Supermercado terá que indenizar trabalhadora trans que descarregava cargas pesadas em Minas
Funcionária era a única mulher a realizar tarefa no estabelecimento - atividade era designada apenas para os homens
Um supermercado terá que indenizar em R$ 5 mil uma trabalhadora transgênero que sofreu discriminação no ambiente de trabalho em Minas. Segundo a decisão da Primeira Turma do TRT-MG, divulgada nesta sexta-feira (27), ela era a única funcionária mulher com a tarefa de descarregar caminhões com cargas pesadas - atividade que era designada apenas para os trabalhadores homens.
A trabalhadora trans relata que foi contratada em fevereiro de 2023 para exercer a função de repositora de mercadorias, e foi dispensada em novembro de 2024. Ela afirma que, desde o início, realizava atividades diferentes da função para a qual foi contratada, como assar pães, limpar a cozinha e áreas afins, repor frios, gerar etiquetas, descarregar caminhões, organizar e conferir mercadorias, entre outras. A mulher anexou ao processo vídeos e fotografias para provar o desempenho de atividades variadas durante o contrato de trabalho.
Segundo uma testemunha indicada pela trabalhadora, "apenas homens descarregam caminhão” e “a autora era a única mulher acionada para realizar o descarregamento”.
Além disso, a testemunha acrescentou que a trabalhadora demonstrava incômodo ao ser acionada para essa atividade e “sempre a chamavam com risos e 'gracinhas'". Já a testemunha indicada pela empresa declarou jamais ter visto mulheres realizando a tarefa.
No exame da prova, a juíza Fernanda da Rocha Teixeira ponderou que as tarefas eram repassadas à trabalhadora trans em tom de deboche. Para a relatora, não há dúvida de que pessoas transgênero “enfrentam preconceito e discriminação no cotidiano, tornando essencial a promoção de uma cultura de respeito à diversidade e a repressão de condutas discriminatórias que reforcem a exclusão social”.
“O empregador tem o dever de garantir um ambiente de trabalho seguro, respeitoso e livre de discriminação, promovendo a dignidade de seus empregados e coibindo quaisquer situações vexatórias. A construção de um ambiente laboral justo e inclusivo é essencial para assegurar a igualdade de oportunidades e o respeito à diversidade”, completa.
A juíza condenou o supermercado ao pagamento da diferença salarial correspondente e a uma indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil. Na visão da magistrada, o supermercado desrespeitou a dignidade da trabalhadora ao permitir que ela fosse a única mulher a realizar tarefas atribuídas exclusivamente a homens na empresa, provavelmente com a justificativa de sua força física.
O supermercado recorreu da sentença. No julgamento do recurso, a relatora do caso, juíza convocada Ângela Castilho Rogêdo Ribeiro, enfatizou que houve tratamento discriminatório em razão da identidade de gênero, em absoluto desrespeito à dignidade da trabalhadora.
A decisão considerou provada a ofensa diária e sistematizada sofrida pela autora, uma vez que, de forma recorrente, era a única mulher obrigada a realizar atividade destinada apenas a homens na empresa.
A magistrada entendeu que houve lesão à honra subjetiva e objetiva da trabalhadora, “já que muitos dos fatos narrados ocorriam ou eram do conhecimento de outras pessoas, o que resultava em humilhação, atingindo também o conceito e a imagem que a autora tinha de si própria”.
Por outro lado, a magistrada entendeu ser cabível a redução do valor da indenização, considerando que a própria autora limitou o pedido à quantia de R$ 5 mil. Para a relatora, a adequação do montante “fortalece o princípio da congruência entre o pedido e a condenação, garantindo que a reparação atenda ao caráter compensatório sem configurar enriquecimento sem causa”.
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