro administrou o reformatório e a ocupação militar das terras Krenak, sendo também o responsável pela remoção compulsória, em 1972, dos indígenas para a fazenda Guarani, a partir de uma permuta realizada com a PMMG, que era a proprietária da fazenda.

Os indígenas eram aprisionados por diversos motivos: embriaguez, manutenção de relações sexuais e saída não autorizada da terra indígena. Lá eram submetidos a todo tipo de arbitrariedade: trabalhos forçados, tortura e maus tratos. Havia uma espécie de solitária no reformatório, que os índios chamavam de “cubículo”, onde eram mantidos dia e noite com água pingando sobre os que eram mantidos ali, como forma de punição.

*Com informações do MPF

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