Cerol e linha chilena dilaceram sonhos e demandam combate urgente

Lucas Eduardo Soares
24/07/2019 às 20:57.
Atualizado em 05/09/2021 às 19:41
 (Arquivo Pessoal/Divulgação)

(Arquivo Pessoal/Divulgação)

No meio do caminho, havia uma linha. Fina e potente, adiou o sonho do Gabriel de se tornar jogador de futebol. Altamente cortante, levou Henrique a intensas – e dolorosas – cirurgias. Terrível o bastante, tirou a vida de Breno. O cerol é capaz de deprimir, machucar e matar. O material, juntamente com a linha chilena, faz cada vez mais vítimas e escancara um desafio antigo, mas que ainda demanda a atenção especial das autoridades.

Só neste ano, o Hospital de Pronto-Socorro (HPS) João XXII atendeu a 23 casos. Ontem, médicos de Betim, na Grande BH, se viram obrigados a amputar a perna do adolescente Gabriel Nascimento, de 15 anos, ferido no último sábado por uma linha chilena. Ele caminhava por uma avenida da cidade da região metropolitana quando foi atingido. A medida foi necessária devido aos riscos à saúde do garoto. A expectativa é a de que ele receba alta em uma semana.

Quem também está em uma unidade de saúde é o motociclista Henrique Luiz de Souza, de 38, ferido há cerca de dez dias na MG-010, em BH. Internado em um hospital particular, o amante de motos e videogames tem passado por uma série de procedimentos.

Segundo a irmã dele, Anne Cristina Souza, de 39, o caçula foi gravemente ferido. Além da traqueia cortada, teve fraturas após a queda no acidente. Pai de duas crianças, já passou por quatro cirurgias. “Estamos aguardando, ansiosos, por uma resposta positiva para que ele continue o tratamento com o fisioterapeuta em casa. O filhinho mais novo, de 1 ano e nove meses, não para de perguntar”, lamenta Anne, que é assistente social.

Ser chamado pelo filho era tudo o que o aposentado Denilson Pereira, de 50, mais queria na vida. Há dois anos, o primogênito Breno, na época com 5, teve o pescoço cortado enquanto andava de bicicleta, perto de casa, em Ibirité. Ao escutar a movimentação na rua, Denilson teve apenas um impulso. “Gritei: Breno! Mas, ao chegar, ele já estava sangrando”, relembra o homem.Bruno InácioPais de Gabriel mostram foto do garoto, que sempre sonhou ser jogador de futebol

Desde então, Denilson evita comentar com a esposa sobre a tragédia. No entanto, o que Denilson nunca se cansa em dizer é para que as pessoas tomem cuidado com o cerol. “Pais, se virem suas crianças brincando com isso, não deixem. Uma família pode ser destruída. Posso garantir, a dor nunca passa”.

Neste ano, 23  vítimas de cerol foram registradas no HPS João XXIII

Enfrentamento

Ações de conscientização e punições rigorosas são medidas urgentes para combater as linhas cortantes. É o que diz José Roberto Lima, delegado federal aposentado e professor do curso de Direito das Faculdades Promove. “Primeiro, é preciso instituir a norma proibitiva. Depois, mais importante do que somente fiscalizar, é punir, inclusive, os pais”, afirma. “Esclarecer os riscos também é crucial”, acrescenta.

Porta-voz da Polícia Militar, major Flávio Santiago diz que operações têm sido feitas. De acordo com ele, quem for pego empinando pipa com o material proibido ou vendendo o produto pode pagar multa e cumprir pena de até 5 anos de cadeia. O valor chega a R$ 2 mil. Já quem armazena ou comercializa, é autuado em R$ 4 mil. No entanto, para o militar, também é necessária uma mudança cultural. “Já vimos famílias inteiras usando o cerol”.

Em nota, a Secretaria Municipal de Segurança e Prevenção informou que desenvolve ações, como a campanha Cerol Mata. Neste ano, os trabalhos nas escolas foram reforçados. Segundo a pasta, em 2018 foram apreendidas 161 latas com cerol ou linhas chilenas.

(Com Bruno Inácio e Marília Mesquita)
 Anne Cristina Souza / Divulgação
Internado em um hospital particular, Henrique passou por quatro cirurgias em apenas dez dias
 

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