
Cartazes, faixas e gritos por justiça antecederam o início do julgamento de Antério Mânica, acusado de ser mandante da chacina de Unaí, na região Noroeste de Minas Gerais, em janeiro de 2004. O júri ocorre nesta terça-feira (24), na Sede da Justiça Federal, no bairro Santo Agostinho, na região Centro-Sul de Belo Horizonte.
Auditores fiscais denunciavam a impunidade do caso. Segundo Bob Machado, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho (Sinait), uma vigília será feita pelo período em que durar o julgamento, que deve se arrastar até sexta-feira (26).
“Buscamos por justiça, porque nossos colegas foram brutalmente assassinados enquanto cumpriam seu trabalho. É preciso que a Justiça reduza a sensação de impunidade e demonstre que a lei é para todos”, disse.
Machado também afirma que o crime também representa um ataque ao estado brasileiro. “Foram servidores públicos, no comprimento das suas funções, que foram assassinados naquele dia. O estado brasileiro foi apunhalado, chacinado, e até hoje os mandantes não foram punidos. A dor e o sofrimento permanecem até hoje”, lamentou.
Advogado assistente de acusação, Noberto Tardelli descreve o sentimento dos familiares das vítimas. “Indignação, revolta, cansaço, tristeza, perda, perplexidade. Tudo isso junto.”
As primeiras prisões envolvendo o caso só ocorreram em 2013, uma década após os assassinatos. Na ocasião, três pessoas — Rogério Alan, Erinaldo Silva e William Gomes — acusadas de serem “pistoleiros”, foram condenadas a penas que, juntas, somam 226 anos de prisão.
Na opinião de Tardelli, Mânica só não está preso devido ao poder econômico. “Os executores (do crime), só cometeram o crime porque foram levados por uma força econômica. Quem tinha algo contra as vítimas, é quem contratou” afirmou.
O advogado também vê erro do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) que anulou, em 2018, uma primeira condenação de Antério Mânica com o argumento de que não havia provas suficientes.
“O tribunal errou, porque o que o desembargador viu insuficiência de provas, foi uma visão equivocada do processo”, alegou.
Chacina
O crime ocorreu em 28 de janeiro de 2004, quando os auditores João Batista Soares Lage, Nelson José da Silva e Erastótenes de Almeida Gonçalves e o motorista Ailton Pereira de Oliveira foram assassinados com tiros à queima-roupa, após uma emboscada.
Quando assassinados, os três auditores investigavam denúncias de trabalho escravo que estaria acontecendo em fazendas da região. A morte dos três provocou mobilização política e social na época e, em homenagem às vítimas, a data dos assassinatos foi transformada em “Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo”.
O ex-prefeito de Unaí Antério Mânica e o irmão dele, Norberto, dois grandes produtores de feijão da região, foram apontados pelo Ministério Público Federal (MPF) como mandantes do crime.
A sentença deles saiu em 2015, com cada um condenado a cumprir 100 anos de prisão. Apesar de o MPF pedir a prisão imediata dos réus, a Justiça permitiu que ambos recorressem em liberdade.
Em 2018, no entanto, uma reviravolta mudou os rumos do processo, quando o TRF-1 anulou a condenação de Antério Mânica.
"Os que mataram (os fiscais) estão presos. Não se pode falar que tenha impunidade nesse caso. Contra Mânica não se tem nenhuma prova", disse o advogado do ex-prefeito, durante a sustentação oral na sessão que reviu a condenação.
Em virtude da anulação, o ex-prefeito terá que ser submetido a novo julgamento, que começa hoje.
Na época da anulação, Norberto Mânica, que também recorre em liberdade, prestou depoimento e sustentou ser o único mandante do crime, inocentando o irmão.