DIA NACIONAL DO LIVRO

Com livros caprichados e novos autores, editoras independentes de BH oxigenam mercado literário

Rodrigo de Oliveira
rsilva@hojeemdia.com.br
29/10/2022 às 10:25.
Atualizado em 29/10/2022 às 10:25
Maíra Nassif fundou a Relicário Edições em 2013 (Fernando Michel/Hoje em Dia)

Maíra Nassif fundou a Relicário Edições em 2013 (Fernando Michel/Hoje em Dia)

Em um mercado dominado pelas grandes editoras, com maior poder de publicação e distribuição, as pequenas empresas acabam sendo reduto para novos autores, com edições mais caprichadas dos livros – com o cuidado que só processos menores de produção permitem.

Assim, elas vão conquistando públicos fiéis e até prêmios importantes da literatura nacional e mundial. Neste sábado (29), no Dia Nacional do Livro, convidamos três editoras de Belo Horizonte para falar um pouco sobre suas histórias e modelos de negócio.

Da filosofia à literatura
Fundada em 2013, a Relicário Edições tinha como proposta inicial publicar livros de teor acadêmico relacionados à filosofia, área de formação da fundadora da empresa, Maíra Nassif. Com o passar do tempo, a editora abriu seu leque e passou a publicar poesias, ensaios e romances.

Em nove anos de história, a Relicário já lançou cerca de 115 livros. Um dos mais recentes é a obra "Poesia Completa", do consagrado dramaturgo e escritor irlandês Samuel Beckett.

Maíra Nassif fundou a Relicário Edições em 2013 (Fernando Michel/Hoje em Dia)

Maíra Nassif fundou a Relicário Edições em 2013 (Fernando Michel/Hoje em Dia)

"Uma dos diferenciais é a publicação de autores renomados em outros países, mas que não estão nas grandes editoras daqui. Também trazemos autores nacionais que não conseguem chegar aos grandes circuitos. As pequenas editoras proporcionam a diversidade e oxigenam o mercado", disse.

Para ela, a qualidade e o cuidado nas publicações é o que chama a atenção do leitor.

"Ao publicar uma quantidade menor, temos um contato mais próximo com o autor e todas as etapas de produção. Existe um carinho pessoal, não é apenas mais um livro dentro do cronograma de uma grande editora", comentou Maíra.

E, para tornar o negócio viável, segundo a responsável pela editora, algumas estratégias são necessárias. "Participamos de alguns editais de apoio à tradução, que as embaixadas estrangeiras oferecem. Um livro que vendeu bem também possibilita que outros sejam publicados. A gente vai fazendo esses cálculos", avaliou. 

Projeto editorial caprichado é marca da Relicário (Reprodução/Redes Sociais)

Projeto editorial caprichado é marca da Relicário (Reprodução/Redes Sociais)

A Relicário também tem tido reconhecimento em prêmios literários. 

"Vencemos o Prêmio Jabuti em 2021 com o livro de poesia 'Batendo Pasto', da Maria Lúcia Alvim, e também ficamos em segundo lugar no Oceanos com o livro 'O Ausente', de Edimilson de Almeida Pereira. Neste ano, somos finalistas do Prêmio Jabuti com o livro 'O Mundo Desdobrável: Ensaios para Depois do Fim', de Carola Saavedra", comemorou Maríra Nassif.

Eventos e feiras 
Fundada há 10 anos pelos sócios Wallison Gontijo e Elza Silveira, a Impressões de Minas também busca a valorização do livro como um produto artístico e tem sua própria oficina gráfica para a produção dos exemplares.

A intenção é criar uma unidade entre aquilo que está escrito e a “embalagem” na qual aquele conteúdo será veiculado.

"Cada texto tem sua personalidade, então queremos que o livro converse o mais próximo com este conteúdo utilizando os recursos gráficos. Conseguimos utilizar tipografia, xilogravura e diversas outras experimentações em nossas edições", explicou Wallison.

Os sócios Elza Silveira e Wallison Gontijo fundaram a Impressões de Minas em 2012 (Arquivo Pessoal)

Os sócios Elza Silveira e Wallison Gontijo fundaram a Impressões de Minas em 2012 (Arquivo Pessoal)

Ele considerou semi-artesanal o modelo de produção da editora, sendo uma parte feita por máquinas e outra feita manualmente.

"São características que exigem tempo e as editoras grandes não conseguem fazer, pois o processo precisa girar mais rápido. A diversidade que as editoras pequenas colocam no mercado é muito bonita", disse o representante da Impressões de Minas.

Além da diversidade visual, a editora também se esforça para ter uma diversidade de conteúdo. “Publicamos poesia e prosa, incluindo aí romances, contos, crônicas, ensaios e alguns textos acadêmicos. Também temos um selo infantil, o Jubarte. Um dos destaques é o livro 'Carlos Viaja, do Multiartista China', ilustrado pela cantora Tulipa Ruiz”, disse Wallison Gontijo. 

Ao longo dos anos, a editora se manteve fiel à proposta de dar oportunidade a novos nomes, mas também lançou livros de nomes conhecidos do presente e do passado. 

“Desde a fundação temos a característica de publicar novos autores, que ainda não têm um grande reconhecimento no mercado e não são acolhidos por grandes editoras. No decorrer do caminho acabamos lançando livros de nomes consagrados, como o cantor Otto e, recentemente, também publicamos o clássico 'Macário', de Álvares de Azevedo”, contou o empresário.

Clássico do autor Álvares de Azevedo ganhou nova roupagem pelas mãos da editora (Arquivo Pessoal)

Clássico do autor Álvares de Azevedo ganhou nova roupagem pelas mãos da editora (Arquivo Pessoal)

Para viabilizar o negócio, segundo ele, a editora vende livros pela internet, em livrarias e organiza feiras na capital mineira, como a Urucum e a Textura.

"Fazemos na raça e não temos capital para investir. Já tentamos leis de incentivo, mas não fomos aprovados. Esperamos que isso melhore futuramente, até para poder ampliar este tipo de evento e dar oportunidade para outros autores", avaliou. 

Outra fonte de renda são os eventos e cursos promovidos dentro da editora. “Também temos visitas guiadas de universidades, que acabam gerando vendas e fomentando a divulgação da literatura”, apontou Wallison Gontijo.

Todo esse fomento à escrita em Minas Gerais também tem rendido indicações em prêmios nacionais. 

“Neste ano, temos o Ricardo Aleixo e, no ano passado, tivemos a Ana Elisa Ribeiro no Prêmio Jabuti. Temos uma série de profissionais e editoras incríveis em BH. Sem dúvidas temos um dos melhores cenários editoriais do país”, afirmou.

De Sampa para o Mercado Novo 
Nascida em São Paulo, a escritora e artista visual Ana Rocha fez de Belo Horizonte sua morada e, há 10 anos, fundou a Polvilho Edições. Desde 2018 a editora funciona dentro do Mercado Novo, na região Central da capital, e reúne os livros da proprietária, de outros autores e até de outras editoras, como Chão da Feira e a Impressões de Minas.

A paixão por livros de artista fez Ana Rocha fundar sua própria editora em 2012 (Reprodução/Instagram)

A paixão por livros de artista fez Ana Rocha fundar sua própria editora em 2012 (Reprodução/Instagram)

“Sempre pesquisei os chamados livros de artista (obras de arte realizadas sob a forma de um livro). Daí nasceu a ideia de ilustrar alguns poemas, diagramar e, em 2012, publiquei o livro 'Camarão que Dorme'. Daí nasceu a editora”, contou Ana Rocha.

De acordo com ela, uma das principais diferenças em relação às grandes editoras é a possibilidade de ter um controle maior sobre os processos criativos.

"Acho que nem dá para comparar muito, são modelos de trabalho diferentes. Mas, sem dúvida, temos uma liberdade muito maior para decidir sobre o projeto gráfico, o tipo de papel que será usado e outros detalhes do processo que permitem criar um produto muito mais autoral", afirmou. 

Espaço no Mercado Novo reúne obras da Polvilho e de outras editoras independentes (Reprodução/Instagram)

Espaço no Mercado Novo reúne obras da Polvilho e de outras editoras independentes (Reprodução/Instagram)

Para ela, é justamente isso que atrai quem consome este tipo de livro.

"As pessoas percebem que o livro foi pensado em todos os seus detalhes, nada ali é gratuito. É um objeto que pode, não apenas ser lido, mas também apreciado", apontou Ana Rocha. 

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