Redes sociais ampliam visibilidade e viram arma de combate ao racismo

Cinthya Oliveira
cioliveira@hojeemdia.com.br
04/07/2018 às 12:46.
Atualizado em 10/11/2021 às 01:11
 (Gleeson Paulino/Reprodução Facebook Taís Araújo)

(Gleeson Paulino/Reprodução Facebook Taís Araújo)

O mais recente desabafo da atriz Taís Araújo sobre racismo, em seu perfil no Facebook, é uma queixa sobre a onda de casos flagrantes de discriminação que se tornaram públicos nos últimos dias,como o da menina que teve o cabelo alisado contra a própria vontade pela madrasta e o youtuber que achou que seria uma piada afirmar que um jogador de futebol negro veloz se daria bem em um arrastão no Rio. Mas o post da atriz é também uma demonstração do poder que as redes sociais têm para, apesar de amplificar os episódios de racismo, ajudar a combatê-los. 

A menina Bella, 8 anos, de Governador Valadares, por exemplo, ficou conhecida na internet como uma "garota empoderada" que adorava mostrar os cachos volumosos e tinha 77 mil seguidores no Instagram. Mas em um fim de semana na casa do pai teve o cabelo cortado e alisado sem o consentimento da mãe, Fernanda, que fez um longo desabafo no Facebook, alvo de mais de 400 mil curtidas. "É direito dela se sentir bem com a identidade, suas raízes, sua história. Isso não pode ser violado", reclamou Fernanda. 

Com a repercussão do episódio e da defesa do respeito a elementos da identidade negra, o perfil de Bella ganhou mais 184 mil seguidores, e a mãe garante que, à medida  que os efeitos do alisamento passarem, ela vai retomar o visual cacheado. 

Para o  youtuber Júlio Cocielo, um comentário racista foi a senha para a reação imediata de seguidores e a  perda de patrocinadores. Cocielo comentava o jogo entre França e Argentina pela Copa do Mundo, no Twitter, quando fez um comentário sobre Mbappé, jogador negro da seleção francesa. "Mbappé conseguiria fazer uns arrastão top na praia hein [sic]", publicou.

Após o resgate de comentários rascitas em tuítes antigos e uma enxurrada de críticas, ele publicou uma nota se desculpando e excluiu tuítes anteriores. Diante dos pedidos nas redes sociais para que marcas que o apoiavam se posicionassem, empresas do porte de Itaú e Coca-Cola divulgaram, além das já esperadas notas de repúdio ao racismo, que já não têm mais qualqer ligação com o youtuber nem "planos para futuras parcerias". 

Para a advogada e militante do movimento negro Ana Paula Freitas, os casos que ganham repercussão na internet refletem o racismo com que negros lidam permanentemente.  “A única diferença entre o mundo real e o virtual é que uma postagem torna uma situação pública, alcançando muito mais pessoas”, afirma Ana Paula.

Segundo Ana Paula, as redes sociais podem ser um ótimo instrumento antirracismo. Além  de exporem comentários e atitudes preconceituosas, as redes dão voz à militância, como a atriz Taís Araújo. “A Taís faz a diferença, é uma pessoa pública, respeitada, que teve de se esforçar para chegar onde chegou. Ajuda na conscientização", diz Ana Paula.

A advogada aponta ainda que casos como o de Bella, apesar da grande comoção e repercussão, não são fatos isolados entre crianças negras.  Ana Paula conta que passou por situação semelhante na infância, quando tinha a mesma idade da menina, aos 8 anos. “Meus pais eram separados. Teve um dia em que fui para a casa do meu pai e ele me levou para cortar o cabelo numa barbearia. Cortaram o meu cabelo muito curto e carreguei isso como um grande trauma da infância”, lembra a advogada.

Após anos de contato com a militância negra e pesquisa sobre gênero e relações étnico-raciais, ela passou a compreender melhor a própria dor e os casos das meninas negras que são induzidas pelas famílias a mudarem os cabelos.

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