O motivo da destruição: chuva ganhou velocidade no asfalto e não encontrou solo para ser absorvida

Juliana Baeta
jcosta@hojeemdia.com.br
29/01/2020 às 12:05.
Atualizado em 27/10/2021 às 02:28
 (Arquivo/ Sudecap )

(Arquivo/ Sudecap )

O grande volume de chuvas que caiu sobre a região Centro-Sul de BH na noite dessa terça-feira (28), além de ter causado vários estragos, também acende o alerta sobre um problema histórico da capital, que data desde o início de sua urbanização entre as décadas de 20 e 30: a impermeabilização do solo. 

É que, sem ter terra ou vegetação para ser absorvida, a água da chuva "passa reto" pelo concreto das ruas da cidade, ganhando força e velocidade e arrastando tudo o que encontra pela frente, como aconteceu no bairro de Lourdes, por exemplo. 

Como explica o meteorologista Cleber Souza, do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), na noite dessa terça, a chuva começou no alto da Afonso Pena e, então, foi descendo pela cidade em direção aos bairros mais baixos na região Centro-Sul. 

Além do asfalto, as águas encontram, ainda, outro obstáculo de concreto pela frente: a canalização e retificação dos cursos d'água, que é a construção de estruturas que "forçam" o rio a seguir em linha reta, ao invés de seu curso natural.

Quem anda pelo asfalto da cidade diariamente, às vezes, nem se lembra que depois do chão, bem embaixo dos seus pés, corre um rio. O geógrafo, professor e autor do livro "Rios Invisíveis da metrópole mineira" Alessandro Borsagli lembra que BH conta com pelo menos 250 cursos d'água, sendo que boa parte deles foi "cimentada" ao longo dos anos. 

Segundo a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), a extensão total de córregos do município é de 700 quilômetros, dos quais 200 km foram canalizados, 200 km correm em leito aberto na malha urbana e outros 300 km estão localizados em áreas de preservação. 

Borsagli explica: "Temos um problema muito sério na drenagem urbana de BH, que é precária, e um cenário de excessiva impermeabilização do solo. A partir do momento em que a cidade asfalta e concreta os seus cursos d´água, a água da chuva fica sem ter para onde cair". 

Como exemplo ele cita o que aconteceu na avenida Prudente de Morais na noite dessa terça. "Com uma chuva muito forte em curto espaço de tempo, a água acaba indo para os fundos de vale [que são os ponto mais baixos de um relevo acidentado, por onde escoam as águas], como é a avenida Prudente de Morais. Por isso, uma chuva que cai ali no Santo Antônio, na rua Mar de Espanha, desce toda pra lá". 

Também são fundos de vale as avenidas Francisco Sá e Silva Lobo, pontos históricos de alagamentos e enchentes na cidade. Na Prudente de Morais, onde o Córrego do Leitão corria a céu aberto antes de ser canalizado e asfaltado, a água da chuva encontraria com facilidade este curso d'água e teria a sua força e volume absorvidos pelo rio. 

O vídeo abaixo, disponibilizado pelo canal do Museu da Imagem e Som de BH, mostra quando foram concluídas as obras que tamparam o Córrego do Leitão, em 1970:


"Essa técnica de canalização começou a ser empregada na década de 20 e, desde a década de 30 é utilizada a mesma técnica de retificação e canalização dos cursos d'água, claro que com algumas modernizações e melhorias ao longo dos anos. Mas se isso não for mudado, estes problemas que acontecem durante as chuvas nunca vão acabar", observa. 

Para ele, uma saída para reverter esse quadro trágico é priorizar a vegetação em detrimento do concreto na capital que um dia já foi apelidada de "cidade jardim". "É possível mitigar esses problemas, por exemplo, criando áreas permeáveis nas vertentes e desasfaltando ruas e vias onde não há necessidade de asfalto. A criação de parques ciliares e áreas verdes também podem ajudar a evitar desabamentos e deslizamentos de terra, uma vez que a vegetação 'segura' o solo", conclui.

Leia mais:

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por