‘protagonismo no parto´

Às vésperas do Dia das Mães, mineiras reforçam luta contra violência obstétrica

Gabriel Rezende
grezende@hojeemdia.com.br
Publicado em 07/05/2022 às 08:00.
Sara Ribeiro durante o parto de Samuel (Clareou Filmes / Divulgação)

Sara Ribeiro durante o parto de Samuel (Clareou Filmes / Divulgação)

Fortes contrações, parecidas com cólicas menstruais, mas mais intensas, avisam que está próximo: o bebê irá nascer. Entre um suspiro e outro, a gestante deixa um gemido de dor escapar. O profissional responsável pelo parto, então, reclama: "na hora de fazer não doeu". Este é um exemplo claro de violência obstétrica.

Na tentativa de chamar a atenção da sociedade para um parto humanizado, foi criado o projeto Clareou Filmes, que registra fotos desse momento tão especial na vida das famílias. Atualmente, a iniciativa conta com 11 mulheres — todas mães e mineiras — que fotografam e filmam os partos. 

"O foco é acolher mães, não só as que trabalham conosco, mas também as que estão grávidas e vão viver experiência de parto. Parir é desafiador fisiologicamente, mas enfrentar o sistema obstetra violador intervencionista também é desafiador", afirmou a criadora do projeto, a belo-horizontina Milene Nunes.

Em alguns casos, o desrespeito à mulher é velado e pode passar despercebido. A médica obstetra Ana Luiza Lunardi Rocha, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), esclarece: "O protagonismo da mulher é um conceito fundamental na assistência ao parto. Ela tem que participar ativamente das decisões".

O grupo reforça que há casos velados de violência obstétrica. Exames de toque sem comunicação prévia, raspagem dos pelos íntimos, lavagem intestinal para tornar o ambiente do parto mais limpo, uso de medicamentos sem necessidade e qualquer procedimento sem consulta e explicação à mulher também são exemplos. 

"Acreditamos que a melhor forma de parir é em um contexto de respeito. O que fazemos é compartilhar nossos registros de parto humanizados. Entendemos nossos registros como ferramentas de transformação social", acrescenta Milene.

Parto humanizado

A médica Gabriella Lani, de 36 anos, tem dois filhos. Em 2018, nasceu Serena, e, em 2021, Raul veio ao mundo. O primeiro parto foi feito com cesária, enquanto no segundo houve parto normal, com cobertura de imagens do projeto Clareou Filmes. 

Gabriela Lani durante o parto de Raul (Clareou Filmes / Divulgação)

Gabriela Lani durante o parto de Raul (Clareou Filmes / Divulgação)

"Após vivenciar um parto humanizado, senti-me pertencente àquela situação. Protagonista daquele nascimento. Eu realizei a travessia mais intensa que uma mulher pode realizar. (No primeiro parto, quando foi feita cesariana), fiquei de certa forma desconectada de mim mesma, da minha filha, sem entender de fato a transformação que acabava de acontecer", reflete. 

A ginecologista Márcia Braga é mãe da Tereza, que completará 2 anos em julho. Ela também teve um parto humanizado, registrado pela equipe da Clareou Filmes.

"É um momento de transformação da mulher. Você está de frente com você mesma. É um momento muito lindo e intenso na vida de uma mulher", afirmou.

Ela explica que parto humanizado “é um modelo de assistência, baseado no respeito, evidência científica, acolhimento e, acima de tudo, humanização no cuidado com a mulher e empatia com suas decisões".

(Clareou Filmes / Divulgação)

(Clareou Filmes / Divulgação)

A relações públicas Sara Ribeiro, de 37 anos, tornou-se mãe do pequeno Samuel, atualmente com sete meses. Ela chama atenção para o racismo envolvendo a violência obstétrica. "A ideia de nós, mulheres negras, somos mais fortes e não sentimos dor, boas parideiras, amas de leite por natureza, faz com que sejamos vítimas", lamenta.

"Quem faz o parto não é o médico. É a mulher, num momento de conexão profunda com seu corpo e sua cria, evidenciando todo seu protagonismo, podendo ter seus desejos e escolhas respeitados na busca por diminuir intervenções clínicas desnecessárias", reforça. 

A médica obstetra Ana Luiza Rocha reforça: "É muito importante que as mulheres façam os planos de parto, estudem sobre partos, façam boas escolhas, tenham certeza que os profissionais envolvidos no parto dela vão compartilhar as decisões e que tudo será feito com muito acolhimento e muito respeito".

Denúncias

Em Minas, uma lei estadual garante atendimento humanizado às gestantes. 

Denúncias de violência obstétrica podem ser feitas por meio da Ouvidoria do Sistema Único de Saúde (SUS). O contato pode ser feito por telefone, nos números 162 ou 136, ou pela internet, no site da Ouvidoria

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